A vergonha do século

À Esquerda e à Direita

Pergunta de um jornalista da TSF: «A Caixa serviu durante muitos anos de depositário de boys dos partidos?». Resposta de Carlos César, líder da bancada parlamentar do PS e presidente do partido: «Não creio que se possa dizer assim. Eu já fui governante, exerci funções de Governo. Mal entrei para o Governo recebi um banqueiro que se me dirigiu desta forma: ‘Nós queremos trabalhar em conjunto com o Governo’. Até aí tudo bem. ‘Nós queremos manter uma informação, relação cordial de cooperação’, até aí tudo bem. ‘E sempre que o Governo tiver uma questão relativa a créditos que acha que devam ser concedidos, nós temos feito sempre isto e estamos dispostos a continuar a fazer’. Eu achei isso extraordinário, espantoso, mesmo. Mas pelos vistos isso com certeza era uma prática dominante e veja lá estou a falar dos anos 90, há 20 anos. Portanto eu sinto que há de certeza vestígios muito fortes ao longo do tempo de uma relação promíscua entre o poder político e o crédito bancário e as decisões que são tomadas pelas instituições de crédito. Sinto-me impelido a ter uma atitude vigilante e desconfiar do processo. É com este estado de espírito que vejo este caso da CGD. Não posso dizer previamente que o administrador tal é responsável por algo».

Esta declaração de César tem a data de 30 de janeiro de 2019 e demonstra bem o que os políticos portugueses são. Então há mais de 20 anos que Carlos César sabe do regabofe da CGD e de outros bancos e não fez nada até hoje? E é por essa razão que quer desvalorizar o relatório da auditoria? Não há dúvida que a caixa da CGD serviu durante muitos anos como slot machine dos amigos e dos amigos dos amigos dos governantes, mas ficámos desta forma cristalina a perceber que ninguém fez nada para contrariar esta pouca vergonha que tanto dinheiro tem custado aos portugueses. César acha normal que como governante não tenha chamado a atenção do primeiro-ministro e do ministro das Finanças, até porque era uma prática antiga.

Por essa razão, César e demais deputados do centrão – é completamente incompreensível a posição do PCP e do BE que nunca passaram pelo Governo, se descontarmos a ‘geringonça’ – nunca deram gás à auditoria e sempre esconderam os empréstimos ruinosos que foram feitos. É certo que o PSD e o CDS foram contra o fim da comissão de auditoria do Parlamento às contas da CGD. Mas quando estiveram no Governo o regabofe não foi o mesmo?

É óbvio que tudo isto é um caso de Polícia e que se existir coragem muito boa gente terá de responder por tamanho assalto às contas dos portugueses. Não venham com a história do BPN, BPP e afins. Investiguem tudo sem olharem a nomes ou a partidos. Com migalhas do que foi roubado aos portugueses não teríamos um salário mínimo nacional de 600 euros, não teríamos polícias sem carros para fazerem patrulhamento, enfermeiros a ganharem 900 euros, quando estudaram para terem uma vida melhor. Não teríamos médicos e enfermeiros formados pelo Estado a fugirem para o privado. Não teríamos a Educação e o país no estado em que está.

É natural que os deputados – muitos deles que já passaram por governos – queiram fechar os olhos a tudo isto e esquecer o mais rapidamente possível. Mas Lucília Gago que foi nomeada com tantas críticas tem aqui um papel determinante. Que não tenha medo de investigar até ao fim, tudo e todos, e que o Ministério Público leve a julgamento quem tem de responder pelo saque que foi feito às pobres contas dos portugueses. António Costa disse ontem que a greve dos enfermeiros é «selvagem». Selvagem é os portugueses terem visto quase 20 mil milhões de euros serem enterrados em bancos, uns privados, outro público, e os políticos quererem esconder quem nos roubou de uma forma tão escandalosa.