As quintas-feiras do Presidente Cavaco Silva

Aníbal Cavaco Silva tem o condão de andar a chatear meio mundo político vai para 40 anos. O meio mundo que vota à esquerda, PS, PCP e BE, vota-lhe um ódio primário. Junta-se a esse meio mundo aquela meia dúzia de bem-nascidos à direita que nunca lhe perdoaram a origem social e a ascensão política. …

Aníbal Cavaco Silva tem o condão de andar a chatear meio mundo político vai para 40 anos. O meio mundo que vota à esquerda, PS, PCP e BE, vota-lhe um ódio primário. Junta-se a esse meio mundo aquela meia dúzia de bem-nascidos à direita que nunca lhe perdoaram a origem social e a ascensão política. 

Os portugueses, no entanto, encarregaram-se de o eleger três vezes para primeiro-ministro, com duas maiorias absolutas (de mais de 50%), num total de dez anos consecutivos. A que se seguiram, após um interregno de outros dez anos, mais dois mandatos como Presidente da República. Um score de 20 anos, com quatro maiorias absolutas.

Este feito, obtido por um político do PSD num país dito ‘de esquerda’, por mais ninguém alcançado, é, no mínimo, merecedor de página à parte no guiness da política nacional. 

Enquanto primeiro-ministro, Cavaco enfrentou Mário Soares e derrotou Constâncio e Sampaio. Ganhou as presidenciais contra as quatro – repito, as quatro – figuras da esquerda portuguesa: Mário Soares, Manuel Alegre, Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa. Ganhou a todos a Presidência da República à 1.ª volta.

Com estes pergaminhos, basta-lhe espirrar que a esquerda se constipa. 

Tal voltou a suceder esta semana, com o lançamento do livro Quinta-feira e Outros Dias (II volume). Suspeito que os outros dias não sejam tão controversos…

Ou, como escreve, «foram apenas onze as reuniões de trabalho de quinta-feira com o primeiro-ministro António Costa, muito poucas comparando com as 188 com o primeiro-ministro José Sócrates e as 184 com o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho».

O capítulo ‘A Troika e o mau estado das finanças públicas’ é demolidor para a governação de José Sócrates. «O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, estava extremamente preocupado com a situação das finanças públicas. Era muito pior do que aquela que tinha sido veiculada pelo Governo anterior e tida em consideração no desenho do programa de ajustamento. (…) Em 2010 o défice tinha tingido 11,2% do PIB, um verdadeiro desastre».

A somar às críticas ao consulado de Sócrates, os capítulos finais sobre ‘A nova liderança do PS’ ou ‘O parto do XXI Governo, a Geringonça’, fazem considerações pouco abonatórias sobre António Costa. Pelo meio, António José Seguro, Vítor Constâncio e Mário Soares não são poupados. 

Mas Cavaco Silva também tece duras críticas a Pedro Passos Coelho, ao seu Governo e aos seus próximos, deixando claro que foi a questão da TSU a causar o divórcio entre o Governo e os portugueses. «Voltei a manifestar a minha total discordância. O Governo devia preparar-se para as vozes da revolta que se iriam ouvir».

«Para mim, tudo começara no caminho errado escolhido pelo Governo para alcançar as metas (…) A equidade fiscal pouco melhorava e era um desastre político acrescentar a alteração da TSU. Um erro económico e também político». 

A esquerda sai muito mal tratada destas Quintas-feiras, mas o Governo de Passos Coelho, com a má gestão do dossiê TSU e a coligação com o CDS de Paulo Portas, também não tem propriamente motivos para se alegrar. 

sofiarocha@sol.pt