A tirania dos parentes de António Costa

O Estado moderno é impessoal: a administração não é composta pela família e amigos do governante

António Costa, primeiro-ministro, poderia ter ido sozinho com a mulher ao programa televisivo de Cristina Ferreira, uma vez que os filhos são maiores. Mas levou o filho maior e a nora. Quem pensar, porém, que se tratou de um acaso, tem de pensar de novo. António Costa fez o que os seres humanos fazem naturalmente: privilegiam os filhos e os parentes.

Pedro Miguel Tadeu Costa é já um autarca em Lisboa, apesar de terem saído umas historietas, aquando dos negócios imobiliários dos pais, sobre a exploração de um qualquer café. Com efeito, basta consultar o executivo da junta de freguesia de Campo de Ourique (PS), para se ficar a saber que é vogal da junta com os pelouros de higiene urbana, inovação e empreendedorismo, economia local, sistemas de educação e desporto.

E foi o jovem Pedro Costa que, na Assembleia Municipal, enquanto deputado municipal, fez a intervenção de fundo do Partido Socialista no dia 26 de fevereiro – o dia de informação escrita do presidente –, uma das sessões mais relevantes da Assembleia Municipal.

Quem achar isto normal, pode parar de ler este artigo aqui; quem achar isto anormal, pode continuar a ler.

Desde há duzentos anos que Rosseau, Darwin ou Marx (só para falar em autores que todos conhecem) escrevem sobre as sociedades primitivas, as europeias, mas também sobre a Índia ou sobre a China, ensinando-nos que as primeiras formas de organização eram assentes no parentesco, existindo até uma coisa chamada ‘a tirania dos primos’.

Quando estudaram o desenvolvimento político, perceberam que as instituições políticas mudavam com o tempo. Passámos de sociedades tribais para sociedades organizadas sob a forma de Estado. Segundo Max Weber, existem dois tipos de Estado – o patrimonial e o moderno. Nos patrimoniais, «a comunidade é considerada propriedade pessoal do governante e a administração do Estado é essencialmente o prolongamento da sua casa. Mantêm-se em funcionamento as formas naturais da sociabilidade e do recurso à família e aos amigos».

Pelo contrário, vinca Max Weber, «o Estado moderno é impessoal: a relação do cidadão com o governante não depende de laços pessoais, apenas do seu estatuto de cidadão. A administração do Estado não é composta pela família e amigos do governante».

Nos Estados modernos, os governos têm um papel determinante no controlo das elites e na redistribuição (função básica de todas as sociedades democráticas). O Estado tem de controlar as elites mais ricas e poderosas da sociedade, sob pena de estas se apoderarem do sistema político.

O aparelho do Estado não pode por isso ser capturado por conjuntos de famílias e seus parentes. Isto demonstra que em Portugal ou nunca chegámos a construir um Estado moderno ou construímos um que já se encontra em acelerada decadência.

Obrigada àqueles que leram o artigo até ao fim. Mostra que ainda estão preocupados com o país.

sofiarocha@sol.pt