Amorim fica com Comporta após vários impasses

Participantes do fundo aprovaram a proposta de 158 milhões de euros, um valor que vai ser quase todo para pagar dívidas. Consórcio promete investir mil milhões e criar emprego. 

A Herdade da Comporta conheceu esta semana o seu desfecho. Os participantes do fundo aprovaram em assembleia-geral a venda dos ativos da propriedade ao consórcio Claude Berda e Paula Amorim por 158 milhões de euros. Um valor que representa uma melhoria de 1,8 milhões de euros face à proposta inicial. A este valor há que somar ainda uma garantia, correspondente a cerca de oito milhões de euros, que ficará em vigor durante nove meses, para cobrir eventuais perdas caso os ativos não estejam de acordo com a descrição no contrato.

A escritura de venda  terá de ser realizada até abril de 2019. Tal como SOL tinha avançado, o prazo indicativo para a conclusão da alienação poderia arrastar-se até essa altura, mas o SOL sabe que será feita até fevereiro.

A empresária portuguesa já veio garantir que a aquisição é importante «para a Amorim Luxury na sua estratégia de crescimento e posicionamento enquanto marca portuguesa hoteleira e de lifestyle da mais elevada qualidade internacional, concretamente através do seu conceito JNcQUOI», acrescentando que representa «um passo decisivo num longo processo em que nos envolvemos com empenho e sentido de responsabilidade».

Paula Amorim deixa ainda uma garantia. O modelo de negócio que irá ser desenvolvido na Comporta deverá contribuir para a sustentabilidade da região, criar emprego e atrair investimento de qualidade e que qualifique os espaços públicos. «Num certo sentido, a Comporta é de todos: porque cabe a todos contribuir para a sua preservação como lugar especial, único. É um exemplo de que temos condições para fazer bem e de forma diferenciadora. O novo futuro da Comporta começa agora. É este o nosso caminho, é este o nosso projeto, é este o nosso compromisso com a região e com o país», salienta.

O novo projeto – que poderá envolver a mudança de nome da Herdade da Comporta – deverá contar com hotéis, vilas e condomínios e um vasto número de iniciativas de apoio às comunidades, centros de arte, cultura e design, e centros de saúde e bem estar para atividades de relaxamento. Há ainda planos para incluir academias desportivas de golfe, ténis e padel, comércio e restauração, bem como um museu e uma igreja. O SOL apurou que está previsto um investimento na ordem dos mil milhões de euros a ser aplicado nos próximos anos.

Pagar dívidas

O que é certo é que o valor da venda vai ser usado quase na totalidade para pagar a dívida à Caixa Geral de Depósitos (CGD), que já ultrapassa os 119 milhões de euros, aos quais se somam mensalmente juros de 850 mil euros, e que já está incumprimento há mais de dois anos. Um crédito em falta que tem merecido toda a atenção do banco público. O presidente da Caixa tem vindo a garantir que quer ver «os seus interesses defendidos». Na apresentação de resultados, Paulo Macedo admitiu que a «Comporta é um assunto muito sério que a CGD está a acompanhar com muita atenção». 

Face a esta atenção acrescida por parte da Caixa, tudo será feito para evitar que haja alguém que queira «impugnar ou fazer qualquer espécie de ato menos adequado no sentido de prejudicar os interesses dos credores e o próprio desenvolvimento do projeto».

Mas além da regularização desta dívida, terão ainda de ser pagos cerca de um milhão de euros à Deloitte, entidade que supervisionou o processo concursal iniciado em 22 de agosto. Aliás, o contrato de promessa de compra e venda entre o consórcio Vanguard Properties/ Amorim Luxury e a Gesfimo foi assinado, a 23 de outubro, nas próprias instalações da consultora.

Mas as despesas não ficam por aqui. Há que juntar ainda o pagamento na ordem dos seis milhões de euros a fornecedores e outros 30 milhões à Rio Forte, que detém cerca de 58% deste fundo. Ao que o SOL apurou, os pequenos acionistas do fundo – que no total rondam os 80 – vão sair prejudicados com esta venda, uma vez que a verba já está toda canalizada para os maiores credores.

Avanços e recuos

O processo de venda da herdade às portas de Lisboa tem sofrido vários avanços e recuos. A sua alienação recomeçou em setembro. Depois de uma tentativa falhada, os tribunais acabaram por autorizar o processo de venda, contornando assim a razão que anteriormente travou a operação: o arresto dos bens da família Espírito Santo.

O empresário Pedro Almeida fez uma oferta, no verão passado, que não foi concluída porque o Ministério Público não levantou o arresto da Herdade da Comporta – à época, a avaliação era de 420 milhões de euros -, rejeitando a venda da propriedade por considerar que o processo não reunia condições de «isenção, transparência e objetividade». Na altura, o empresário pretendia transformar a Comporta num «resort exclusivo e altamente atrativo para o mercado internacional». O objetivo do empresário passava por comprar também a Herdade da Comporta – Atividades Agrossilvícolas e Turísticas, a empresa que gere os arrozais da região.

Um desfecho que não agradou a todos os pequenos acionistas. O SOL sabe que, caso a alienação tivesse sido concretizada, estes continuariam ligados ao projeto. Em cima da mesa estava a venda apenas dos 58% detidos pela Rio Forte; os restantes 42% continuariam nas mãos dos participantes do fundo, ao contrário do atual processo em que a alienação será de 100%. 

Recorde-se que só Paula Amorim avançou com a proposta, já que o consórcio Oakvest/Portugália/Sabina – que chegou a ser escolhido pela sociedade gestora por apresentar o valor mais alto (na ordem dos 160 milhões de euros) – desistiu em setembro, ao dizer que não estava disponível para entrar num novo processo «do qual não conhecia o caderno de encargos e não oferecia o mínimo de garantia de não viesse a suceder o mesmo desfecho do concurso anterior com acrescidos e significativos custos» para a parceria.

A proposta deste consórcio foi rejeitada num assembleia-geral em julho de 2018 pelo voto combinado do Novo Banco e da Rioforte – os dois maiores participantes no fundo, que representam 74% das unidades de participação – a que se juntaram mais alguns participantes. Nessa altura, foi decidido avançar com um novo concurso com o objetivo de obrigar os interessados a apresentarem propostas vinculativas e provas de fundos financeiros que garantam a concretização dos seus propósitos.