Rajoy testemunha no julgamento dos independentistas catalães

Começou a fase de testemunhos do julgamento dos dirigentes catalães. O Vox quer afirmar-se como principal defensor da unidade de Espanha

A fase de testemunhos do julgamento dos líderes catalães começou ontem, com elevada tensão política pela polarização entre as várias testemunhas, que foram desde Joan Tardà, porta-voz da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) no Congresso, até ao ex-primeiro-ministro Mariano Rajoy e Soraya Sáenz de Santamaría, ex-vice de Rajoy e encarregada da aplicação do artigo 155, que suspendeu a autonomia catalã.

À acusação do Estado espanhol junta-se a acusação popular, dirigida por Javier Ortega Smith, secretário-geral do partido de extrema-direita Vox. Os nacionalistas pretendem afirmar-se como os mais acérrimos defensores da unidade de Espanha, face ao desafio lançado pelos independentistas catalães.

“Estou a entrar na casa dos horrores”, afirmou Tardà ao entrar no Supremo Tribunal espanhol. O dirigente da ERC explicou que “aqui há homens e mulheres inocentes”, “eleitos democraticamente pelo seu povo”, que “estão a sofrer por terem defendido a democracia”. Descreveu o julgamento como sendo “inspirado pela vingança” por parte de um Estado “humilhado pela presença de urnas”. Tardà referiu ainda que tal não deveria ocorrer “numa sociedade avançada, que se diz democrática, no coração da Europa”.

 Antes de testemunhar, Tardà pediu o direito de responder em catalão às perguntas dos nacionalistas do Vox – intenção imediatamente negada por Manuel Marchena, presidente do Supremo, que exigiu que a testemunha se expressasse na língua oficial do Estado. 

Perante a linha de questionamento de Pedro Fernández, advogado do Vox, o juiz chegou a adverti-lo para não pedir “juízos de valor sobre movimentos políticos ou sociais”, mas sim factos concretos. O advogado do Vox já defendeu que a liberdade de expressão está “sujeita aos limites impostos pela segurança nacional e integridade territorial”, devendo ter em conta a “defesa da ordem”. 

Face às questões, Tardà defendeu que o referendo à independência catalã, ilegal à luz da Constituição espanhola, foi a “vontade de um povo indefeso, pacífico e democrático”. Criticou a subsequente atuação policial, garantindo que “nem a unidade de Espanha nem a independência da Catalunha valem a mínima violência”.

Já Santamaría justificou a violência policial sobre os voluntários para a realização do referendo dado que ocorreu “por ordem judicial”, face a um “referendo ilegal”. A antiga vice-primeira-ministra afirmou que a polícia evitou “circunstâncias muito mais graves”, uma vez que os independentistas estariam a organizar “ajuntamentos com atos violentos”.

Além de desejar a condenação dos líderes catalães, o Vox também quer minar o Partido Popular, com quem disputa eleitorado, e acusa-o de ter tido uma atuação pouco firme, sob a direção de Rajoy e Santamaría. Ambos foram questionados pelo Vox sobre reuniões com membros do governo autonómico antes de aplicarem o artigo 155, tentando sugerir que houve cumplicidade entre os conservadores e os independentistas.

Rajoy garantiu que as reuniões foram necessárias devido ao protocolo institucional e que terá deixado claro que “em caso algum iria contornar a legalidade constitucional”. O ex-primeiro-ministro disse que o então presidente do governo regional catalão, Carles Puigdemont, “estava consciente de que [Rajoy] não iria autorizar o referendo”, salientando: “Eu não negoceio nem a soberania nem a unidade nacional.” 

O ex-primeiro-ministro defendeu ainda que a aplicação do artigo 155 “foi o mais justo”, ao invés de impor o estado de emergência, como sugeriu a acusação popular do Vox.