«Amo a vida e tu?»

Esta frase afirma: «Amo a vida e tu?». Escrita na parede por alguém que se sentia feliz, nesta declaração há ainda tempo para interrogar quem passa sobre a sua felicidade, perguntando-lhe, num tom de grande proximidade, se também ama a vida.

Amar a vida é uma bênção, sentir-se bem e feliz uma grande alegria.

Não é fácil amar a vida. Podemos gostar daquilo que nos calha em sorte, dos frutos que colhemos a partir do que semeamos, daquilo que temos, fazemos ou sentimos, mas gostar incondicionalmente da vida a ponto de a amarmos é algo bem mais difícil.

Jeanne de Vietinghoff escreveu um poema a que Yourcenar chamou o poema da sua vida, em que diz: “Para quê fazer da vida um dever se ela pode ser um sorriso?”.

Há quem ame a vida espontaneamente e a sua alegria de viver se torne contagiante, influenciando a vida e ações dos outros. Há pessoas luminosas, radiosas, que iluminam o caminho dos outros e os fazem questionar porque não são assim, porque não têm aquela energia ou porque não são capazes de uma alegria tão intensa. Este questionamento é, por si só, uma forma de se deixar influenciar pela alegria dos outros. Mas a alegria interior, o amor à vida é, para quem o sente, tão natural como respirar, sem que o próprio se questione porque assim é.

Para amarmos a vida é fundamental sentimo-nos bem connosco próprios, com os nossos defeitos e as nossas virtudes, com os nossos dias bons ou maus, com a nossa leveza alegre ou a nossa soturna tristeza. Amar a vida implica aceitá-la como ela é, com o que tem de positivo, alegre, e o que tem de negativo ou triste.

Não podemos gostar da vida apenas quando tudo nos corre de feição, quando temos um trabalho de que gostamos, uma família como sonhámos, amigos quase perfeitos que nos apoiam em tudo, uma casa maravilhosa, arrumada e bem decorada, filhos obedientes e com boas notas, cães ou gatos carinhosos e bem-educados, quando assistimos a uma boa peça de teatro ou a um concerto, quando ajudamos alguém sem pensar no retorno, quando a vida é perfeita, bonita, como se tivéssemos aplicado um toque de magia ou de Photoshop em nós e no que vemos.

É possível gostar da vida mesmo quando não fazemos o trabalho com que sonhámos porque, se virmos bem, esse trabalho permitiu-nos eventualmente conhecer alguém que se tornou especial para nós, ou porque nos permite juntar dinheiro para viajar nas férias. A nossa casa pode não ser um modelo de beleza ou não estar localizada onde gostaríamos, mas é nossa, é nela que nos sentimos bem. Há, quase sempre, formas de olharmos em volta e nos apercebermos de todo o bem que temos, apesar de, por vezes, nem essa constatação nos fazer felizes… Diz Vinicius de Moraes: «É claro que a vida é boa / E a alegria a única indizível emoção / (…) / E tenho tudo para ser feliz // Mas acontece que eu sou triste…»

Amar a vida é olhá-la com aceitação por tudo aquilo que nos traz, na certeza de que tudo tem um momento certo. Há momentos em que conhecemos as pessoas certas e outros em que afastamos as pessoas que não deviam fazer parte da nossa vida; há momentos em que acertamos e outros em que erramos; há ocasiões em que rimos e outras em que choramos. Mas tudo isso faz parte da vida, da beleza que é viver, sem falsas encenações, sem «posts» apenas para os outros fazerem «like»…