Miúcha. Cantar, respirar, ser Bossa Nova

Cantora tinha 81 anos

Foi Pela Luz dos Olhos Teus que a voz de Miúcha se tornou melodia presente nos ouvidos portugueses, mas também por sucessos como Minha Namorada e Maninha. A cantora, uma das musas da Bossa Nova, morreu na quinta-feira, no Hospital Samaritano do Rio de Janeiro, aos 81 anos, na sequência de um cancro no pulmão.

Na sua carreira de mais de quatro décadas, a cantora lançou 14 álbuns, quase sempre dedicados ao «cancioneiro dos maiores compositores da bossa nova: Tom Jobim, João Gilberto e Vinicius de Morais», lembrava ontem a Folha de São Paulo.

Vivia a música não só nos palcos, mas também em casa: esteve casada com João Gilberto. Juntos, tiveram uma filha, Bebel Gilberto, que seguiu as pisadas dos pais. E era também maninha de Chico Buarque. 

Heloísa Maria Buarque de Holanda, de seu nome completo, nasceu no Rio de Janeiro a 30 novembro de 1947. Filha de Sérgio Buarque de Holanda, historiador e jornalista brasileiro, e de Maria Amélia Cesário Alvim, que foi pintora e também pianista, Miúcha e Chico têm outras duas irmãs, Ana de Hollanda e Cristina Buarque. A família mudou-se para São Paulo quando Miúcha tinha oito anos, e os coros musicais formados com os irmãos marcaram os tempos de meninice. 

Foi estudar para Paris com 23 anos, em 1960, acabando por se formar em História da Arte na École du Louvre. Mas o seu caminho profissional acabaria por ser trilhado entre as pautas e foi precisamente na Europa que deu os primeiros passos no mundo da música. Embora partilhassem a nacionalidade, a artista e João Gilberto foram apresentados pela cantora chilena Violeta Parra, que Miúcha conheceu em Itália. Depois do casamento, o casal foi morar para Nova Iorque, onde nasceu Bebel, sua única filha.

 Foi já em 1975 que gravou pela primeira vez, profissionalmente, como cantora. A estreia aconteceu no disco The Best of Two Worlds, ao lado de João Gilberto e de Stan Getz. 

Nunca mais parou. Dois anos depois torna-se parceira musical de Tom Jobim, que com ela gravou dois discos, em 1977 e 1979. E foi um dos nomes – juntamente com Vinicius de Moraes, novamente Tom e Toquinho – do espetáculo organizado por Aloysio de Oliveira que, depois de estar em cena durante um ano, esteve em tournée na América do Sul e na Europa e ainda resultou no disco Tom, Vinícius, Toquinho e Miúcha (1977), gravado ao vivo no mítico Canecão, no Rio de Janeiro. O seu último álbum – Miúcha com Vinícius/Tom/João foi gravado há uma década. E apesar de ter ficado conhecida como

cantora, também compôs temas como Triste Alegria (1979), Todo Amor (1980) e No Carnaval de Olinda.

Toquinho é o único dos cantores do espetáculo de 77 no Canecão que continua vivo, como notou o próprio ao Globo, a propósito da perda da amiga. «Miúcha era uma pessoa muito musical, tão querida, que conhecia há mais de 50 anos.

Começámos nossa carreira juntos. É uma grande perda pela sua sensibilidade, musicalidade e sua visão generosa em relação à música. Além de ser um grande ser humano. É mais uma pessoa ligada a gente que vai embora na música brasileira. Agora, daqueles shows, só restou eu. Essa sensação é muito ruim, você vai ficando muito sozinho nas suas memórias, e isso é inevitável».