Duzentos milhões e um aperto de mão

O ‘sábio da paróquia’ repete as investidas contra a ‘old boys network’  – aquela a que pertenceu o seu pai.

Os jornais e as televisões deram notícias do Fórum Banca/2018, organizado pelo Jornal Económico e pela PwC, que reuniu os dirigentes dos principais bancos a operar em Portugal e teve a bênção do insigne académico João César das Neves. Não uso a expressão ‘bancos portugueses’, porque a espécie está em extinção.

O país esperava que, do conclave, saíssem respostas para os problemas que o setor enfrenta: os mais imediatos – escassez de capital, racionalização das redes de agências, volume das comissões cobradas, peso da burocracia que está a asfixiar bancos e clientes; e os que se perfilam no horizonte − concorrência dos ‘não bancos’, moedas digitais, perda dos fluxos do dinheiro… Puro engano. 

Pelos relatos que li, aquilo não foi um fórum, foi um velório. Ali chorou-se o passado, não se apontou ao futuro. Se é isto que as ‘altas competências’ (cito António Aleixo) têm para dizer à Nação… estamos conversados!

Depois de uma geração que ergueu bancos modernos e competitivos, que criaram riqueza e emprego, veio a crise e vieram ‘comissários salvadores’ que afundaram o que lhes competia valorizar, a partir do momento em que optaram por vender ativos valiosos a preço de saldo. Era preciso emagrecer, gritava a ignorância. E quando os bancos já estavam magrinhos, vieram os estrangeiros e chamaram-lhes um figo. 

Como era de esperar, a coisa não deu certo e os ‘comissários’ foram substituídos por ‘gestores profissionais’. Os anteriores só poderiam ser… amadores. Coisa fantástica! Quando volta a haver gestores colocados por governantes (!!!) e outros que representam acionistas particulares (!!!), chamam-lhes ‘profissionais’. Compreende-se o pudor, seria uma ironia chamar-lhes ‘independentes’. 

Agora, reúnem-se os ‘profissionais’ e… Eureka! Dão-se vivas por ter deixado de haver «administradores que aprovavam empréstimos de duzentos milhões de euros com um aperto de mão». Cito o relato do Observador.

Fui ver a lista dos participantes. Tudo nomes conhecidos, tudo pessoas que no século passado já exerciam funções de topo, e quase todas com responsabilidades na aprovação de crédito. Um pouco mais de trabalho e procurei saber quando, onde, e por que forma manifestaram a sua discordância em relação aos procedimentos que agora repudiam. Nada! Ou a sabedoria tardou vinte anos a chegar, ou é o ‘feitiço a voltar-se contra o feiticeiro’: criticaram os «excessos no crédito à habitação e ao consumo» (leia-se, a irresponsabilidade dos old boys) e agora, sem uma réstia de dúvida a assaltar-lhes o espírito, voltam a promovê-lo afincadamente.    

Aqui chegados, volto à oração de sapiência do ‘sábio da paróquia’, que repete as investidas contra a ‘old boys network’ – curiosamente aquela a que pertenceu o seu pai, um bom amigo em quem sempre reconheci o gestor experiente, o secretário de Estado competente, o banqueiro responsável e um cavalheiro incapaz de leviandades. Caso para lamentar não poder parafrasear o poeta e dizer: «Ditosa Pátria, que tais Mestres tens!».