A vida amorosa dos ouriços

É preferível ter um bom professor a ensinar numa sala fria do que um professor-funcionário a cumprir horário

Como é que os ouriços-cacheiros fazem amor? Com muito cuidadinho… para não se picarem! Assim é quando se trata de lidar com os problemas da educação. Tanto que, em início de um novo ano escolar, vale a pena comentar três equívocos frequentes.

1. Jardim de Infância. Vozes autorizadas das ciências da educação sustentam que deve ser mesmo um ‘jardim’, onde as crianças se sintam livres para brincar e socializar, em ambiente de alegria e descontração, tanto mais necessárias quanto maiores forem os problemas que trazem de casa. 

Estranhamente, há quem veja nas crianças ‘adultos em miniatura’ e ache que devem ser tratadas como tal. Daí que entendam que, logo na pré-escola, devem adestrar-se nas artes da competição pelos resultados, para poderem brilhar nos anos que vão seguir-se até à universidade. 

A estas pessoas, recomenda-se que ouçam a canção Aquarela, que começa assim: Numa folha qualquer / Eu desenho um Sol amarelo / E com cinco ou seis retas / É fácil fazer um castelo. Basta googlar em Toquinho-Aquarela para sentirem como a letra é educativa. Percebe-se que o autor sabe o que são crianças e o que é um ‘jardim’.

 

2. Co-educadores. Porventura com simplificação excessiva, o meu professor da escola primária costumava dizer: «A família dá a educação e a escola a informação». Hoje, sobram estudos a propósito do contributo que cabe a cada uma das partes – família e escola – na formação dos jovens, mas as conclusões estão longe de ser consensuais. 

Pelo meio, houve tempo para todos os disparates, como aquele em que os professores proibiam as ajudas em casa, porque… «a forma como os pais tinham aprendido desvirtuava as novas metodologias pedagógicas», as tais que estavam a ser postas em prática para corrigir os defeitos do ‘ensino fascista´. 

Os meus filhos também trouxeram o recado, mas poupei-os à parvoíce. Vozes de burro…

 

3. Hardware e Software. Habituei-me a ver a escola como a composição equilibrada de HW –  o que é físico – e SW – o que é matéria do conhecimento. 

Na primeira categoria, estão os edifícios, as salas de aula, os equipamentos, os recreios, e por aí fora… Na segunda, os métodos de ensino, a qualificação dos educadores, a racionalidade dos programas, o respeito mútuo, e tudo o que faz as pessoas sentirem-se bem nos lugares que ocupam no meio escolar. 

Enquanto aluno, professor, pai e avô, sempre privilegiei este SW, no entendimento de que é preferível ter um bom professor a ensinar numa sala fria do que um professor-funcionário a cumprir horário, em condições físicas ideais. 

O meu espanto está em verificar que o descontentamento se manifesta mais facilmente em relação às falhas no ar condicionado, à falta de tomadas nas salas para carregamento de telemóveis, à ementa do refeitório e, até, à ausência dessa modernidade que são os WC mistos. 

A minha alegria está em verificar que, ao contrário dos pais, a maioria dos alunos valoriza mais os professores que sabem ensinar e os programas que os preparam para a vida. Haja esperança…