O turismo em Lisboa

O que é que Portugal tem que ver com a Croácia, Hong Kong, Áustria, Grécia, Singapura, Irlanda, Dinamarca, Espanha, Geórgia, Eslovénia e Albânia?

Em 2009, não tinha nada que ver; mas em 2019 tem muito em comum: faz parte de um pequeno grupo de países, identificado pelo Banco Mundial, que têm mais turistas do que residentes.

Nas eleições autárquicas de Lisboa, em 2009, ainda era tema de campanha o estado de abandono da Baixa: moravam umas escassas dezenas de habitantes na freguesia do Castelo. Em 2009, a cidade ainda se organizava em 53 freguesias. António Costa ganhou as eleições e Pedro Santana Lopes passou a líder da oposição. Logo no início do mandato, discutia-se a necessidade de instalar vídeo vigilância na Baixa porque, a partir das 18h00, caía um manto de silêncio e com ele vinha o medo dos residentes, sobretudo dos idosos. O turismo ainda não fazia parte da agenda política e eleitoral.

As eleições autárquicas de 2013 em Lisboa foram marcadas pela grave situação económica do país e a presença da troika. Foram também as primeiras eleições autárquicas com a nova reforma administrativa: de 53, passámos para 24 freguesias, muito maiores, claro está. A Baixa, mais Mouraria e Alfama, deram lugar à freguesia de Santa Maria Maior. O ar pesava como chumbo: o turismo voltou a não fazer parte da agenda política e eleitoral dessa campanha.

Em 2017, porém, tinha mudado tudo. A economia tinha dado sinais de retoma logo em 2014, a troika havia saído e devagar o país recuperava. O ambiente económico mudara, mas a campanha autárquica dos partidos políticos não refletia bem a realidade. E qual era a realidade? Era a que se via a olho nu nas freguesias de Santa Maria Maior e Misericórdia (Bairro Alto).

O Banco Mundial explica, mostrando o ratio entre residentes e turistas. Portugal, em 2009, para cada residente havia 0.6 turista. Em 2013, passava-se para 0.8 turista. Em 2014, atingia-se a igualdade: um turista para cada residente. E em 2017 alcança-se esse marco histórico de, para um residente, termos 1.5 turistas. Ou seja: desde 2017 temos mais turistas do que residentes. O fenómeno cresceu ainda mais em 2018 e 2019.

O fenómeno é tão raro, que poucos países no mundo são assim. À nossa frente, com ainda mais turistas do que residentes, só temos onze países. Podemos dizer que Portugal faz parte de um clube muito especial e restrito. 

Em Lisboa, o turismo acabou com o desemprego. A nova indústria absorveu — em hotéis, restaurantes e atividades conexas — a mão-de-obra disponível. Mas criou um problema grave (e novo) de habitação para a classe média.

Portugal tem turismo, Lisboa vive do turismo. As pessoas têm trabalho, mas deixaram de ter casas. E agora?

sofiarocha@sol.pt