Modi consolida o poder com mais uma vitória estrondosa

O Governo não cumpriu a promessa de diminuir o desemprego, mas isso não impediu uma clara reeleição. 

O primeiro-ministro da Índia, o nacionalista hindu Narendra Modi, garantiu mais um mandato de cinco anos nas maiores eleições democráticas do mundo, com cerca de 900 milhões de eleitores e que se prolongam por mais de um mês. As sondagens à boca da urna dão uma vitória estrondosa ao partido de Modi, o Partido do Povo Indiano (BJP), que terá assegurado cerca de 300 dos 543 deputados do Parlamento indiano, possivelmente mais que os 282 que conseguiu nas eleições de 2014 – o melhor resultado de qualquer partido em 30 anos.

A nova vitória do BJP indica que o seu sucesso em 2014 não foi circunstancial, mas sim uma rejeição sistemática do projeto de um Estado laico por parte da sociedade indiana. Que se está a mover cada vez mais na direção da agenda supremacista hindu que Modi levou a cabo no seu mandato. Levantando grandes receios entre as minorias religiosas do país – particularmente entre os mais de 176 milhões de muçulmanos.

Apesar do líder do Partido do Povo Indiano prometer “construir uma Índia mais forte e inclusiva”, resta saber o que significa fazer parte do povo indiano para Modi. Significa ser cidadão aos olhos do Estado ou hindu? É impossível não reparar que uma das candidatas do seu partido é Pragya Singh Thakur, uma freira hindu acusada de orquestrar um atentado à bomba que matou seis muçulmanos, em 2008.

Enquanto os nacionalistas celebravam por todo o país, o principal opositor de Modi, Rahul Gandhi, líder do Partido do Congresso, tentava aplacar os seus apoiantes, assumindo a responsabilidade da derrota, por entre a especulação de que estaria prestes a anunciar a sua demissão. Estima-se que o Partido do Congresso – que dominou a arena política indiana durante décadas – tenha conseguido menos de uma centena de deputados, arriscando perder o seu bastião histórico na cidade de Amethi, no estado de Uttar Pradesh.

O apelido de Rahul – que é filho, neto e bisneto de primeiros-ministros (Neru, Indira e Rajiv) – acarreta um grande peso na Índia, mas parece ter acabado por prejudicar o candidato, que tentava mostrar uma imagem de renovação do seu partido. “O Congresso devia largar a dinastia”, escreveu no Twitter o proeminente colunista Ramachandra Guha.

A dimensão da vitória do primeiro-ministro surpreendeu a maioria dos analistas, dado que em janeiro as sondagens davam-lhe a menor taxa de aprovação de sempre – apenas 46%, quando o ano passado ultrapassou os 65%. Esta quebra tem sido relacionada com o brutal aumento da taxa de desemprego, junto com a perda de direitos laborais, num país em que 92% dos empregos são informais. Uma situação agravada pela diminuição dos rendimentos agrícolas, que levaram centenas de milhares de agricultores a marchar sobre Nova Deli, ainda em fevereiro passado. Longe ficaram as promessas de Modi de criar 10 milhões de empregos por ano, através de uma estratégia de incentivo ao investimento estrangeiro e ao empreendorismo que acabou por falhar.

Contudo, o primeiro-ministro parece ter encontrado a fórmula mágica para afastar o debate político dos problemas económicos do país, centrando-o no conflito regional entre a Índia e o Paquistão, em Caxemira – disputada desde a independência de ambos os países do domínio britânico. Os dois vizinhos nucleares chegaram a enfrentar-se em combates aéreos, em finais de fevereiro, depois da força aérea indiana bombardear supostos campos de treino dos extremista islâmicos do Jaish-e-Mohammad – responsáveis por um atentado suicida que matou 40 paramilitares indianos.

Enquanto o Paquistão assegurava que os bombardeamentos do país vizinho apenas tinham vitimado algumas árvores em montes desertos – não os cerca de 300 extremistas que o Governo de Modi disse ter morto –  os apelos belicistas de Modi conseguiram galvanizar o sentimento nacionalista hindu. O conflito assentou que nem uma luva ao primeiro-ministro, que construiu uma imagem de homem forte, utilizando até como slogan eleitoral o termo “chowkidar”, que significa algo como “guardião”. 

O dirigente do Partido do Congresso Navjot Singh Sidhu tentou desmistificar o assunto no Twitter: “Qual o propósito do ataque? Estava a desenraizar terroristas ou árvores? Foi um golpe eleitoral? O engano toma a nossa terra sob o disfarce de combater um inimigo externo”. Apesar dos protestos da oposição, a partir desse momento as sondagens mostraram sempre um aumento sustentado da popularidade de Modi – que acusou o Congresso e os seus aliados de quererem “beneficiar os inimigos” da nação.