‘O risco está na atuação das milícias paramilitares’

O eurodeputado português, que chegou na sexta-feira à fronteira colombiano-venezuelana, não tem dúvidas que Guaidó vai tentar forçar a entrada da ajuda humanitária na Venezuela.

Qual o objetivo desta missão da União Europeia (UE)?

A missão não é da UE; é simplesmente do Grupo Partido Popular Europeu (PPE). É liderada por mim, enquanto vice-presidente do grupo, e pelo vice-presidente espanhol, [Esteban] González Pons. A vinda a Cúcuta, na fronteira Colômbia/Venezuela, tem essencialmente um objetivo de apoiar o processo de entrada da ajuda humanitária – essencial para a alimentação e saúde de milhões de venezuelanos, aí incluída obviamente a comunidade portuguesa. Faremos visitas circunstanciadas aos campos de refugiados e às ONG que estão no terreno. O objetivo político de facilitar o processo de transição política é importante, haverá reuniões com vários chefes de Estado da América Latina (Colômbia, Chile, Paraguai, Argentina). Mas, obviamente, aqui a prioridade é a missão humanitária.

A delegação do PPE vai integrar a coluna de ajuda humanitária e entrar na Venezuela?

Integrar a coluna propriamente dita não está previsto. Visitar as quatro pontes e estar no impulso inicial está. Em todo o caso, só no sábado e no terreno se pode avaliar qual o grau de desenvolvimento.

Acredita que Juan Guaidó irá mesmo forçar a entrada na Venezuela?

Não tenho dúvidas de que isso vai ser feito. Agora tudo depende da abertura maior ou menor das Forças Armadas . O risco maior, neste momento, não é tanto o exército venezuelano, de quem se espera disciplina, contenção e responsabilidade. O risco está na atuação das milícias paramilitares formadas no chavismo, muito apoiadas por Maduro, mas muito mais dificilmente controláveis.

Nicolás Maduro fechou a fronteira com o Brasil e poderá fechar a fronteira com a Colômbia. O que pensa disso?

É uma séria probabilidade, mas não significa necessariamente que a coluna de ajuda humanitária não consiga entrar. Depende da atitude dos militares e da disposição e composição da própria coluna. Mais uma vez digo, o risco de segurança está do lado das milícias.

Maduro parece sentir-se mais reforçado a cada dia que passa neste impasse. O que pensa disso?

Não vejo nenhum sinal de reforço de Maduro, o que não significa que não esteja ‘entrincheirado’ no seu nicho militar. A informação recolhida até ao momento aponta para um isolamento progressivo de Maduro. Militares na reserva – do tempo de Chávez – e baixas patentes dão sinais de mudança.

Não acha que ao fim de quatro meses, Guaidó perdeu o momentum?

A impressão é exatamente a contrária. Aqui no terreno, pelo menos, nas hostes de exilados e refugiados parece haver um grande entusiasmo em volta da transição e de Guaidó. O crescimento do apoio internacional vai no mesmo sentido. O movimento por eleições presidenciais livres e justas não perdeu chama até ao momento.

Maduro desafiou Guaidó a convocar eleições e este não aceitou. O que pensa disso?

Sinceramente, julgo que até esta altura, Guaidó e os que o rodeiam têm mostrado um enorme sentido de responsabilidade e estão cientes do poderio de facto que ainda está nas mãos de Maduro. Guaidó está a dar os diferentes passos com segurança. As eleições não podem ser organizadas sem novos cadernos eleitorais e até recenseamento, tal é o grau de viciação a que se chegou. Vai ser precisa uma enorme cooperação internacional e aí a UE pode ter um papel.

Não tem receio que possa haver violência este sábado?

Quanto à ocorrência de violência,  ela não pode ser excluída. Tanto quanto estamos informados, um pequeno incidente pode ter efeitos de escala, já de relevo. Mais uma vez, será preciso distinguir as Forças Armadas das milícias. A tensão é alta, mas o apelo à contenção de todos está omnipresente.

O ministro da Defesa Vladimir Padrino falou que só por cima dos cadáveres dos que apoiam o regime venezuelano se conseguirá forçar a queda de Maduro, aparentemente a oposição falhou em conseguir trazer os militares para a oposição. O que acha dessa situação?

Não creio que as coisas sejam tão lineares. Pelo que posso avaliar, haverá sempre um núcleo irredutível e esse será intransigente. Mas uma afirmação tão rotunda, parece exagerada. Insisto: reservistas e baixas patentes parecem muito pouco inclinados a ficar com Maduro até ao fim. Claro que, mesmo desapossada do poder, a manutenção de uma fação armada pode criar um clima propício a uma situação prolongada de guerrilha e a uma instabilidade mais duradoura do que o esperado. É cedo para fazer prognósticos tão definitivos. Estamos mesmo no olho do furacão.