Para onde caminha o mundo?

Relatório de agência das Nações Unidas apresentado esta semana revela dados preocupantes sobre o futuro das espécies, das florestas e dos oceanos. Mas os especialistas dizem que nem tudo está perdido.

Um milhão de animais está em vias de extinção. 40% da população mundial não tem acesso a água potável. Desde o ano 1900, o nível do mar aumentou entre 16 a 21 centímetros. Estas são algumas das conclusões do relatório da IPBES – Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas para a Biodiversidade e Ecossistemas, uma agência das Nações Unidas.

O documento, escrito por 145 especialistas de 50 países, foi apresentado esta semana em Paris. E as conclusões não são nada animadoras: o planeta está a perder espécies selvagens a um ritmo «dez milhares de vezes superior ao que tem sido identificado, em média, nos últimos dez milhões de anos».

Existem cinco fatores que estão a contribuir para a extinção das espécies: mudanças no uso da terra e do mar – desde a era pré-industrial, o Homem alterou 75% do ambiente terrestre e 66% do ambiente marinho; exploração direta dos organismos – a pesca, por exemplo, está a ser praticada a ritmos insustentáveis; alterações climáticas – o aquecimento global está a ter impacto em quase metade dos mamíferos ameaçados; poluição; crescimento do número de espécies invasivas – desde a década de 70 que este problema cresceu 70%.

O relatório refere que um quarto dos mamíferos, mais de 40% dos anfíbios e 10% dos insetos podem ter os dias contados na Terra. «Ecossistemas, espécies, populações selvagens, raças de animais e plantas domésticas estão a diminuir, a deteriorar-se ou a desaparecer. A rede de vida essencial ao Planeta Terra está a tornar-se cada vez mais pequena. Esta perda é resultado direto da atividade do Homem e constitui uma ameaça direta ao bem-estar dos seres humanos de todas as regiões do mundo», refere o documento.

Outra das questões abordadas no relatório é o uso (e abuso) das terras para consumo do Homem. O relatório diz, por exemplo, que «o valor das colheitas agrícolas aumentou cerca de 300% desde 1970». Além disso, o documento refere que, todos os anos, são extraídos do planeta cerca de 60 mil milhões de toneladas de recursos renováveis e não renováveis – valor que duplicou desde 1980.

O uso do plástico é outro tema que preocupa os especialistas. Segundo o novo relatório, a poluição associada a este material é dez vezes superior à registada na década de 80. Anualmente, são deitadas ao mar entre 300 e 400 milhões de toneladas de metais pesados, solventes, materiais tóxicos e outros tipos de lixo associados à indústria do plástico.

Ainda há tempo para recuperar

Na apresentação, Robert Watson, químico britânico que foi presidente da IPBES, afirmou que o relatório apenas acrescenta alguns detalhes à mensagem que os cientistas têm tentado passar nos últimos 30 anos: «A biodiversidade não é apenas uma questão ligada à natureza. É um tema ligado a questões económicas, morais, políticas e de segurança.

Estamos a percorrer o caminho que irá destruir o bem-estar das próximas gerações de seres humanos».
E para aqueles que acham que não têm nada a ver com este problema e que não serão afetados pelo que se está a passar no outro lado do mundo, Kate Braman, membro do painel de especialistas da IPBES, deixa um aviso: «Este relatório mostra que existirá um impacto nas cidades – desde os parques urbanos até à gestão de problemas como sistemas de prevenção de cheias, passando pela poluição urbana. O que acontece do outro lado do mundo volta até nós para afetar o nosso dia-a-dia, seja de que forma for».

Mas nem tudo está perdido: os autores do estudo dizem que os estragos ainda não são permanentes. Para os reverter, é preciso agir rapidamente:  «Ainda há tempo para o planeta recuperar, mas isso só acontecerá se as nossas ações forem drásticas», acrescenta a especialista.

Alimentação e agricultura

Desde 1970, o número de produções agrícolas aumentou 300%
23% das terras agrícolas entraram em de gradação
75% das colheitas agrícolas dependem da polinização animal
Anualmente, ficam ‘sequestradas’ nos ecossistemas marinhos e terrestres 5,6 gigatoneladas de emissões de CO2
Cerca de 11% da população está subnutrida
Menos de 33% da superfície terrestres é dedicada à produção agrícola ou pecuária
Apenas 25% da área do planeta sem gelo é usada para pastorícia
100 mil milhões de dólares é o dinheiro que os países da OCDE gastaram em 2015 em práticas agrícolas potencialmente nocivas para o ambiente
Dos gases de efeito de estufa gerados no dia-a-dia, 25% surgem durante a limpeza das terras, a produção de colheiras e a fertilização dos campos. A produção de produtos alimentares de origem animal contribui com os restantes 75%

Pesca e oceanos

33% do stock de animais marinhos para consumo está a ser pescado de forma ambientalmente insustentável
Mais de 55% dos oceanos está ‘ocupado’ pela pesca industrial
Até ao final do século XXI, entre 3% a 25% da biomassa marinha deverá desaparecer devido às alterações climáticas
Segundo dados de 2011, 33% da pesca feita em todo o mundo é ilegal, não está regulada nem é reportada às autoridades
Entre 1970 e 2000, o número de algas foi diminuindo 10% a cada 10 anos
Desde 1870, já desapareceu cerca de 50% da grande barreira de coral
A perda de habitat costeiro está a colocar em risco entre 100 e 300 milhões de pessoas
Existem cerca de 400 ‘zonas mortas’ no ecossistema costeiro causadas pelo uso de fertilizantes, que afetam cerca de 245 mil km2
Os esforços de conservação em diferentes ilhas já ajudaram a salvar mais de 107 espécies de pássaros, mamíferos e répteis da zona costeira, ameaçados por espécies invasoras

Florestas

A produção de madeira aumentou 45% desde 1970
Atualmente, existem cerca de 13 milhões de empregos ligados à indústria florestal
50% do crescimento da agricultura foi feito à custa da degradação da floresta
Hoje em dia, só sobrevive 68% da área global florestal que existia na era pré-industrial
Entre 1990 e 2015, desapareceram 290 milhões de hectares de floresta primária devido à produção de madeira
Entre 10 e 15% da madeira fornecida mundialmente provém de atividades ilegais
Entre 1990 e 2015, houve um aumento de 110 milhões de hectares na área de floresta plantada
Hoje em dia, existem menos de dois mil milhões de pessoas em todo o mundo que dependem da madeira enquanto combustível para satisfazer as suas necessidades energéticas

Saúde

Hoje em dia, 70% dos medicamentos para doenças cancerígenas são naturais ou sintéticos com componentes naturais
Cerca de quatro mil milhões de pessoas em todo o mundo dependem numa primeira fase de remédios naturais
17% das doenças infecciosas espalham-se através dos animais. Este problema causa, anualmente, mais de 700 mil mortes
Cerca de 821 milhões de pessoas nos continentes africano e asiático estão em risco de enfrentar escassez de comida
40% da população mundial não tem acesso a água potável
Mais de 80% do desperdício de água é ‘largado’ sem qualquer tratamento no meio ambiente
Entre 300 e 400 milhões de toneladas de materiais pesados, solventes, lixo tóxico e outras componentes industriais são largadas nos oceanos anualmente
Desde 1980, existe dez vezes mais poluição feita a partir de plástico

Urbanização e desenvolvimento

O crescimento de áreas urbanas aumentou mais de 100% desde 1992
Até 2050, deverão ser alcatroados cerca de 25 milhões de quilómetros. 90% das obras deverão ocorrer nos países menos desenvolvidos
Existem cerca de 50 mil barragens e cerca de 17 milhões de reservatórios de água
Desde 1970, a população humana aumentou 105%: de 3,7 mil milhões de pessoas para 7,6 mil milhões. Este crescimento foi desigual em diferentes partes do mundo
O produto interno bruto é 50 vezes superior nos países desenvolvidos quando comparando com os países em desenvolvimento
Atualmente, existem mais de 2500 conflitos ligados à procura de combustíveis fósseis, comida, água ou território
Entre 2002 e 2013, mais de 1000 ativistas ambientais e jornalistas foram mortos

Alterações climáticas

As temperaturas têm aumentado entre 0,2 e 0,1 ºC por década. Em 2017, os termómetros marcavam, em média, mais 1 ºC do que na era pré-industrial

Nas duas últimas décadas, o nível médio do mar tem aumentado mais de 3 milímetros por ano

Desde o ano 1900, o nível do mar aumentou entre 16 e 21 centímetros

Desde 1980, as emissões de gases de efeito de estufa aumentaram 100% l Entre 2009 e 2013, houve um aumento de 40% na pegada de carbono gerada pelo turismo

8% do total das emissões de gases de efeito de estufa são provocadas por transportes ou alimentação relacionados com o turismo

Estima-se que o aquecimento global seja responsável por 5% da extinção das espécies quando os termómetros registarem um aumento de 2ºC. A percentagem cresce para os 16% quando o termómetro chegar aos 4.3ºC