Evidências II: o Sistema de Informações da República

Prosseguindo o tratamento das ‘evidências’ resultantes do designado ‘caso de Tancos’, analisamos hoje o Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP). Apesar de o ‘sistema’ ter já a maturação suficiente para ter encontrado o seu equilíbrio, tal ainda não foi plenamente conseguido. Como escrevemos nos artigos sobre a Reforma do Estado, um Estado moderno deve…

Prosseguindo o tratamento das ‘evidências’ resultantes do designado ‘caso de Tancos’, analisamos hoje o Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP).

Apesar de o ‘sistema’ ter já a maturação suficiente para ter encontrado o seu equilíbrio, tal ainda não foi plenamente conseguido.

Como escrevemos nos artigos sobre a Reforma do Estado, um Estado moderno deve prosseguir uma Estratégia de Defesa e Segurança Nacional em sentido amplo, privilegiando as seguintes funções: conhecer e antecipar; prevenir; cooperar; proteger e intervir.

Dissemos então que a segurança nacional deve envolver os assuntos da Defesa Nacional (militar e civil) e da Administração Interna e Justiça (forças e serviços de segurança, organização judicial, etc.), em estreita e direta ligação com o SIRP.

Este, como não podia deixar de ser, desempenha uma atividade nuclear no desenvolvimento das funções acima referidas.

Não temos dúvidas de que alcança muitos dos objetivos que o ‘poder’ lhe atribui, mas algumas entropias, se resolvidas, podem melhorar em muito o ‘produto’ obtido.

Senão, vejamos:

O SIRP é dirigido por um secretário-geral com equivalência a secretário de Estado.

Na designação deste ‘alto funcionário’ encontramos a primeira entropia que, se alterada, poderá conferir um mais adequado enquadramento a um ‘sistema’ que é – lembramos – ‘da República’.

Assim, defendemos que o secretário-geral do SIRP seja nomeado pelo Presidente da República, por proposta do Governo, antecedida de parecer da Assembleia da República, resultante de audição secreta digna desse nome.

Teríamos, assim, toda a ‘República’ envolvida e comprometida com a nomeação e exercício deste ‘alto funcionário’ do Estado.

O SIRP comporta dois serviços: um de natureza interna, o Serviço de Informações de Segurança (SIS), e outro de natureza externa, o Serviço de Informações Estratégicas e de Defesa (SIED).

São hoje dirigidos por pessoal ‘interno’, como entendo que deve ser.

Apesar de nos últimos tempos ter mantido um relativo afastamento destes assuntos, estou certo que ambos os serviços, no essencial, continuam a cumprir bem a respetiva missão.

Assim, traduzindo-se o principal ‘produto’ destes serviços na apresentação de relatórios aos decisores políticos, não tenho dúvidas de que, ambos, produziram relatórios sobre o ‘caso de Tancos’. E que estes chegaram aos seus destinatários, pois seria inconcebível, incompreensível e inacreditável se assim não fosse.

À Assembleia da República compete, através da Conselho de Fiscalização do SIRP, acompanhar, verificar e, sempre que possível, informar os cidadãos sobre ‘o que se passa ou passou’, como deveria ter feito nesse famigerado ‘caso de Tancos’.

No apuramento das responsabilidades políticas, que constitui o primeiro objetivo da Comissão Parlamentar de Inquérito, esta é uma tarefa de fundamental importância.

Aguardemos, pois…

Uma segunda entropia reside no referido Conselho de Fiscalização.

De uma vez por todas, é necessário dotá-lo de mais capacidades e responsabilidades, permitindo-lhe ser um verdadeiro, dinâmico e atuante ‘órgão fiscalizador’.

O Conselho de Fiscalização do SIRP é diretamente responsável perante a Assembleia da República, mas ganharia muito em importância se, no processo de nomeação dos respetivos membros (em especial do seu presidente), interviesse o Presidente da República. E este fá-lo-ia através do presidente da Assembleia da República, declarando a sua prévia concordância com os nomes que seriam presentes a votação no plenário.

Não é matéria fácil, mas o que existe é manifestamente insuficiente, ineficaz e desprestigiante para o Conselho e para quem o integra.

Sem personalizar – porque não é essa a nossa intenção – é intrigante a frequência com que têm sido nomeados diplomatas de carreira para o Sistema e para os Serviços.

A sua formação e a carreira diplomática não lhes aportam as características adequadas ao desempenho dessa função – o que também acontece, aliás, com aqueles que advêm das carreiras militares.

Julgo que o perfil mais aconselhável seria o de alguém que, para além dos requisitos básicos de independência, rigor, competência e sentido de serviço público, tivesse formação na área jurídica, com relevância para as matérias e assuntos que o Sistema ‘trabalha’ de forma prática e objetiva. Sem esquecer um forte perfil de liderança, aliada a uma – insisto – provada independência de tudo e de todos.

Esta é a evidência de hoje. Certo de que tratamos um ‘sistema’ essencial ao funcionamento de um moderno Estado de Direito Democrático e que, seguramente, algo de muita relevância poderá sair da Comissão Parlamentar de Inquérito a Tancos, assim os respetivos membros (deputados) queiram ter o trabalho de se prepararem e… interrogarem.

Em breve voltaremos às outras ‘evidências’, que enunciámos no primeiro artigo da série.

Nota: no próximo número voltaremos à importante questão da ‘condição militar’.

*Major-General Reformado