Regresso às aulas

Em épocas próprias, o pastor Mário Nogueira desce à cidade, à cabeça de um obediente rebanho, para reclamar mais dinheiro e menos trabalho

Implacável, o calendário dita o fim das férias e o início de um novo ano escolar. Outros calendários dizem-nos que vamos ter nas ruas as tropas do Dr. Mário Nogueira com as habituais palavras de ordem em nome da ‘defesa dos direitos dos professores’. Sobre os direitos dos alunos, nem uma palavra…

Quando a reputação da classe ainda não tinha descido aos infernos, era possível distinguir quatro categorias de professores. No topo, estavam os que tinham abraçado o ensino por vocação: modelares nas salas de aula, continuavam a ser mestres nos sítios onde os encontrávamos, das livrarias aos cinemas, dos cafés aos estádios de futebol; eram a maioria e, felizmente, a espécie não está extinta. Logo a seguir, vinham os professores-funcionários: cumpriam nas salas mas ‘desligavam’ no momento em que transpunham a porta da escola. Na terceira categoria, avultavam os que notoriamente se esforçavam, mas ainda não tinham adquirido as competências dos mestres – embora se adivinhasse que, com trabalho, lá chegariam. Só a quarta categoria, residual, era criticada: albergava os mercenários que não sabiam nem queriam saber – só lhes interessava o que recebiam no fim do mês.

Quando chegaram os tempos do nivelamento democrático, prevaleceu o sagrado princípio ‘a trabalho igual, salário igual’ e o edifício ruiu: os ‘missionários’ foram hostilizados, os ‘funcionários’ marginalizados, e os que queriam aprender deixaram de ter incentivo para o fazer.

Como era de esperar, a ‘posta restante’ foi o lugar de refúgio para os descontentes, os desmotivados, os habilidosos, os revoltados e os preguiçosos incuráveis. Sabiam que o cumprimento dos mínimos – a mera presença, com notório fastio – era a garantia de vida calma e tranquila. Para quê o empenho, se as famílias não exigiam mais e o Ministério andava esquecido das escolas?  

O cenário agravou-se com o desvario das experiências pedagógicas – por norma, importadas tardiamente – que foi a via escolhida por alguns gabinetes ministeriais para se darem ares de abertura às novas correntes.

Tempos do tudo arrasar para tudo recomeçar do zero, com duas consequências inevitáveis: a desresponsabilização e o descrédito. Programas imbecis faziam prever que a novidade de um ano seria descartada no seguinte – justificando uma ausência de vontade para os perceber e aplicar. Num plano inclinado suicida, o ensino-aprendizagem foi perdido e as inovações não deram frutos. Restou um híbrido de metodologias pedagógicas facilitistas, que empurra os professores para a lei do menor esforço e condena os alunos à infantilização.

A confusão instalou-se e ninguém sabe onde está a ponta por onde pegar para retomar uma normalidade mínima, necessária para devolver a dignidade à Escola.

Até lá, o poder continua na CGTP, que em épocas próprias manda o pastor Mário Nogueira descer à cidade, à cabeça de um obediente rebanho de gente acéfala, para reclamar mais dinheiro e menos trabalho. E assim estamos.