Corrupção & Tráfico de Influências, S. A.

Na cerimónia de abertura do ano judicial, a nova PGR puxou a corrupção para o centro das suas preocupações, afirmando: «Estamos longe de vencer a luta contra a corrupção». Nenhuma novidade, os portugueses pensam o mesmo. E envergonha-nos verificar que, de cada vez que muda o Presidente de um qualquer país de África ou da…

Na cerimónia de abertura do ano judicial, a nova PGR puxou a corrupção para o centro das suas preocupações, afirmando: «Estamos longe de vencer a luta contra a corrupção». Nenhuma novidade, os portugueses pensam o mesmo. E envergonha-nos verificar que, de cada vez que muda o Presidente de um qualquer país de África ou da América do Sul, a primeira proclamação é, justamente, a de que irá combater a corrupção. Sabendo-se o que se passa por lá, a comparação não é elogiosa. 

A situação está, porém, muito longe do que foi a moeda corrente nos fabulosos anos dos dinheiros para os partidos… e para as redes de angariadores. Foram anos de ouro para dois ‘produtos estrela’: o betão e os envelopes. Envelopes para quem decidia (ou podia influenciar a decisão) nos concursos públicos, a que se seguiam mais envelopes na hora de pagar as faturas. 

Chegava a informação de que as ditas estavam aprovadas, mas as construtoras sabiam que o cheque só seria emitido quando quem autorizava o pagamento recebesse o seu envelope. Eram as regras do jogo: pagar e calar. Tal como era para silenciar a chantagem contida nos amáveis pedidos de contribuição para as campanhas eleitorais. 

Tudo se sabia, com nomes e apelidos. Sabia-se na PGR, nos jornais e nos ‘meios bem informados’, mas tudo era varrido para debaixo do tapete… ‘O que os olhos não veem, o coração não sente’. Se houvesse notícia para o jornal, ou queixa na PGR, logo aparecia um solícito ‘anjo da guarda’ a abafar a coisa. 

Os dias da impunidade parecem coisa do passado, muito por obra do processo Face Oculta, onde valeu a firmeza de um procurador fora do controlo do Palácio Palmela, que não se deixou manietar. Foi o antídoto certo. Os bons ventos de Aveiro fizeram perder o medo e tiveram o condão de instaurar um novo paradigma. Hoje, as vergonhas que foram o Freeport e os submarinos já não passariam pelos intervalos da chuva de Lisboa. Mais umas aposentações no Ministério Público e a coisa irá ao sítio. E talvez deixe de haver acusações a reboque do que dizem os jornais, e arquivamentos mais que suspeitos.

Coisa parecida aconteceu com o tráfico de influências. O país nunca ignorou quem eram os ‘corretores’, mas faltava a coragem para os afrontar. Falava-se com um procurador, um juiz, um agente da Judiciária, um advogado, um jornalista, e brotava uma catadupa de nomes das cúpulas partidárias. Sempre os mesmos nomes. Também aqui a conivência e o segredo eram o seguro de grupo, de tal forma que Duarte Lima só viu a vida a andar pra trás quando se meteu em aventuras brasileiras. Os outros continuam por aí…  a pregar a moral republicana.

A bem de uma atmosfera mais respirável, o tráfico de influências foi criminalizado e já há um condenado. É um progresso. Quem sabe… um dia destes alguém decide dar uma volta nos arquivos e vai ser um Deus nos acuda! Mas não haverá surpresas, os ‘corretores’ não se aposentaram… e o grupo até engrossou.