Assunção Cristas: ‘Prefiro ir ao teatro do que à tourada, mas respeito’

“Não vejo um clamor social a pedir um referendo sobre a despenalização do aborto”

A esquerda conseguiu, nos últimos anos, várias vitórias nos chamados temas fraturantes, como a despenalização do aborto, os casamentos homossexuais ou a adoção de crianças por casais do mesmo sexo. Admite que a direita tem sofrido aqui várias derrotas?

Não gosto de colocar todos esses assuntos no mesmo saco. Acho que têm níveis diferentes de análise. Em questões que para nós são muito importantes e que têm a ver com o respeito recíproco e a dignidade de todas as vidas e em todos os momentos dessas vidas nós continuaremos a batalhar por aquilo que achamos que é uma visão humanista de uma sociedade que cuida de todos, desde o início – quando a vida ainda é muito incipiente – até ao final quando as pessoas já estão muito fragilizadas e muitas vezes doentes. Achamos que a resposta da sociedade deve ser de acolhimento e de apoio a todos e não uma resposta de ideologias mais fáceis que descartam as pessoas. 

A eutanásia vai voltar a ser discutida. O CDS vai propor um referendo?

Nós colocaremos no nosso programa eleitoral a nossa visão clara que é contrária à institucionalização da eutanásia em Portugal. Entendemos que, num país do século XXI, a resposta aos problemas da dor e da doença crónica devem ter a ver com o alívio da dor, o acompanhamento e o estatuto do cuidador e não com eliminar as pessoas e tornar tudo mais fácil e barato.

Há alguns destes pontos que acha ser possível reverter no futuro com um Governo em que o CDS participe?

Acho muito difícil encontrar uma maioria parlamentar que possa reverter determinados temas. Por exemplo, em relação ao aborto, eu não mudei de posição: continuo a ser contra a legalização do aborto em Portugal. Mas acho que reverter isso só poderia acontecer através de um referendo. E eu não vejo um clamor social a pedir um referendo nessa matéria. Portanto, a nossa posição não muda, mas nós sabemos a sociedade que está à nossa volta. Em relação à eutanásia, nós continuaremos a batalhar por uma visão alternativa que é a do cuidado às pessoas que estão numa situação de dor e de fragilidade, para que possam ter um mínimo de qualidade de vida até ao fim.

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Como encara os movimentos feministas? Acha que o feminismo ainda faz sentido? 

Faz sentido enquanto continuarmos a ter coisas tão simples como disparidades salariais entre homens e mulheres ou uma divisão de tarefas familiares que onera as mulheres todos os dias com mais tempo gasto com as tarefas domésticas e de cuidado com a família, quando também gastam tempo igualmente como os homens a trabalhar nas suas profissões. Enquanto continuarmos a ter mulheres discriminadas no acesso aos empregos, a serem despedidas quando estão grávidas, a esconderem as gravidezes com medo dos despedimentos ou a adiarem projetos de vida por causa disso, acho que continua a fazer sentido falar destes temas. Espero que um dia não seja preciso.

Acha que houve machismo neste caso de Cristiano Ronaldo?

Não quero comentar o caso específico, porque não conheço os pormenores. O que posso dizer é que as mulheres continuam a precisar de um olhar atento e de um discurso que evidencie os problemas, custe o que custar.

Quando comparou a tourada a um bailado gerou polémica. Gosta de ver as corridas de toiros?

Acho que as touradas fazem parte do domínio da nossa cultura e tradição. Noutros países há outras tradições e outras culturas. Em Portugal é assim e eu acho que defender as touradas é defender a liberdade de uns gostarem e outros não gostarem e de uns irem e outros não irem. 

Mas não costuma ir às praças?

Não costumo ir, porque tenho muito pouco tempo. Quando apanho na televisão, às vezes fico a ver. Mas tenho muito pouco tempo para ver televisão e ir a espetáculos. No pouco tempo que tenho, vou mais a uma peça de teatro ou ao cinema, mas isso não quer dizer que não respeite. Respeito muito e acho que quem gosta de ir deve poder ir e quem gosta de ver na televisão deve poder ver. Lembro-me de ser muito pequenina e ver touradas na televisão com a minha avó que adorava. Acho que isto tudo faz parte da nossa liberdade enquanto sociedade e da nossa diversidade de escolha e do respeito por cultura e tradição. E é aí que eu encaixo as touradas: na cultura e na tradição.