Nuno Pinto. Todos unidos para enfrentar o jogo mais difícil

Aos 32 anos, um dos capitães do Vitória de Setúbal ficou a saber que padece de um linfoma. Uma revelação chocante, atenuada unicamente pelo ‘prognóstico bom’ do médico sadino e pela atitude dos outros clubes, que por um momento puseram de parte as suas diferenças para se juntar à luta do defesa.

É um absoluto cliché, mas aplica-se na perfeição a esta situação: estas são aquelas notícias que ninguém gosta de dar. Pode tocar-nos a todos – ninguém está livre do flagelo; desta vez, tocou a Nuno Pinto, atleta, futebolista profissional de 32 anos e um dos capitães do Vitória de Setúbal. Num exame de rotina realizado pelo departamento médico sadino, o lateral-esquerdo descobriu que tem um linfoma (grupo de tumores de células sanguíneas cancerosos). A carreira, obviamente, ficou em suspenso: agora, o jogo da vida é o único que importa.

Titular indiscutível do Vitória nas últimas quatro temporadas, Nuno Pinto somava já 12 jogos esta época. O último encontro onde participou foi no passado dia 8, na receção ao_Benfica, saindo aos 77 minutos para dar lugar a Zequinha, no forcing final do conjunto orientado por Lito Vidigal para tentar evitar a derrota perante os encarnados. Na partida seguinte, em Portimão, o lateral-esquerdo ficou fora da ficha de jogo, o que foi visto como surpreendente para quem não estava a par da realidade que assolava já o conjunto vitoriano. Os rumores sobre um problema grave de saúde começaram a adensar-se e, no último domingo, surgiu então a conferência de imprensa promovida pelo presidente dos sadinos, na qual marcou presença todo o plantel, onde foi revelada a dura realidade.

 

II Liga no bolso e experiência lá fora

«É nestas horas que homens e instituições são colocados à prova. A notícia foi um verdadeiro choque para nós, mas no futebol estamos habituados a que na hora da derrota o primeiro pensamento é seguir-se uma vitória», frisou Vítor Hugo Valente, líder do Vitória, garantindo total apoio ao jogador por parte de toda a estrutura sadina. Ricardo Lopes, chefe do departamento médico do clube, revelou que Nuno Pinto «já está a ser acompanhado pelo IPO de Lisboa» e falou de um «prognóstico bom», demonstrando confiança numa recuperação plena – embora lembrando também que «o tipo e extensão do linfoma ainda não são completamente conhecidos, estando dependentes dos resultados dos exames realizados e ainda por realizar».

Muito emocionado, Nuno Pinto optou por não prestar declarações, ao contrário do capitão Vasco Fernandes. «Todos temos a certeza de que o Nuno vai vencer esta batalha. Tem a ajuda de grandes profissionais e de grandes pessoas, da família, dos pais, dos filhos, da mulher. Toda a gente vai ajudá-lo nesta batalha. Estaremos sempre com ele, em qualquer hora ou em qualquer momento. Ele é um dos nossos e nunca deixamos cair um dos nossos. Daqui a uns tempos vamos lembrar isto como mais uma batalha que vencemos», salientou o central.

A revelação do problema de saúde do jogador acabou por gerar uma onda de solidariedade e comunhão que se estendeu a praticamente todos os clubes do futebol profissional em Portugal. Rui Vitória, treinador do Benfica, foi um dos muitos que enviou «um abraço bem apertado» ao atleta. «Muitas vezes, nesta indústria e nesta sociedade em que vivemos, olhamos para a parte profissional e menos para o homem, mas neste momento é fundamental que o façamos», realçou, corroborado pelo técnico do Sporting, o holandês Marcel Keizer: «As notícias chegaram até nós e deixaram-nos abalados. Desejamos-lhe tudo do melhor e oferecemos-lhe toda a ajuda de que precisar. Há coisas mais importantes que o futebol.»

O próprio Nuno Pinto, já um pouco mais refeito do choque inicial, viria entretanto a recorrer às redes sociais para agradecer todas as mensagens de apoio e incentivo. «Quero agradecer o apoio que me estão a dar. Infelizmente não consigo responder a todos, mas a vossa força é a minha força e dentro em breve voltarei a fazer o que mais gosto. Fé, foco e força. Um obrigado do fundo do coração e lembrem-se que como eu existem milhares no nosso país, a saúde é a única coisa que não controlamos… Portanto, que isto seja um exemplo para todos. Este jogo é o mais importante da minha vida mas o resultado será só um: a Vitória», escreveu o defesa, ainda antes de ver a homenagem que Vitória de Setúbal e Braga tinham preparado para o encontro dos oitavos-de-final da Taça de Portugal, no Bonfim. Ao minuto 21 (o número da camisola de Nuno Pinto), os adeptos sadinos exibiram uma tarja com a cara do jogador e outra onde se podia ler «Os nossos não deixamos cair: força Nuno #21»; ao mesmo tempo, erguia-se outra inscrição na bancada afeta aos apoiantes bracarenses: «Nuno Pinto: força e coragem, guerreiro.» Um momento de arrepiar, com o estádio a levantar-se num aplauso conjunto para o jogador, que assistia à partida num camarote e que não conseguiu conter as lágrimas.

Nascido em Vila Nova de Gaia a 6 de agosto de 1986, Nuno Pinto cumpriu a grande maioria da sua formação como futebolista no Boavista, estreando-se na equipa sénior em 2006/07, aos 20 anos. Passou depois uma época no Trofense, onde conquistou o título de campeão da II Liga, e mudou-se para a Madeira, cumprindo três temporadas e meia no_Nacional. Em 2012 iniciou uma travessia de três anos e meio no estrangeiro, entre Levski de Sófia (Bulgária), Tavriya (Ucrânia) e Astra (Roménia). Regressou a Portugal em 2015/16, precisamente para jogar no Vitória de Setúbal; terá agora de fazer uma paragem na carreira para iniciar os tratamentos. Todos esperamos que seja apenas temporária: era muito bom sinal.