Bernardo Silva: ‘O futebol vem muito da minha mãe que sempre foi aos jogos do Sporting’

Ficou conhecido como o Messi do Seixal, é fã assumido do Benfica, o único clube pelo qual voltaria a jogar num eventual regresso a Portugal, e por quem fez, aliás, a única tatuagem que carrega no corpo

O célebre jogo do ‘Quem é Quem?’ já foi adaptado ao futebol. As regras são simples: atiram-se três pistas e uma outra pessoa tem que tentar adivinhar de quem estamos a falar. Neste caso seria isto – joguei com Kylian Mbappé, jogo com Cristiano Ronaldo e sou treinado por Pep Guardiola. Já para quem não segue tão atentamente o desporto-rei, o caminho para levar as pessoas até à imagem do futebolista Bernardo Silva seria por aqui – ficou conhecido como o Messi do Seixal, é fã assumido do Benfica, o único clube pelo qual voltaria a jogar num eventual regresso a Portugal, e por quem fez, aliás, a única tatuagem que carrega no corpo. Com os pés bem assentes na terra, nem este mundo de milhões em que acabou por entrar lhe roubou a simplicidade, a humildade e a discrição. Ver a mãe, o pai e as irmãs felizes, diz, é o mais importante.

Que recordações tem da sua infância?

Cresci em Lisboa, tudo o que me lembro ou é em Lisboa ou na casa de férias dos meus avós, em Sesimbra. Desde que me lembro que existo, era sempre com a bola nos pés. Tanto na escola, como na praia e, portanto, grande parte das minhas lembranças foram a jogar futebol.

Era o típico betinho?

Acho que sim, acho que se pode dizer isso [risos]. Andei em colégios e naquela altura, e ainda hoje, acho que chamam a isso os ‘betinhos de Lisboa’.

Aqui, em Manchester, brincam muito consigo pela forma como se veste, dizem até que é o mais mal vestido, por usar camisas e calças bege. Como vê a ostentação dos jogadores?

São contextos e gostos diferentes. Acho que na moda e na forma como te vestes não há um estar bem ou mal, cada um veste-se da forma como gosta. Eu também não gosto de muitas coisas que eles usam. São só estilos diferentes.

Tornou-se viral a sua chegada à Cidade do Futebol por ter aparecido de Smart. Alguma vez pensou que o facto de chegar a um treino se tornasse viral por ter levado um carro mais modesto?

Quando saí do Mónaco para vir para Manchester tinha um carro europeu portanto podia conduzi-lo em qualquer parte. E, quando venho para Inglaterra, conduzir do lado contrário – porque aqui conduz-se do lado direito – pensei, eu não preciso de carro. Em Lisboa, só lá vou duas vezes por ano, aqui ainda por cima nem há paragem para passar o Natal. Em vez de ter o carro parado, vou vendê-lo. Quando vou a Lisboa, o segundo carro do meu pai é um Smart, e empresta-mo. Eu não preciso mais do que isto, é simplesmente isso. Quando vou para os treinos da seleção normalmente levo o Smart que o meu pai me empresta.

Como é que uma criança de oito anos decide ir para o Benfica?

Era como estava a dizer, eu desde que me lembro que existo, sempre adorei jogar futebol. Os meus pais perceberam isso e quando eu fiz sete anos, um dos meus presentes de aniversário, do meu avô e da minha mãe, que por acaso são sportinguistas, foi inscrever-me nas escolas do Benfica. Foi aí que tudo começou. Fui para as escolas do Benfica nos Olivais, depois chamaram-me para a competição…

Grande parte da sua família é sportinguista, julguei que era do contra [risos], mas, afinal, foram a sua mãe e o seu avô os grandes impulsionadores deste sonho?

A família da parte do meu pai é benfiquista, do lado da minha mãe é tudo sportinguista, mas eu fiquei benfiquista. Não querendo ir contra a minha vontade, que sempre quis jogar pelo Benfica, inscreveram-me.

O Benfica é, aliás, o responsável por ter fugido às ‘regras do betinho’, quando fez uma tatuagem com o lema do clube [E Pluribus Unum]?

[risos] Joguei doze anos no Benfica e foi uma coisa que fez sentido para mim. Tenho 24 anos, metade da minha vida passei-a no Benfica. Aprendi imenso, não só como jogador, como enquanto pessoa e, portanto, é uma coisa que vai ficar marcada para sempre na minha vida e que eu quis tatuar. É a única tatuagem que tenho e acho que é a única que vou ter.

Nos tempos de escola deu muitas dores de cabeça aos seus pais?

Acho que dava. Sempre fui um aluno com notas relativamente boas, mas nunca fui um aluno muito atento ou que gostasse muito de estudar e de fazer os trabalhos de casa. Eu gostava era de ir para a rua jogar futebol. Dava algumas dores de cabeça sim [risos].

O que faziam os seus pais?

O meu pai trabalhava numa empresa de segurança digital e a minha mãe era professora de história de arte e de história de moda.

O desporto surge na sua família na geração dos 90’s – uma vez que também tem uma prima, Matilde Fidalgo, no futebol – ou já existia alguém na vertente desportiva?

Sim, do lado da minha mãe tenho a minha prima Matilde, não em primeiro grau, que joga futebol. Mas o futebol vem muito da minha mãe que, apesar de ser mulher, sempre gostou muito e sempre foi ao estádio ver os jogos do Sporting. O meu pai, e eu gozo com ele, jogava muito bem, coisa que não é normal para uma pessoa que não tem carreira de futebolista e eu também jogava muito com ele.

Então não houve ninguém na sua família que já tivesse seguido carreira no mundo do desporto?

Que eu saiba não. Um familiar próximo sei que não.

E a sua mãe já se mudou para o Benfica?

Não, infelizmente não. A minha mãe, quando eu jogava no Benfica, se fosse um jogo contra o Sporting e eu saísse ao intervalo, na primeira parte estava pelo Benfica e na segunda torcia pelo Sporting [risos].

Alguma vez pensou que iria seguir carreira profissional de futebol?

Desde pequenino o meu sonho era ser jogador de futebol, agora tu nunca sabes se vais conseguir ou não. É muito difícil, em mil miúdos da formação só dois ou três é que chegam a um nível bom. Sempre foi o meu sonho e sempre fiz o meu melhor para chegar o mais longe possível. Felizmente consegui.

Destacou-se nas camadas jovens e na 2.ª Liga. Quando chega finalmente à equipa principal e o Jorge Jesus não lhe dá o espaço com que provavelmente sempre sonhou, como ficou? Chegou a duvidar das suas capacidades?

Não, isso nunca. O que eu pensei foi, eu fiz uma época na equipa B do Benfica, que na altura tinha um plantel muito forte e eu não fazia parte das escolhas do treinador. Achei que sair seria o melhor para o seguimento da minha carreira. Apesar de me ter magoado um bocadinho porque era o meu sonho estrear-me pela equipa principal do Benfica e ficar pelo menos alguns anos. Quando tomo a decisão de sair para bem da minha carreira, custou-me um bocado. Mas eu sabia que era a decisão certa.

Quando é emprestado ao Mónaco, como se sentiu?

Fiquei muito contente porque ia para um clube que jogava a Liga dos Campeões e que tinha o mesmo nível desportivo do Benfica, portanto um clube muito bom, que lutava por títulos em França. Foi uma oportunidade fantástica. A nível pessoal ia ser uma experiência ótima porque ia ser a primeira vez que ia sair de casa, viver sozinho, que ia aprender a fazer e a viver com uma data de coisas que até ao momento nunca tinha vivido, e isso foi ótimo para mim.

Hoje, acha que o Jorge Jesus é o típico treinador que não trabalha com a formação, o que acabou por ‘prejudicar’ o seu percurso no Benfica?

Não gosto de culpar uma ou duas pessoas até por que cada treinador tem as suas ideias e eu não as questiono. Agora, eu com as opções que tinha, tomei uma decisão. Claro que fiquei triste na altura e claro que achava que talvez pudesse ter tido mais oportunidades do que tive, mas sem mágoa nenhuma.

Quando vai para o Mónaco estava a poucos dias de fazer 20 anos…

Exatamente, até acho que assinei o contrato [de empréstimo] no meu dia de anos. Fazia 20 anos quando assinei pelo Mónaco [seis meses depois acabaria por assinar por 15 milhões pelo clube monegasco].

Foi um presente envenenado [risos]?

Não, não. Claro que estava triste por sair do meu clube do coração. Foram 12 anos no Benfica, também ia sair da minha cidade e ia separar-me da minha família e dos meus amigos, mas era um desafio novo e eu sempre gostei imenso de desafios. Ir para o Mónaco, uma cidade nova aprender uma língua nova, viver sozinho e passar por uma data de situações que me iam pôr à prova, foi ótimo.

Aprendeu a falar fluentemente francês?

Acho que falo bem sim, até porque a minha ex-namorada, com quem estive quatro anos, é francesa e ajudou-me bastante a aprender. Por outro lado, também estive lá três anos e falava quase todos os dias francês…

Como era o dia-a-dia no Mónaco?

No início foi um choque, é uma realidade completamente diferente. Por exemplo, não tem nada a ver com Lisboa, Manchester, Madrid, Barcelona…

Quais são as principais diferenças entre o Mónaco e Lisboa?

Primeiro, o Mónaco são dois km2, faz-se tudo a pé. E depois a nível de luxos: barcos, carros, restaurantes, a forma como as pessoas se vestem e até mesmo os cafés são as principais diferenças.

Alguma vez pensou que o físico pudesse ser um entrave para voos maiores?

Talvez quando tinha 15/16 anos no Benfica, porque nem sequer jogava na formação e aí sim foi um entrave para mim. Mas a partir do momento em que fui para os juniores comecei a jogar e, também na equipa B, nunca achei que o físico fosse um entrave até porque olhava para as principais equipas da Europa, e nessa altura, o Barcelona estava numa melhor fase, em que até era treinado pelo Guardiola, e a maior parte dos jogadores eram minúsculos [risos].

Já o ouvi dizer que por não ser tão alto melhorava outras técnicas como por exemplo o ser mais rápido, mais inteligente nas jogadas…

É assim, acho que o físico é importante, e claro que se eu puder ser uma bocadinho melhor fisicamente na próxima época do que sou nesta, eu vou trabalhar para isso. É bastante importante. Naturalmente há pessoas que nascem melhor do que outras a nível físico e quem não é tão desenvolvido nessa vertente ganha outras coisas. Tem de compensar, como tentar pensar mais rápido, perceber mais depressa onde a bola vai cair, meter melhor o corpo e isto são tudo formas que se vão ganhado com o tempo para compensar esse tipo de coisas.

Há quem diga que ainda existe preconceito com os jogadores intelectualmente mais desenvolvidos. Concorda?

Estou no futebol há pouco tempo e não sei como era antigamente mas olho para os meus colegas de equipa e vejo que dentro do nosso balneário, para aí de 25 jogadores, têm todos personalidades completamente diferentes e não vejo qualquer tipo de preconceito nem com um extremo ou com o outro. Vou dar um exemplo, o Kompany, que há pouco tempo tirou o Mestrado em Administração e Negócios, é uma pessoa super informada. O pai dele é político na Bélgica. Acho que hoje em dia no futebol já não há esse preconceito.

O que acha do regresso de Leonardo Jardim ao Mónaco, quatro meses depois de ter sido despedido? Ainda acompanha o Mónaco?

Acompanho! É um clube por quem tenho muito carinho, onde fui muito feliz, além de que foram impecáveis comigo lá, tanto os adeptos como o próprio clube. Fico contente que, tanto os adeptos como o clube, voltem a apostar num treinador que deu muito ao clube e acho que com ele, o Mónaco vai conseguir recuperar desta situação e conseguir manter-se na primeira divisão.

Depois de três anos no Mónaco, como recebe a notícia de um interesse do Manchester City?

Eu lembro-me, foi tudo muito rápido. Nós acabámos o último jogo da época e no dia a seguir estávamos nos festejos, até fomos ao Palácio ter com o príncipe. No dia seguinte eu ia de férias, quatro ou cinco dias, para Palma de Maiorca, antes de ir para a Seleção. Na segunda-feira vou para Maiorca e, na terça, liga-me o meu empresário a dizer: «Olha Bernardo, há isto, estas são as condições, queres não queres, como queres fazer?». E nem pensei duas vezes.

Houve outros clubes interessados?

É assim, falava-se nos jornais, mas eu ligo pouco a rumores. O meu empresário antes de acabar a época disse-me: «Eu não vou falar contigo sobre hipóteses nenhumas porque não quero que fiques desconcentrado. Foca-te no final da época e termina bem. Quando acabar a época falamos». A época acabou e a única proposta que chegou e o único clube realmente interessado em mim foi o City e eu fiquei muito contente. Foi a melhor decisão que podia ter tomado.

Em que língua falas com o Pep Guardiola?

Falamos em espanhol.

Passou muito rapidamente de suplente mais utilizado a titular indiscutível. Como é ouvir um treinador como o Guardiola dizer: «O City é Bernardo Silva e mais dez», ou «É um jogador perfeito»?

É ótimo ouvir o treinador dizer isso, ainda por cima um treinador como o Guardiola que toda a gente reconhece que é uma figura muito importante no futebol mundial e é um prazer poder trabalhar com ele. Hoje em dia sinto-me muito melhor jogador do que quando cheguei ao Manchester City também porque com ele aprendi imenso e é um orgulho poder trabalhar com o Guardiola e poder jogar neste clube.

O que lhe deu Leonardo Jardim? E Pep Guardiola?

Foram processos completamente diferentes. Quando chego ao Mónaco era um miúdo e tinha muito pouca experiência em jogos de alto nível. Quando chego ao City já sou um jogador mais feito. O Leonardo Jardim dá-me as oportunidades e tempo de jogo que eu preciso para crescer como jogador e foi um treinador fantástico para mim. Cresci imenso no Mónaco porque aprendi a lidar com a pressão dos grandes jogos. Jogámos a Liga dos Campeões, quartos-de-final, meias-finais, ganhámos um campeonato em que tivemos jogos com os grandes de França: PSG, Marselha, Lyon e portanto cresci imenso. Quando chego ao Manchester City, a nível tático, acho que ganho uma nova compreensão do futebol porque o Guardiola vê o futebol de uma maneira diferente e talvez também por ter sido jogador e ter jogado ao mais alto nível, percebe-nos de outra forma. São treinadores diferentes com quem adorei e estou a adorar trabalhar.

A transferência para Manchester custou ao City 50 milhões de euros, mas nem por isso deixou de ter os pés bem assentes na terra…

Acho que o dinheiro que se paga pelos jogadores nos dias de hoje, obviamente que são valores elevados, mas acho que os jogadores não devem ligar a isso. Se é o valor que se paga no mercado é o valor que se pratica. Tem de se aceitar. Sinceramente ter sido 50, 60 ou 40, isso a mim é-me igual.

Mas nunca se rendeu às modas do futebol. O que quero dizer é que nunca apareceu com um corte de cabelo mais ousado ou com brincos nas orelhas…

Um destes dias apareço com um cortezinho… [risos]. Estou a brincar. São gostos, sou assim, gosto de manter as coisas mais simples.

Nem o facto de receber mais do que o cidadão comum o fez tornar-se mais extravagante…

Depende dos gostos, eu também gosto de ter um bom relógio ou um bom carro. Já tive um bom carro no Mónaco, acho que são fases. Quando era mais novo gostava de ter um carro bom quando fosse mais velho, já o tive e hoje é uma coisa que já não me diz muito. Já me é indiferente ter um carro bom ou um carro normal. Depende muito de fases e de gostos.

As prioridades vão-se alterando?

Sim, claro que sim. Com a idade as prioridades mudam e começas a dar valor a outras coisas.

Quais as principais diferenças entre Mónaco e Manchester?

Sobretudo o tempo, o frio e a chuva, a comida… Em Portugal come-se muito bem e eu tive muita sorte quando fui para o Mónaco, que está entre Itália e França, que são talvez duas das melhores cozinhas do mundo, a seguir à nossa [risos], e em Manchester a nível gastronómico senti muita diferença. Relativamente à cidade, as pessoas falavam muito mal de Manchester e diziam que eu ia odiar mas até estou a gostar da cidade, não é tão má como as pessoas pensam. O centro da cidade é bastante pequenino mas as pessoas no norte de Inglaterra são muito simpáticas e o ambiente nos restaurantes e bares é muito porreiro. Estou a gostar de Manchester. É assim, cresci no centro de Lisboa, estou habituado a confusão e gosto da confusão, mas Manchester é uma cidade boa.

Por falar em restaurantes… Li que prefere frequentar o restaurante do Juan Mata – jogador do Manchester United – do que o restaurante do seu treinador Pep Guardiola...

Já fui aos dois. São ambos muito bons e diferentes, um é de cozinha espanhola e o outro de cozinha catalã. No início até gozava e dizia que era tudo igual porque eram restaurantes de tapas. Mas a verdade é que não são. O restaurante do Guardiola abriu há pouco tempo só lá fui uma vez, ao do Juan Mata já fui bastantes vezes. Gosto imenso dos dois.

Segundo percebi, o restaurante do Guardiola é caro?

Eu estava a brincar [risos], mas não faz desconto. O restaurante é ótimo e apesar de o treinador não fazer desconto, vale a pena ir [risos].

Como é a vida no pós-treino? E os hobbies nos tempos livres?

Tenho muitas visitas. Por exemplo, agora tenho cá a minha irmã, o meu sobrinho, o meu cunhado, a minha mãe, as minhas tias, os meus primos, tenho cá imensas pessoas. Vão-se embora, chegam o meu pai e os meus amigos. Tenho sempre cá bastante gente. Quando estou sozinho, durante três ou quatro dias seguidos, também gosto de estar sozinho e de não haver barulho em casa.

Três a quatro dias é o máximo tempo em que está sozinho?

Sim, porque depois estou sempre em viagens por causa dos jogos fora. Nunca fico mais do que três dias sozinho, mas quando estou acabo por ir ao centro da cidade jantar com colegas de equipa. Quando tenho algum tempo, meto a mantinha e fico em casa a ver Netflix [risos].

Joga PlayStation?

Não tenho PlayStation. Só vejo séries.

Tem alguma superstição ou ritual antes de entrar em campo?

Não, não. Gosto é de fazer sempre as mesmas coisas. Mas sem superstições.

O que quer dizer com fazer sempre as mesmas coisas?

Gosto sempre de tomar um café uma hora antes do jogo, comer sempre a mesma refeição antes do jogo, mas isso é por que me sinto bem fisicamente a fazer as coisas assim e não por ser supersticioso.

No final do ano de 2018 fez uma publicação nas redes sociais que desagradou a alguns adeptos mais fervorosos do Manchester City. Colocou uma fotografia no casamento da sua irmã classificando como o melhor momento do ano para si, numa altura em que o City foi campeão com 100 pontos conquistados. Qual é a importância da família?

Acho que a família é o mais importante. Adoro o que faço, e contribui bastante para a minha felicidade se as coisas me correm bem no futebol, mas ver a minha mãe, o meu pai e as minhas irmãs felizes é a coisa mais importante para mim. Acho que para toda a gente, é o normal. E o casamento da minha irmã ainda por cima foi muito giro e o melhor momento do meu ano, por isso fiz essa publicação no meu Instagram.

Pensa em casar?

Um dia mais tarde. Não agora, até porque estou solteiro [risos].

É uma pessoa romântica?

Acho que não, não. Ou pelo menos a minha ex-namorada queixava-se disso mesmo [risos]. Não sou muito, mas também não sou demasiado duro, acho eu. Mas sim quero um dia ter filhos e casar, mas não está nos meus planos pelo menos nos próximos dois anos.

Houve agora uns rumores de um possível interesse do Real Madrid. É verdade?

Não sei de nada. Muito sinceramente acho que são só rumores. Nem estou preocupado neste momento, estou muito contente aqui no City, tenho mais três anos e meio de contrato e não quero pensar nisso nesta altura.

Estamos em ano de fase final da Liga das Nações, como olha para o projeto Seleção neste momento?

Acho que depois do Mundial houve uma mudança, uma nova geração que chegou à Seleção. Quando cheguei à Seleção, há pouco mais de quatro anos, ainda apanhei toda a geração antiga e agora já não há quase nenhum dos primeiros que apanhei. É uma nova era. Espero que alguns ainda voltem porque são muito importantes, inclusivamente o Cristiano Ronaldo, para ajudar na qualificação e se possível na Final Four.

Enquanto companheiros de equipa, não têm a perceção se Cristiano Ronaldo pensa voltar ou se é apenas uma pausa?

Sinceramente não sei. Gostava que ele voltasse, toda a gente sabe o quanto o Cristiano é importante para nós. Mas não faço ideia.

Podemos estar descansados numa Seleção pós Ronaldo uma vez que temos o Messi do Seixal?

[risos] Essas comparações, claro que são na brincadeira, mas falando a sério, a nossa Seleção tem uma nova geração muito forte e agora também com os miúdos que estão a aparecer e que ainda nem sequer foram à Seleção, acho que podemos fazer uma Seleção muito forte nos próximos anos.

Com que jogadores tem mais empatia? Não só na Seleção como no City?

Na Seleção, o João Moutinho, com quem joguei no Mónaco durante três anos. Ficou não só um companheiro de equipa como também um amigo. Também me dou muito bem com o Cédric [Soares]. Mas dou-me bem com muitos jogadores. O Cancelo, também joguei muitos anos com ele no Benfica. Aqui no City dou-me muito bem com muita gente, obviamente que me dou super bem com os meus colegas brasileiros por partilharmos a mesma língua. Também com o Mendy, o Stones…

Não tenho um melhor amigo aqui, dou-me bastante bem com várias pessoas no clube.

Nas redes sociais consegue perceber-se que o ambiente parece ser muito saudável…

O ambiente é muito bom neste balneário. Mas já apanhei balneários menos bons, não vou dizer quais mas já apanhei. Não foi no City, cujo ambiente é fantástico, mas já apanhei ambientes de balneário em que os jogadores não gostam uns dos outros, arranjam problemas, e isso é uma grande chatice também para o desenvolvimento da equipa e felizmente aqui isso não acontece.

Esse mau ambiente que refere pode influenciar de forma direta os jogos?

Influencia bastante, bastante.

Acompanha todos os jogos do Benfica?

Sempre que posso vejo e gosto. As pessoas sabem que sou benfiquista. Ultimamente não tenho conseguido, por exemplo, o Benfica jogou no passado domingo frente ao Sporting e eu estava a ter jogo ao mesmo tempo, na quarta-feira a mesma situação. Às vezes não consigo conciliar, mas sempre que posso vejo.

O Ederson também acompanha?

Sim, sim. O Ederson também gosta muito do Benfica. O Danilo, o Mangala e o Otamendi, gostam muito do FC Porto e há sempre umas picardias saudáveis [risos]. O Ederson guarda muito boas recordações do Benfica e os jogadores que passaram pelo FC Porto também guardam muito boas relações do FC Porto.

Sendo benfiquista, o que achou desta transição de Rui Vitória para Bruno Lage?

A época claramente não estava a correr bem este ano e, portanto, para o choque moral talvez tenha sido bom e os resultados estão à vista. O Benfica está agora numa fase boa, espero que possa continuar assim. Desde que o treinador mudou, a verdade é que a equipa está a jogar melhor e a ter melhores resultados, talvez tenha sido positivo sim.

Qual foi o golo mais importante da sua carreira?

Foi no Mónaco, contra o Paris Saint-Germain (1-1) ao minuto 93. Foi no ano em que ganhámos o campeonato. Estávamos a perder e acho que se perdêssemos este jogo passávamos para segundo. Marcámos no último minuto do jogo e conseguimos manter o primeiro lugar nessa altura [janeiro] e a partir daí nunca mais saímos do primeiro lugar. Por isso, acho que esse foi talvez o golo mais importante da minha carreira.

Como foi jogar com Mbappé?

Fantástico, ele é um jogador que pode ganhar a Bola de Ouro nos próximos anos. É um jogador com um potencial fantástico. Mas não só ele, naquela equipa havia também o Lemar que agora está no Atlético de Madrid, é um jogador fantástico, o Fabinho que está no Liverpool é um jogador fantástico, o Bakayoko que foi para o Chelsea, o João Moutinho, o Mendy, o Falcão. Tínhamos uma equipa fantástica e todos juntos conseguimos fazer uma época impressionante.

Existe o provérbio ‘Nunca digas nunca’. Já disse que, em Portugal, nunca representaria o Sporting ou o FC Porto. Depois do bate-boca nas redes sociais com o dirigente de comunicação do FC Porto, Francisco J. Marques, foi-lhe feito ‘um convite’ para jogar no FC Porto em jeito de tréguas. Algum dia mudará de ideias?

Não, acho que já disse isto várias vezes e volto a repetir, não por odiar o Sporting ou o Porto mas simplesmente porque sou benfiquista e se voltasse para Portugal teria de ser para estar feliz e para voltar para a minha família e amigos. Portanto, se eu voltasse para Portugal para jogar pelo Sporting ou pelo Porto, para representar clubes que são os meus rivais, eu não me iria sentir bem. Não porque não os respeito, porque respeito bastante, mas simplesmente porque sou benfiquista e não tenho problema nenhum em voltar a dizer: se voltar para Portugal, só para o Benfica!

Portanto de azul e leão [símbolo da Liga inglesa], só mesmo na Premier League?

Leão de signo e o azul do City é azul bebé, não é azul escuro [risos].

Mas tinha noção das proporções que aquela publicação que colocou no Twitter sobre a arbitragem no jogo do clássico iam tomar?

 

Não tinha, sinceramente não tinha. Foi até com algum humor e sem qualquer intenção de criticar ou magoar clubes ou adeptos rivais, mas essa é a forma como se vive o nosso futebol hoje em dia. As pessoas são muito quentes e vivem num mundo de picardias. Sempre que acham que há ali qualquer coisa que possa picar aproveitam.

Não se mete noutra?

Não, não me meto noutra. Eu já me esquecia da forma como se vive o futebol português porque já não estou lá há algum tempo e portanto este clima de falta de fairplay e de desportivismo que, por exemplo, aqui em Inglaterra não há, em Portugal continua a haver e isso não é bom para ninguém.

Em Inglaterra vive-se o futebol de uma forma mais saudável?

Sim, e até achei piada ao comentário que o diretor de comunicação do FC Porto me fez e acho que não teve mal nenhum o bate-boca que houve.

Comentou há pouco tempo que Sérgio Conceição seria um bom treinador para a Premier League. Deve ter visto a atitude que o treinador do FC Porto teve na final da Taça da Liga. Referiu que em Inglaterra não existe espaço para determinados comportamentos…

O que eu acho é que todas as equipas que Sérgio Conceição treinou estão bem organizadas e que jogam bom futebol. Falo com os jogadores do Porto que estão na Seleção que confirmam isso, portanto é bastante óbvio que é bom treinador. Quanto ao resto, era como estava a dizer, são formas diferente de viver o futebol. Em Inglaterra não se vive o futebol dessa forma e eu já me habituei, tanto em França como aqui, porque em França também não é tão mau como em Portugal, a tentar viver o futebol dessa forma. Para mim é melhor a forma como se vive o futebol inglês, mas são formas diferentes e tem de se respeitar.

Estaremos a anos-luz de conseguir ter uma realidade mais parecida com a inglesa?

Acho que nunca lá vamos chegar.

O VAR vem ajudar ou piorar?

Sou a favor do VAR, e sou a favor porque acho que é uma ferramenta que ajuda os árbitros a errar menos. Aquilo que acho é que os árbitros têm de tentar aprender e adaptarem-se ao VAR o mais rapidamente possível. Aquilo que acontece é, se não houver VAR e os árbitros errarem há desculpa para errar porque não tiveram auxílio mas com esse auxílio, os adeptos vão ser sempre muito menos tolerantes ao erro. Sou adepto do Benfica, há um penálti que não é assinalado, se o árbitro não tem VAR eu até percebo: «Olha, se calhar não viu, não dá, às vezes é difícil», mas se o árbitro tem VAR e não viu o penálti então acho que deixa de ser aceitável. Sou a favor do VAR por ser um auxílio para os árbitros começarem a errar menos mas deve ser bem utilizado e deve ser feito um esforço para as regras serem claras e as pessoas saberem exatamente o que vai acontecer sem os erros que têm existido nos últimos tempos. Não estou a falar só no caso do Benfica, não interessa para que lado é, estou a falar de um modo geral, em tudo.

Mas o VAR não tira um pouco a emoção do jogo, como por exemplo nos tempos de espera que existem para validar um golo?

Sim, claro que é um bocado mais chato. Agora os jogadores não sabem bem se podem festejar o golo ou não mas no geral, até para acabar com estas polémicas de arbitragem, é bom os árbitros terem auxílio. Agora, com o tempo deve-se arranjar uma forma para que a decisão seja rápida para os jogadores poderem festejar o golo e para o jogo poder ser retomado com toda a normalidade.

Para finalizar, uma adaptação do jogo de ‘Matar, beijar e casar’. As hipóteses são: Jorge Jesus, Pep Guardiola, Fernando Santos e Leonardo Jardim. Quem mataria? A quem ligaria numa situação de aperto? Com quem ia de férias? Quem mandava fazer 200 flexões?

Eishhh. Olha eu não matava ninguém. Acho que sabe a resposta mas não matava ninguém [risos]. Qual era a segunda pergunta? [risos] 200 flexões? Mandava o Guardiola fazer, que é o mais novo e o que se safava melhor. Numa situação de aperto ligava ao Fernando Santos, que é o mais avozinho. De férias teria de ir com o Leonardo Jardim. Íamos para o Mónaco, tranquilos, beber umas cervejas e estávamos porreiros.