Cirurgião esfaqueado enquanto fazia intervenção no Hospital de Peniche

Médico foi agredido em pleno serviço. Hospital diz que agressor é um doente com perturbação mental

Um cirurgião de 62 anos foi esfaqueado enquanto fazia uma pequena cirurgia no Hospital de Peniche, que pertence ao Centro Hospitalar do Oeste. O i apurou que o médico estava a fazer uma intervenção num gabinete próprio quando foi atacado por trás por um homem que conseguiu entrar no hospital com uma faca e não tinha chamado a atenção da segurança até ao momento do ataque.

Elsa Banza, administradora do centro hospitalar, adiantou à agência Lusa que o agressor era um doente com perturbação psiquiátrica seguido no hospital, afastando um cenário de falta de segurança. O médico, esfaqueado três vezes na zona da coxa, acabou por ser transportado para o Hospital das Caldas da Rainha. Ao final do dia encontrava-se estável.

A agressão aconteceu por volta da hora de almoço num dia em que o cirurgião que habitualmente trabalha no Hospital das Caldas da Rainha, que pertence ao mesmo centro hospitalar, estava a fazer consultas e pequena cirurgia em Peniche.

Apesar de não ser inédito haver alguns desacatos na zona da urgência, não há registo de uma agressão tão grave na unidade. Foi chamada ao local a PSP de Peniche. Segundo o “JN”, o agressor foi detido e será presente esta terça-feira a um juiz de instrução criminal.

Elsa Banza, presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar do Oeste, adiantou à agência Lusa que o agressor ia para consulta na urgência quando, ao passar pelo o gabinete onde o cirurgião estava a atender outro doente, entrou e desferiu os golpes, causando ferimentos superficiais no médico.

Mais de duas agressões por dia

Os episódios de violência contra profissionais de saúde têm estado a merecer crescente atenção. A Ordem dos Médicos condenou ao final do dia de ontem a agressão em Peniche. “Este caso é o espelho da grave situação de insegurança que se vive no SNS e de um clima de conflitualidade institucional que, infelizmente, é alimentado pela própria tutela e que não dignifica nem beneficia ninguém”, disse em comunicado o bastonário Miguel Guimarães. 

A preocupação não é de agora. A Direção Geral da Saúde tem desde 2007 um Observatório Nacional da Violência Contra os Profissionais de Saúde no Local de Trabalho, que tem como objetivo estudar um fenómeno que a Organização Mundial de Saúde encara com um problema de saúde pública. Estima-se mesmo que 50% dos profissionais de saúde sofram pelo menos um episódio de violência física ou psicológica a cada ano. 

O último relatório divulgado pela DGS contém dados referentes a 2015. Ainda assim, há duas semanas a agência Lusa avançou estatísticas mais recentes, que apontam para um recorde de episódios denunciados em 2018. Foram notificadas 953 agressões, mais 275 do que no ano anterior, o que dá mais de dois episódios por dia nos hospitais e centros de saúde. Em mais de metade das situações o agressor é utente ou doente, sendo nas restantes familiares, mas também colegas da  vítima. O grupo profissional com mais agressões reportadas é a dos enfermeiros, seguindo-se os casos que envolvem médicos, assistentes técnicos e assistentes operacionais. Miguel Guimarães liga o aumento dos casos ao “desinvestimento” no SNS, que cria ambientes de tensão, e pede intervenção rápida à tutela. “Os médicos estão a ser obrigados a cumprir horários desumanos e a dar resposta a um número de doentes que está muito para lá do aceitável e que os coloca em situações de sofrimento ético, com prejuízo para a qualidade e a segurança clínica”

Fontes do setor ouvidas pelo i admitem que apesar de estarem a aumentar as comunicações à DGS, esta é uma realidade ainda subestimada a nível nacional. O último estudo anual da Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiar, referente a 2017/2018, apontou para uma realidade bastante comum nos serviços. Segundo o levantamento feito pela associação,  80,2% das Unidades de Saúde Familiar tinham registado nos 12 meses anteriores casos de ameaça/agressão verbal contra profissionais de saúde e em 14% havia registo de episódios de violência física. 

As estatísticas da Procuradoria Geral Distrital de Lisboa indicam que no primeiro semestre de 2018, último período com dados disponíveis, foram instaurados sete inquéritos por crimes contra profissionais de saúde. O site da PGDL tem mesmo uma área com esclarecimentos aos profissionais de saúde, indicando que a “violência contra os profissionais de saúde no local de trabalho deve ser considerada como uma disfunção grave do sistema de saúde e como tal combatida.” A violência constitui crime público quando praticada contra funcionário públicos, sendo a denúncia obrigatória.