Dia D para o Montepio. Eleições para a Mutualista realizam-se esta sexta-feira

As eleições para a Associação Mutualista Montepio realizam-se esta sexta-feira. As urnas abrem às 10h e fecham às 18h para quem optar por votar fisicamente. Para isso, os associados terão de se deslocar até à rua do Ouro, em Lisboa. No entanto, a maioria dos mutualistas já votou por correspondência. O i sabe que até…

As eleições para a Associação Mutualista Montepio realizam-se esta sexta-feira. As urnas abrem às 10h e fecham às 18h para quem optar por votar fisicamente. Para isso, os associados terão de se deslocar até à rua do Ouro, em Lisboa. No entanto, a maioria dos mutualistas já votou por correspondência. O i sabe que até quinta-feira tinha chegado 42 mil votos à sede da associação. Na corrida estão três candidatos: Tomás Correia (que encabeça a lista A e é o atual presidente), Mendes Ribeiro (lista B) e António Godinho (lista C).

Mas o clima de tensão tem vindo aumentar nos últimos dias com as questões em torno da legalidade do ato eleitoral a subirem de tom. Também o próprio governo se antecipou e publicou o despacho que faz com que a Mutualista passe a ser supervisionada pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), apesar de beneficiar de um período transitório de 12 anos devido à sua dimensão.

Chegou a entrar uma providência cautelar que foi rejeitada pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa que tinha como objetivo impedir as eleições,  alegando que os votos de correspondência teriam de ser autenticados, nomeadamente através de procedimento notarial e sob anonimato. “Sempre que alguém  mostre fundando receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito pode requerer a providência cautelar”, alegaram Miguel Marques Moisés e Palmira Alves Areal que avançaram com este pedido. O i sabe que esta última está casada com Carlos Areal, presente na lista C como candidato ao conselho geral da Mutualista. 

Segundo consta no despacho a que o i teve acesso os dois requerentes diziam que  no ato eleitoral “não se encontra garantida nem a autenticidade das assinaturas nem tão pouco a confidencialidade das mesmas e que a realização das eleições nos moldes previstos potenciará a violação de dados pessoais de milhares de associados (através do acesso e tratamento de dados), a invalidade de reconhecimento de assinaturas e consequente invalidade de todo o ato eleitoral provocando danos na gestão dos produtos mutualistas bem como na prestação dos serviços aos milhares de associados”.

No entanto, estes argumentos foram rejeitados pelo tribunal ao defender que os estatutos da Associação Mutualista Montepio permitem o voto por correspondência e que este é aceite desde que sejam cumpridas determinadas regras: “A lista deve estar dobrada em quatro, com os nomes voltados para dentro, e contida em sobrescrito individual fechado; constar do referido sobrescrito o nome, o número e a assinatura do associado; estar este sobrescrito introduzido noutro endereçado ao presidente da mesa da Assembleia Geral; no voto por correspondência a assinatura do associado deve ser conferida com o espécime existente no Montepio Geral, devendo o voto ser registado nas listas de presença e introduzido na urna.”

 O tribunal lembrou ainda que a redação dos estatutos é anterior à publicação e entrada em vigor do Código das Associações Mutualistas, “não sendo exigível que os estatutos observassem normas que ainda não existiam”.  E deixa uma garantia: “A argumentação dos requerentes é meramente conjetural e hipotética, sem assentar em factos concretos, resultando das suas próprias alegações que temem a potencial invalidade e nulidade dos atos da Associação Mutualista”, diz a decisão a que o i teve acesso, acrescentando que “não se mostram alegados factos concretos de que resulte que a realização da eleição convocada para o dia 7 de dezembro de 2018 possa implicar, com séria probabilidade, um prejuízo patrimonial, quase patrimonial ou de outra natureza, para o direito dos requerentes, que apenas mediante uma medida cautelar possa ser salvaguardado”.

Encontros com a tutela

Também no início desta semana, os listas de oposição a Tomás Correia foram recebidos pelo ministro Vieira da Silva, depois de terem pedido audições urgentes para mostrarem a sua preocupação em torno do ato eleitoral . 

Estes pedidos à tutela surgiram depois da notícia avançada pelo SOL,que revelava que o ministério de Vieira da Silva não irá supervisionar as eleições da Mutualista. "Não se integra no âmbito do exercício da tutela proceder a qualquer tipo de monitorização de atos eleitorais das associações mutualistas", revelou ao SOL fonte oficial do Ministério do Trabalho e da Segurança Social, acrescentando ainda que "o processo eleitoral decorre de acordo com as normas previstas nos respetivos estatutos da associação e em conformidade com o código das Associações Mutualistas, que prevê que é da competência do presidente da mesa da assembleia geral convocar a assembleia geral eleitoral, verificar a regularidade das listas concorrentes às eleições e a elegibilidade dos candidatos, dar posse aos titulares dos órgãos associativos, participar às entidades competentes os resultados das eleições e promover e assegurar a realização de todos os atos necessários à realização do ato eleitoral".

Idoneidade centrou atenções

Também o problema de idoneidade em torno do atual presidente e também candidato esteve no centro da campanha. De acordo com a RTP, em agosto de 2018, o Banca IMI de Londres recusou abrir uma conta à Mutualista para negociar em produtos derivados financeiros, após uma análise a Tomás Correia realizada pela World Check, a empresa de avaliação de idoneidade da Thompson Reuters. Mas o SOL sabe que este problema se deveu ao facto de ter sido eleito presidente da Assembleia Municipal de Pedrógão Grande e, como tal, estar exposto politicamente. Ainda o responsável tem vindo a garantir que tem a "certeza absoluta" de que os processos judiciais em curso não o impedirão de cumprir um novo mandato, mas que já levou Ribeiro Mendes a garantir que vai pedir registo prévio dos seus candidatos à autoridade de supervisão e a desafiar as outras listas a mostrarem a mesma disponibilidade.

Mas as polémicas não ficam por aqui. A Associação Mutualista Montepio também prometeu agir «em sede própria e até às últimas consequências» para defender os seus associados e os trabalhadores do grupo. Em causa está a reportagem da TVI que aponta para irregularidades nas eleições da instituição. De acordo com a notícia, o banco está a beneficiar a candidatura de Tomás Correia ao controlar, dentro dos balcões do Montepio, funcionários que consigam garantir o voto na lista encabeçada por si. "É da competência do conselho de administração do MGAM, enquanto cabeça do grupo Montepio, zelar pelos mais elevados interesses do grupo, protegendo e garantindo o seu bom nome, os interesses dos seus associados e clientes, e dos seus trabalhadores. O conselho de administração do MGAM desencadeará os meios apropriados no sentido de ver reparados os danos causados à boa imagem do grupo e das pessoas que o compõem. E fá-lo-á sem qualquer contemplação, mormente quando se trate da defesa do profissionalismo das pessoas", revelou em comunicado interno a que o SOL teve acesso. Também a comissão de trabalhadores da Caixa Económica Montepio Geral veio manifestar o seu descontentamento em relação à mesma reportagem. "Os trabalhadores do Montepio são profissionais sérios e íntegros, cumpridores das normas e código de conduta a que estão sujeitos. A Comissão de Trabalhadores rejeita a exposição dos trabalhadores do Montepio na comunicação social", diz um outro comunicado a que o SOL teve acesso. 

Uma reação não caiu bem aos adversários. Segundo António Godinho, este comunicado "pretende manipular os trabalhadores do universo Montepio de modo a que estes apoiem a Lista A, institucional", considerando que a maioria dos trabalhadores "é completamente alheia a quaisquer tentativas de manipulação do processo eleitoral, sabendo que muitos resistem estoicamente a pressões fortíssimas para alinharem em processos ilegais e manipulatórios do ato eleitoral". 

Também o líder da Lista B criticou o facto de estarem a ser utilizados "mais de seiscentos mil associados do Montepio como ‘escudo humano’ da atual liderança perante as graves atuações que lhe são imputadas pela comunicação social, o que é inaceitável", lembrando que "as reportagens noticiaram factos que alegadamente levantam a suspeição das autoridades judiciais e de supervisão bancária, como podendo ser da responsabilidade de três candidatos da Lista A ao conselho de administração, praticados em funções de gestão noutras instituições que não a Associação".

Eleições concorridas

Até 2003 houve sempre apenas uma lista a eleições e só no final desse ano é que começaram a surgir candidaturas alternativas. Nessa altura coube a António Maldonado Gonelha, ex-ministro do Trabalho e da Saúde, fazer face à lista de José da Silva Lopes, que saiu vencedora.

A partir daí, o interesse pelas eleições no Montepio foi ganhando maior relevo e as listas também se foram multiplicando. Exemplo disso foi o que aconteceu no último ato eleitoral: apareceram na corrida quatro candidaturas e foi possível, ao mesmo tempo, encontrar um pouco de tudo, de ex-políticos a dirigentes sindicais, contando ainda com apoios públicos, nomeadamente com figuras ligadas às artes.

A lista liderada por Tomás Correia venceu as eleições para a associação mutualista com 58,7% dos votos, mas envolvida em forte contestação. Uma das candidaturas derrotadas – de António Godinho, um dos rostos do projeto “Renovar Montepio” e que avançou novamente este ano – chegou a pedir a impugnação dos resultados, apontando falta de transparência, nomeadamente por não ter sido possível às listas da oposição assistir ao processo de validação dos votos por correspondência (mais de 95% dos votos não são presenciais) com o argumento de que os dados dos associados são protegidos por sigilo bancário (uma vez que a validação das assinaturas é feita por semelhança com a assinatura dos clientes na base de dados bancária), considerando-se que isso facilitaria eventuais falsificações de votos. Mas, no ano passado, o tribunal chumbou a repetição das eleições, considerando improcedente o processo que tinha sido intentado.