Japão. O descendente dos deuses diz adeus ao seu reinado

O imperador Akihito abdicou do trono devido a problemas de saúde. Foi sucedido pelo filho Naruhito, que inaugura uma nova era no Japão.

Pela primeira vez em dois séculos um imperador japonês abdicou do Trono do Crisântemo. A idade e a saúde em declínio do imperador Akihito, de 85 anos, terá sido o motivo do fim do seu reinado de 30 anos, a chamada época Heisei – em português “alcançar a paz” – que terminou ontem à meia-noite. A cerimónia religiosa de abdicação decorreu ontem de manhã, no palácio imperial, onde Akihito informou os seus antepassados da sua decisão, como ditam os preceitos da religião shinto.

Num momento simbólico do percurso histórico do Japão – que procurou conservar as suas tradições milenares ao mesmo que acompanhava as práticas ocidentais – o imperador iniciou a sua abdicação num manto cerimonial, carregando os selos reais, juntamente com a espada sagrada uma jóia simbólica da família real, para depois fazer o seu discurso vestido de uma jaqueta ao estilo ocidental. 

Akihito mostrou-se “profundamente grato pela aceitação do povo”, entre o qual desfruta de grande popularidade, tendo sido o primeiro imperador japonês com esse grau de proximidade das populações. Durante séculos, o imperador foi mais que um mero soberano no imaginário japonês, mas sim a imagem de um semi-deus na terra, descendentes diretos da deus do sol, a criadora do Japão, Amaterasu. Foi o pai de Akihito, o imperador Hirohito, que abdicou desse papel, como condição para continuar a governar após a sua derrota na Segunda Guerra Mundial. Akihito abraçou o papel que o pai foi obrigado a ter, afirmando-se como chefe-de-Estado sem poderes políticos e focado sobretudo na diplomacia, uma área em que foi reconhecido internacionalmente.

Agora, Akihito é sucedido pelo seu filho, o príncipe Naruhito, de 59 anos, formado em história na Universidade de Oxford. O novo soberano enfrenta o desafio de não ser capturado pela agenda nacionalista do primeiro-ministro Shinzo Abe – de quem o antigo imperador era considerado um crítico silencioso. O percurso diplomático de Akihito foi exatamente o contrário da política de Abe, que quer reafirmar geopoliticamente o Japão, voltando a estabelecer o seu exército, desmantelado após a Segunda Guerra Mundial.  

As dificuldades surgiram ainda nem tinha começado o reinado de Naruhito, com o nome da nova era imperial, Reiwa, escolhido pelo executivo em funções. A expressão pode querer dizer “bela harmonia” ou “ordem e harmonia” – algo que os opositores de Abe consideram simbólico do crescente autoritarismo do Governo japonês.