Homenagem a Nechama Rivlin: em momento de luto, Israel demonstra a sua vida

Neste momento de luto do Presidente Reuven Rivlin e de toda a nação israelita, as mensagens de condolências e de solidariedade na dor da perda chegaram de sítios inesperados

1.Faleceu ontem a Primeira-Dama de Israel Nechama Rivlin, esposa de quarenta anos do Presidente de Israel, Reuven Rivlin.

 No dia em que comemoraria 74 anos de vida –idade quase coincidente com a do próprio Estado de Israel, integrando, portanto, a primeira geração de judeus que viu e viveu a concretização do ideal de justiça histórica mínimo, que é o de reconhecer à nação judaica o Estado que é seu, no território que lhes pertence, por vontade divina que o Homem não ignora  -, Nechama Rivlin deixou-nos, passando a descansar eternamente ao lado dos notáveis cimeiros que construíram (e constroem) a História de Israel, mesmo antes da criação do Estado de Israel.

Simbolicamente, a Primeira-Dama de Israel jazerá ao lado de Theodore Herzl – um homem guiado pela Justiça, um visionário, que ousou dar estruturação lógica ao sonho que tantos haveriam sonhado, que tantos haveriam ainda de sonhar.

Que permitiu, enfim, que hoje tantos vivam o sonho do Estado sonhado – e que permitirá que amanhã outros tantos (ainda mais!) sonhem o Estado hoje já vivido.

Efectivamente, a questão que se coloca nos nossos dias já não é o direito do povo judeu de se organizar numa comunidade territorial politicamente organizada, a que chamamos Estado – mas sim a de promover todas as condições necessárias à segurança e ao desenvolvimento económico, social e humano.

Numa palavra: o seu – e dos povos circundantes – direito à paz.

2.É, pois, um dia de luto para Israel – num momento em que Israel demonstra ao mundo toda a sua vitalidade.

No Monte Herzl, o Presidente Reuven Rivlin – em discurso emocionado, comovente, inspirado e inspirador, que vale a pena ouvir na íntegra – expressou o sentimento nacional: toda a nação israelita adorava a Primeira-Dama, Nechama Rivlin.

Adorava a personalidade ; adorava as causas que personificou enquanto titular do cargo político-simbólico que conjunturalmente exercia.

2.1. Adorava a personalidade – o Haaretz (jornal israelita que se situa na esquerda, com laivos de extrema-esquerda cada vez mais acentuados) escreveu mesmo que a política precisa de mais pessoas reais, genuínas, que compreendam a missão de serviço público inerente ao exercício de cargos políticos.

Uma pessoa próxima, sem, contudo, perder a exacta noção da gravitas própria do cargo, que é, ao fim e ao resto, a de representação institucional da autoridade do Estado.

Uma pessoa que, estando envolvida em e na Política, não se deixa enredar pela política – antes, cultiva os seus gostos e vocações de toda uma vida.

Que continua cultivando a arte, que tanto preza; que não perde uma oportunidade para demonstrar a sua admiração ilimitada pelas mulheres e homens das letras, essa manifestação mais conspícua do génio humano; pelo teatro e pelo cinema, que são, no fundo, mecanismos de personificação das palavras, de tornar reais as palavras escritas e a Humanidade idealizada.

A Política tem esse lado em comum com as artes performativas: também a Política é, afinal de contas, a arte (o engenho e o génio) de converter em realidade – palavras, ideias, pensamentos e mundos outrora apenas abstractamente concebidos.

 Tal como a Resolução 181 da ONU, de 1948, deu concretização, tornou real o sonho de tantos judeus ao longo da História, converteu a filosofia (julgada) utópica de Herzl em geografia política e geopolítica. A Primeira-Dama Nechama Rivlin honrou Israel ao longo da sua vida; Israel honrará a memória de Nechama Rivlin nos anos vindouros.

2.2. Adorava, ainda, as causas por que se bateu Nechama Rivlin.

Desde as questões ambientais, de defesa do equilíbrio ecológico (hoje tão na moda), à luta pela afirmação dos direitos das mulheres e a reivindicação permanente do carácter inclusivo do Estado de Israel – sendo o Estado do povo judeu, acolhe e integra todos aqueles que queiram partilhar os valores, as instituições e os símbolos do Estado.

A promoção dos direitos das minorias – sobretudo da minoria árabe – foi uma causa central à intervenção pública da Primeira-Dama.

Curiosamente, o próprio Presidente Rivlin tem dedicado especial atenção ao equilíbrio entre a garantia da preservação de Israel como Estado do povo judeu e a dignificação de todos quantos ali vivam.

3.Por último, há que assinalar que, por entre tantas e tão justificadas razões para nos inquietarmos quanto ao futuro do mundo, surgem, em determinados momentos, gestos expressivos que reanimam a esperança.

Neste momento de luto do Presidente Reuven Rivlin e de toda a nação israelita, as mensagens de condolências e de solidariedade na dor da perda chegaram de sítios inesperados como do Presidente Erdogan da Turquia, do próprio Presidente Mahmoud Abbas (da Autoridade Palestiniana, talvez em agradecimento pelo gesto de solidariedade humana revelada pelo Presidente Rivlin e pelo Primeiro-Ministro Netanyahu, que viabilizaram a prestação de serviços médicos por profissionais israelitas, a pedido do próprio Presidente Abbas, que, parece, tem uma saúde muito frágil…), do Presidente Vladimir Putin, do Presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeir e mesmo de Trudeau, Primeiro-Ministro do Canadá – para além da graciosa e sincera mensagem do Presidente dos EUA e um dos melhores amigos de Israel que a História já conheceu, Presidente Donald J. Trump.

4.E Portugal? Pelo que apurámos, o Embaixador de Portugal em Israel, João Bernardo Weinstein (por enquanto, ainda em Telavive, mantendo-se a bizarria de a nossa representação diplomática não se encontrar na capital do país, que é, como todos sabemos, Jerusalém)  enviou uma mensagem para o gabinete do Presidente Rivlin – contudo, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa não o terá feito.

Espera-se, pois, que o nosso Presidente da República corrija esta falha muito em breve – e envie mensagem de condolências ao Presidente de um país que é nosso amigo e cada vez mais aliado (dando conhecimento aos portugueses, através do sítio oficial da Presidência da República, como tem sido a prática do Presidente Marcelo).

Marcelo Rebelo de Sousa não pode ignorar, nesta ocasião, as melhores práticas dos Estados europeus – e ignorar o falecimento de uma personalidade ímpar que foi a Primeira-Dama Nechama Rivlin. Aguardemos pela sua mensagem – Portugal não pode ficar indiferente ao luto de um dos nossos queridos e estimados amigos, numa fase histórica em que Israel renova a esperança e mostra ao mundo a sua vitalidade como sociedade e como uma verdadeira democracia.

joaolemosesteves@gmail.com