Presidente da Anacom sob forte contestação

Operadores e agora os CTT consideram-se prejudicados pelas decisões de João Cadete de Matos. O SOL sabe que não existe comunicação entre o presidente e as empresas reguladas.

Presidente da Anacom sob forte contestação

O presidente da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) tem estado debaixo de fogo junto das empresas do setor e não só. O SOL sabe que João Cadete de Matos é acusado, interna e externamente, de ser «centralista» e de ter «o culto da personalidade». Aliás, uma das críticas que lhe são feitas deve-se ao facto de fazer-se acompanhar por dois engenheiros que filmam todas as intervenções de Cadete de Matos.

Mas críticas ao presidente da Anacom vão muito mais além. Ao que o SOL apurou, internamente, o plano de reestruturação projetado pelo presidente do regulador e que prevê a criação de quatro direções gerais está a ser muito contestado, uma vez que a ideia de João Cadete de Matos é recorrrer a pessoas externas, e da sua confiança, nomeadamente provenientes do Banco de Portugal. Também o facto de o responsável viajar em classe executiva mesmo em viagens curtas – ao contrário dos membros do Governo que o nomeiam  – vem reforçar esse mal-estar na Anacom. 

O verniz estalou entre o regulador e as operadoras de telecomunicações em setembro passado, no congresso da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC), destinado a discutir o estado da nação das comunicações. E continua até aos dias de hoje. 

O SOL sabe que não existe comunicação entre o regulador e os agentes do mercado – ao contrário da prática de diferentes conselhos anteriores – nem existem formas de cooperação entre o regulador e as empresas do setor. 
O mais recente caso diz respeito às declarações de João Cadete de Matos, que, esta semana, no Parlamento, criticou os períodos de fidelização por parte das operadoras de telecomunicações. Estas já reagiram e ameaçam subir os preços das mensalidades e das adesões a novos contratos, se os deputados aprovarem a proposta da Anacom para limitar os custos a pagar pelo cliente em caso de quebra de um contrato antes do prazo estabelecido. 

Apesar de manter o período máximo de fidelização em 24 meses, o regulador quer limitar os custos no caso de o cliente pretender terminar o contrato na primeira metade do período de fidelização, pagando 20% das mensalidades até ao fim do contrato. Se pretender suspender o contrato na segunda metade do período de fidelização, o montante a pagar desceria para 10%.

Uma proposta que, segundo a Associação de Operadores de Telecomunicações (Apritel), «não é mais do que uma forma dissimulada de acabar ou restringir severamente este instrumento que tem permitido aos consumidores ter acesso a produtos e serviços com elevada qualidade e aos melhores preços», disse em comunicado.

As operadoras falam também em consequências «muito graves», afirmando que pôr fim à fidelização «levará, inevitavelmente, ao aumento dos custos de ativação e instalação a suportar pelos clientes no momento inicial da adesão ao serviço, ao aumento das mensalidades e à diminuição da quantidade de produtos e de descontos oferecidos».

A este somam-se outros casos ‘problemáticos’. Tal como o dos tarifários e da neutralidade da internet, que levou os operadores a unirem-se e a enviarem um comunicado comum. O regulador revelou que pretendia obrigar a MEO, a Vodafone e a NOS a alterarem as ofertas por considerar «que violavam as regras da neutralidade da rede e do roaming». 

Outra crítica diz respeito à forma como o regulador tem anunciado as medidas: sem qualquer apresentação ou discussão prévia com as empresas do setor. 

No caso da decisão dos tarifários, o episódio repetiu-se. Uma dessas vozes foi a de Miguel Almeida, CEO da NOS. «Fomos surpreendidos por uma conferência de imprensa. Não estávamos habituados a funcionar assim. É estranho que o regulador não trabalhe com os operadores no sentido de melhorar o setor e assim melhorar o contributo do setor para a sociedade. Esta forma de trabalhar é relativamente estranha», disse em março do ano passado.
Também a decisão do regulador de impor a descida das terminações móveis criou mal estar nas empresas do setor. Desde julho que os operadores móveis passaram a receber menos pelas chamadas que terminam nas suas redes, mas também pagam menos: em vez de 0,75 cêntimos passou a custar 0,42 cêntimos por minuto. 

CTT entram na guerra
Mas se a relação problemática entre a Anacom e os operadores de telecomunicações não é nova, no caso dos CTT a guerra é mais recente e ganhou grandes proporções ao longo desta semana. Em causa está o número de reclamações dos Correios. A Anacom acusou na terça-feira a empresa de Francisco Lacerda de utilizar a nomenclatura ‘reclamações’ para englobar as queixas e os pedidos de informação para que mostrar que tinham sido alvo de uma redução de 7% no ano passado, quando o regulador diz que aumentaram 43% nesse período. Logo a seguir os CTT voltaram a garantir essa diminuição. 

Em resposta, Cadete de Matos disse no Parlamento que já avançou com proposta de alteração da lei para contemplar regime sancionatório para a prestação de informações enganosas. De acordo com o responsável, a lei deve prever mecanismos para «dissuadir qualquer tentativa de prestação de informação abusiva». 
Segundo o regulador, a legislação deve determinar «regras muito objetivas quanto às responsabilidades das empresas e gestores na prestação de informação. E, por isso, nas alterações legislativas que enviámos ao governo, prevemos a alteração do regime sancionatório nesta matéria».

Já em relação aos indicadores da qualidade do serviço dos Correios, o responsável admite que têm vindo a degradar-se, com a empresa a ficar perto dos «mínimos exigidos».

Acusações que tiveram resposta por parte dos CTT, que, na conferência de imprensa de apresentação dos resultados, levaram Francisco Lacerda a garantir que a sua empresa «não mente», acrescentando ainda que a empresa «não presta informação enganosa, nem mente às populações, nem às autoridades».
O gestor sublinhou ainda que «os CTT não estão a abandonar as populações, antes pelo contrário», referindo-se às queixas sobre o fecho de lojas e, sobre o assunto específico das reclamações, garante que os Correios «seguem a norma europeia».