O RISCO e Lisboa – Resposta ao texto dos coordenadores do atelier

Usando o direito de resposta à entrevista publicada na edição do SOL, os coordenadores do Risco entenderam esclarecer aspetos da atividade do atelier, refutar declarações e tecer considerações sobre as minhas supostas intenções. Em relação a este último aspeto abstenho-me de quaisquer comentários. As pessoas conhecem-me o suficiente para não se reverem nesse tipo de…

Usando o direito de resposta à entrevista publicada na edição do SOL, os coordenadores do Risco entenderam esclarecer aspetos da atividade do atelier, refutar declarações e tecer considerações sobre as minhas supostas intenções. Em relação a este último aspeto abstenho-me de quaisquer comentários. As pessoas conhecem-me o suficiente para não se reverem nesse tipo de conjeturas. 

Apesar disso, quero agradecer o texto. Por um lado, pelo que informa das relações do Risco com a CML que, não sendo do conhecimento público, permitem formular algumas perguntas e expor perplexidades. Por outro lado, porque me permite precisar o que penso sobre o assunto e corrigir uma questão que, numa conversa de três horas, nem sempre é possível transmitir sem suscitar interpretações que não estavam no meu espírito, nem era intenção dos que fizeram o esforço de transcrever o que foi dito, por vezes de forma pouco clara.

De acordo com os dados do texto, desde 2007 – ano em que Manuel Salgado (MS)  integrou o executivo municipal em Lisboa – o atelier concluiu 19 projetos na cidade, sendo 11 sujeitos a licenciamento municipal. Segundo os signatários, todos eles foram iniciados antes do arq.º MS ser vereador com o pelouro do Urbanismo na CML. Como só integrei o executivo municipal após as eleições de 2009, não posso saber se essa informação foi anteriormente disponibilizada à Câmara Municipal. Durante o tempo em que fui vereador, o único projeto em que essa condição de anterioridade foi evocada referiu-se ao Plano de Pormenor da Matinha, quando se tratou de o apreciar em reunião de câmara. Na ocasião, devido à impossibilidade do seu principal autor (arq.º MS) o poder apresentar, assumi eu essa função, não sem antes esclarecer com o arq.º Tomás Salgado as dúvidas que o Plano me suscitava, que foram prontamente esclarecidas e conduziram até a algumas alterações na apresentação da proposta. 

Durante todo o restante mandato não me recordo de mais alguma vez essa condição de anterioridade ter sido mencionada, pelo que, ou os restantes projetos se realizaram antes ou depois do período de 2009/13. De qualquer modo, seria curial, e do mais elementar bom senso, que a lista de projetos em que o Risco estava a trabalhar em Lisboa fosse disponibilizada ao executivo camarário, por forma a que todos os vereadores pudessem estar devidamente informados da situação e avaliassem da pertinência da manutenção da equipa do projeto. Com efeito, é muito diferente concluir um projeto que vinha sendo desenvolvido antes do arq.º MS ter ocupado as funções de vereador (nalguns casos faltando apenas a sua formalização e apresentação à CML para licenciamento, como no PP da Matinha) ou dar-se seguimento a contactos exploratórios com um cliente, ou ainda, mais questionável, desenvolver um novo projeto apenas porque havia trabalhos anteriores com um cliente. 

A situação do hospital da Luz é a este respeito elucidativa. Das duas uma. Ou a ampliação do hospital estava prevista desde o início, ou tratava-se de um projeto a desenvolver de raiz. Neste caso não há direitos de autor ou de anterioridade a evocar para ser o Risco a desenvolvê-lo, tanto mais quando a sua apreciação e licenciamento competem a serviços que dependem hierarquicamente do vereador MS. Mas se a ampliação do hospital estava prevista desde o início, não colhe a justificação apresentada em reunião de câmara para a demolição do quartel de bombeiros então existente no local, dado que, com ou sem deficiências, este teria sempre de ser demolido para dar lugar à ampliação do hospital. Neste caso, que dizer de uma hasta pública para um terreno que se sabia de antemão estar destinado à ampliação do hospital, ainda para mais sendo este pertença do grupo Espírito Santo? Quem se atreveria a perturbar um negócio a esse poder de facto, conhecendo as relações familiares entre o vereador e o rosto desse grupo financeiro? Em qualquer caso, à luz do compromisso assumido de que o Risco não desenvolveria novos projetos em Lisboa, convenhamos que se trata de uma situação difícil de explicar. 

Estou ciente das dificuldades que o atelier passou pelo facto do seu principal impulsionador se ter afastado para exercer as funções de vereador. Todos sabem que, em termos nacionais, Lisboa é um dos mais importantes mercados neste domínio, pelo que a simples impossibilidade de aí trabalhar tem enormes consequências. A agravar uma situação já de si difícil, a crise que o país atravessou desde 2008, terá certamente colocado o atelier em grandes dificuldades. Não fosse o empenho dos seus colaboradores e a visão dos que assumiram a sua coordenação, nomeadamente em se internacionalizar e evidenciar as suas competências, e teria sucedido ao Risco o que ocorreu a muitos ateliers: encerrar portas ou manterem-se em estado de hibernação até à recente retoma. 

É neste contexto que, sem desvalorizar o papel dos dirigentes do Risco, entronca a questão que suscitou a polémica e originou o texto de resposta. Num dado ponto da entrevista refere-se que, num meio pequeno, é natural as redes de conhecimentos desempenharem um papel na angariação de trabalhos. Aceito que, tal como isto está expresso no texto, possa haver lugar a interpretações dúbias e menos abonatórias. Não era essa a intenção e não é isso o que penso. Mas, ao contrário do que se refere na resposta, há situações onde os grandes projetos desenvolvidos fora de Lisboa pelo atelier se destinaram ao GES que, como é do conhecimento público, foram ‘promotores com interesses na capital’. 

Por último refira-se a extinção da Parque Expo (PE). Se a decisão partiu de um Governo em início de funções, não é menos certo que no meio urbanístico se conhecia a posição de MS em relação à PE, considerando-a uma concorrente desleal, devendo por isso ser extinta. Essa concorrência referia-se sobretudo aos projetos das frentes do Tejo, onde MS entendia ser o Risco mais competente. O protelar da posse do Dr. Miguel Júdice como presidente da Frente Ribeirinha de Lisboa, após convite endereçado pelo Governo de Sócrates, é elucidativo. Com efeito, a situação era tão clara, que levou José Miguel Júdice a acompanhar na PE os estudos que se desenvolviam para a frente ribeirinha de Lisboa. Passados meses sem ser formalizada a tomada de posse, e face às decisões a tomar devido ao avanço dos estudos, Júdice ‘bateu com a porta’, num processo ainda por esclarecer. É certo que «a Parque Expo e a Risco eram empresas de escalas completamente diferentes», mas na região de Lisboa disputavam protagonismo na renovação das frentes do Tejo. São factos que o tempo veio elucidar.

Fernando Nunes da Silva

Ex-vereador da Mobilidade da Câmara de Lisboa