O boçal

Bastou o verão dar um ar da sua graça, interrompendo um anormal ciclo de temperaturas amenas nada condizentes com a estação do ano vigente, para que o País voltasse ao pesadelo dos incêndios destruidores da riqueza nacional. Durante uma semana o pulmão verde que separa o Alentejo do Algarve ardeu descontroladamente, para desespero das diversas…

Bastou o verão dar um ar da sua graça, interrompendo um anormal ciclo de temperaturas amenas nada condizentes com a estação do ano vigente, para que o País voltasse ao pesadelo dos incêndios destruidores da riqueza nacional.

Durante uma semana o pulmão verde que separa o Alentejo do Algarve ardeu descontroladamente, para desespero das diversas entidades oficiais encarregues de combater aquele flagelo, que se viram impotentes na obtenção de quaisquer resultados positivos no sentido de dominar o avanço das chamas.

Cerca de 27 mil hectares de terreno fértil ficou reduzido a cinzas, com a perda total dos meios de subsistência das populações ali residentes, nomeadamente a produção do medronho a a plantação dos sobreiros, mais de duas dezenas de casas de primeira habitação riscadas do mapa e cerca de quatro dezenas de feridos.

Portugal, apesar de ser um dos mais pequenos países da Europa, viu-lhe reconhecido o registo, fruto deste incêndio e de outros que o antecederam, de proporções menos alarmantes, como   aquele com maior área ardida em todo o Velho Continente, até à presente data.

Um coro de críticas, muitas de gentes autorizadas, puseram a nu as fragilidades operacionais postas no terreno, com responsáveis do sector a falarem em “desorganização total do combate, operacionais mal distribuídos, bombeiros limitados a ficar à espera do avanço das chamas, a ausência do fogo como ferramenta de combate e a falta de líquidos retardantes na água lançada pelos meios aéreos”. 

Ouviram-se também desabafos relativos a uma “má coordenação de homens e meios” e a uma “desorganização total em que ninguém se entende”. 

No meio desta calamidade, Costa, primeiro responsável pela adopção de medidas eficazes, preventivas e pró-activas, que nos protejam dos horrores dos fogos florestais, assim que abriu a boca, depois de ter estado desaparecido durante os primeiros dias, foi para enaltecer o sucesso da operação de controlo dos incêndios, atrevendo-se a considerar o de Monchique como uma excepção!

Claro que Costa, como exímio profissional deturpador da verdade que é, quando confrontado com estas declarações desmentiu-se a ele próprio, jurando que o que dissera fora deturpado pela comunicação social e que a expressão que usara tinha sido excepcional, no sentido de salientar a importância do ocorrido, e não excepção.

Talvez possamos admitir que Costa está com sérios problemas ao nível da memória, mas convenhamos que será hilariante acreditar-se que todos os outros sofremos de surdez! Basta ouvir as declarações que proferiu, que estão gravadas, para se descobrir de que lado está a mentira.

Mas não contente com a insensatez, a roçar a boçalidade, com que sistematicamente nos brinda sempre que algum acontecimento põe em causa a sua preparação para o cargo que exerce, ordenou ao infeliz do seu ministro da administração interna, que foi seu colega de carteira na escola onde se ensinam os maus princípios que devem orientar os políticos medíocres, para festejar, junto dos jornalistas, a vitória no combate ao incêndio que atravessou três concelhos, assim que este foi circunscrito.

Costa jamais reconhece a possibilidade de qualquer fracasso do seu governo em alguma intervenção desastrosa, mesmo que o desaire seja evidente perante todos, pelo que procura sempre um subterfúgio para passar incólume perante a incompetência que verdadeiramente o caracteriza.

Desta vez lembrou-se do argumento de que a inexistência de vítimas mortais representa uma vitória obtida contra um incêndio que lançou largas dezenas de pessoas para uma cama de hospital e trouxe a pobreza e miséria a tantos e tantos desgraçados que, pelos vistos, não contam para nada!

O raio de destruição do fogo que começou em Monchique a acabou em Silves é absolutamente irrelevante para quem nos desgoverna, cuja única preocupação é a de que ninguém morra, não por amor à vida do próximo, mas como seguro de vida deles próprios, receosos de perder o tacho se mais vidas humanas tivessem sido ceifadas.

Estamos condenados a depender das trafulhices de homens sem honra nem carácter, boçais, cujo único propósito é o de se perpetuarem nos gabinetes do poder, indiferentes ao empobrecimento precoce a que a suas acções conduzem uma Nação que já foi valente e imortal.

O antecessor de Costa, num rasgo que queremos acreditar ser de humildade, disse uma vez “que se lixem as eleições”.

Costa diz exactamente o contrário: que se lixe tudo o resto, menos as eleições.

É apenas para isso que ele vive.

 

Pedro Ochôa