Nova legislatura brasileira começa com o antigo partido da ditadura no comando

O DEM, herdeiro da Arena, partido político da ditadura, conseguiu a presidência da Câmara e do Senado

O ano legislativo brasileiro começou hoje com grandes novidades: pela primeira vez desde o regresso da democracia ao Brasil, em 1985, que o PMDB, hoje MDB, não ficava sem a presidência de pelo menos uma das câmaras do Congresso do Brasil. Tanto a liderança da Câmara dos Deputados como a do Senado, e essa é a segunda novidade desta sessão legislativa, ficaram nas mãos do Democratas (DEM), um herdeiro direto da Arena, Aliança Renovadora Nacional, partido criado pela ditadura militar para dar sustentação política ao governo militar que emergiu do golpe de Estado de 1964.

Se a eleição de Rodrigo Maia para líder da Câmara dos Deputados estava anunciada, a de Davi Alcolumbre, um jovem senador do Amapá, protegido pelo ex-presidente José Sarney (o homem que a ditadura impôs como candidato a vice na primeira eleição democrática e que beneficiou da morte de Tancredo Neves antes de tomar posse), é outro cenário. Alcolumbre conseguiu ser eleito depois de duas sessões rocambolescas no Senado que incluíram o roubo da pasta com as questões da ordem do dia, insultos em catadupa que quase chegaram a vias de fato, exigências de voto de braço no ar que acabaram negadas pelo Supremo Tribunal Federal por não ser isso que diz o regulamento e, finalmente, a desistência de Renan Calheiros, do MDB, que concorria a um quinto mandato consecutivo.

Calheiros desistiu quando percebeu que ia perder o braço-de–ferro com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que manobrou nos bastidores para conseguir que o obscuro Alcolumbre se tornasse presidente do Senado, aos 41 anos.

“Acho que foi um excelente trabalho do ministro Onyx, muito bem feito, ele está de parabéns”, afirmou o vice-presidente, Hamilton Mourão. “Acho que, há duas semanas, a candidatura do Renan Calheiros estava muito mais forte. Mas quando o governo resolveu entrar diretamente contra, modificou. O governo concentrou todo um esforço em favor de Davi”, acrescentou o general.

As redes sociais serviram como centro de uma campanha negativa contra Calheiros, com nada menos que 892 862 tweets contra o senador de Alagoas em apenas três dias, de acordo com a consultora digital Bites, diz o site Poder 360.

“O senador alagoano transformou-se em epítome do que pode haver de ruim na política. Amalgamou para si esse sentimento dentro e fora do Congresso, sobretudo entre deputados e senadores novatos. Tornou-se uma espécie de ‘Geni do Senado’. Gritar ‘fora, Renan!’ virou sinónimo de ‘fora, velha política!’”, escreve Fernando Rodrigues no referido site.

Com esta dupla eleição, a sessão legislativa completa a viragem à direita do poder no Brasil, com o poder executivo e legislativo nas suas mãos. E com o líder do Senado a ter uma enorme dívida de gratidão política em relação ao governo.

“Temos que ter clareza que o objetivo de Renan Calheiros, junto com o PT, era fazer da presidência do Senado um bunker, uma cidadela de resistência contra o governo de Jair Bolsonaro”, afirmou o ministro da Casa Civil, em declarações à Rádio Jovem Pan. No entanto, apesar de ser um apoiante de Alcolumbre, Onyx Lorenzoni garantiu que não foi o governo que colocou o senador de Amapá na presidência, embora acrescentasse que Alcolumbre tem condições para conseguir os apoios necessários entre os senadores para aprovar as políticas importantes do executivo.