Tiros e tweets nos pés

Marcelo marcou encontro com o Papa Francisco nas Jornadas Mundiais da Juventude (Loures-Lisboa) em 2022

Lisboa, ou melhor Loures foi escolhida como anfitriã das próximas Jornadas Mundiais da Juventude – em 2022, já no segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa.

Não sei se Bernardino Soares saltou de alegria a clamar vitória alto e a bom som, como o fez Fernando Medina quando, depois de se comprometer com um investimento da Câmara de Lisboa de mais de 100 milhões de euros, soube que a capital portuguesa ia ficar com a organização da Web Summit nos próximos 10 anos (pudera!!!).

Se não o fez, mesmo comunista, devia.

No caso das Jornadas Mundiais da Juventude – que junta milhões de jovens de todo o mundo – o investimento da Câmara de Loures, aliás, será incomensuravelmente menor do que o da CML na Web Summit e o retorno é garantido e não daqueles que é preciso fazer uma ginástica extraordinária para se estabelecer uma relação de causa-efeito (quando existe). Até porque, se a Web Summit promete trazer a Portugal alguns dos cardeais da internet – já que os papas só aparecem via Skype ou videoconferência -, estas Jornadas trazem o Papa, o verdadeiro e único Sumo Pontífice, a Loures, em carne e osso.

É verdade que, cada vez mais, também a Igreja Católica Apostólica Romana aposta na internet e nos mais modernos recursos comunicacionais para espalhar a sua fé e a palavra do seu Deus.

«A internet e as redes sociais são um recurso dos nossos tempos, uma ocasião para nos mantermos em contacto uns com os outros, para partilharmos valores e projetos, e para exprimir o desejo de formar uma comunidade». As palavras são do Papa Francisco e foram proferidas na última oração Angelus, na Praça de S. Pedro, antes de partir para o Panamá – para as últimas Jornadas Mundiais da Juventude antes das de Loures.

Nessa oração, Francisco pediu aos crentes, sobretudo aos jovens, que descarreguem a aplicação Click to Pray – curiosamente criada por portugueses – para com ele rezarem o Rosário pela Paz.

 

Há umas décadas, quando as Igrejas de outras crenças começaram a ganhar praticantes e a aumentar os seus templos para receberem mais fieis nas suas cerimónias, transformadas em autênticas festas, com música, cantada e instrumentalizada, e coreografias baseadas no gospel norte-americano, a Igreja Católica Apostólica Romana tremeu e resolveu conceder: começou com o Pai Nosso e acrescentou mais uma ou outra encenação.

A Igreja perdeu gente e não foi por falta de festa, de música ou de cantorias.

Lembro-me em pequeno do padre, em plena missa e com maus modos, mandar calar a criancinha que, também impaciente, já não aguentava manter-se quieta no mesmo lugar – por azar dela, e do padre, logo na primeira fila.

E lembro-me também de um outro padre, já em Lisboa, recolher os cestinhos do ofertório e recolher-se à sacristia por instantes e voltar, com tudo somado, para desancar na falta de generosidade do seu rebanho. Se houvesse dízimo, como noutras igrejas…

Disso lembro-me eu – como me lembro de muitos e bons padres país fora.

 

Mas os crimes de pedofilia denunciados pelo mundo inteiro, o escândalo financeiro do Banco Ambrosiano e muitas outras práticas de uma Igreja opulenta e muito pouco católica foram bem mais fatais.

João Paulo II e, agora, Francisco – dois homens bons e simples – salvaram a Igreja de uma crise maior.

Mas a bondade e simplicidade do Papa não chegam.

E a Igreja sabe-o.

Daí também a necessidade da sua própria conversão à internet e às redes sociais.

Se bem que estas possam ser um pau de dois bicos, como ainda esta semana ironizava Bruno Nogueira, na TSF, a propósito de o Papa Francisco ter postado no seu Twitter: «Com o sim Maria é a mulher que maior influência teve na história. Sem redes sociais foi a primeira influencer, a influencer de Deus». Porque isto das redes sociais tem muito que se lhe diga. Tem virtudes, claro. Mas também tem defeitos. E riscos terríveis… porque não perdoam nem dão novas oportunidades.

 

Veja-se o exemplo da ida de Marcelo ao Panamá, às Jornadas Mundiais da Juventude em que o Papa confirmou que as próximas serão em Lisboa (em Loures).

Foi quase crucificado, já que é Presidente de um Estado laico.

Curiosamente, não se viram críticas quando, há uns meses, nesse mesmo Estado laico, as principais autoridades portuguesas, e não só o Presidente mas todas as demais, receberam com honras de Estado e excessiva deferência – para não se dizer apoucadora subserviência – o príncipe Aga Khan e sua notável comitiva.

Por isso, desta vez, Marcelo é injustiçado. Até porque, embora confesso católico praticante, tem sido um Presidente ecuménico – recebeu em 2016 em Belém os representantes de todas as religiões participantes no encontro na Mesquita de Lisboa e certamente estará disponível para receber da mesma forma outros líderes de outras crenças. Sejam elas quais forem. Já deu provas disso.