Vítimas dos incêndios de Pedrógão Grande vão ter um memorial

Protocolo entre a Associação de Vítimas presidida por Nádia Piazza e a Infraestruturas de Portugal foi assinado hoje.

A passagem dos dois anos dos incêndios de junho de 2017 foi assinalada hojeem Castanheira de Pera com a cerimónia de assinatura de um protocolo da Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande (AVIPG) com a Infraestruturas de Portugal para a construção de um memorial às vítimas dos incêndios de Pedrógão Grande. Na cerimónia, que contou com a presença de António Costa na plateia, esteve também presente a presidente da AVIPG, Nádia Piazza, que assinou o protocolo e defendeu: “Hoje é o dia que assinalamos um verdadeiro holocausto em Portugal pela destruição de vidas e bens”.

Segundo a responsável, cujo filho foi uma das vítimas dos incêndios, “todos precisam de seguir em frente, mas não se segue em frente sem antes enfrentar o passado”. A presidente da associação de vítimas mostrou-se preocupada com o que, dois anos depois, “foi feito e falta fazer”. Mas, ainda assim, admitiu estar esperançosa “de que este dia nunca será esquecido para que não volte a acontecer”. Porque em 2017, repetiu, “vivemos um holocausto”.

O memorial, que será construído em data para já por definir, é assinado pelo arquiteto Eduardo Souto Moura e “não será uma pedra tumular, mas um espaço de lembrança coletiva e a página que falta virar, e, para muitos, um local de reflexão”, descreveu Nádia Piazza.

Para tal, o memorial irá ter uma balsa de água alimentada por uma fonte. “O memorial será isso mesmo: mergulhar sem afogar, e embrenhar-se num estado de profunda reflexão e respeito, que faz lembrar que [as vítimas] eram pessoas amadas”, tendo como objetivo “aliviar os traumas dos que por lá passam e tornar-se num local de convívio sentido da comunidade e de todos aqueles que também não se querem esquecer e lá depositem o seu respeito”, afirmou a presidente da AVIPG, que desejou ainda que o memorial venha a servir “de cura até que um dia reste apenas a saudade purificada pelas suas águas, lavada de ódio, da revolta, da indignação e do sofrimento”.

Souto Moura, por sua vez, descreveu que fez um “desenho simples” sem ser “pretensioso” e explicou a simbologia: “A água como purificação é um elemento transversal em todas as culturas e religiões”. Quanto à balsa de água, tem a “dupla função de evocar o renascimento, que pensamos que vai acontecer e, se houver outro incêndio, os bombeiros têm onde ir buscar água”, concluiu.

“Não têm sentido de solidariedade e responsabilidade”

Quem não poupou nas palavras no segundo aniversário da tragédia que tirou a vida a 66 pessoas foi Valdemar Alves, o presidente da Câmara Municipal de Pedrógão Grande. Numa missa celebrada em Castanheira de Pera em memória das vítimas, o autarca – que é um dos 43 arguidos no inquérito às irregularidades nos donativos destinados à reconstrução das casas destruídas pelo fogo – criticou, sem nomear ninguém, que haja quem “tente desviar as coisas para outros interesses” para “criar desunião”. “Está-lhes na massa do sangue, não têm sentido de solidariedade e responsabilidade”, apontou aos jornalistas.

Para aqueles que perderam não só a casa, mas familiares e amigos, Valdemar Alves lamenta que reste apenas “esperança e coragem”. Na região, continuou, “ainda se vive um pesadelo”, agravado pelas “burocracias”. “A ideia que quem governava o país, desde o Presidente da República ao primeiro-ministro, nos deu [logo após os incêndios] é que tudo se poderia fazer e, afinal, nem tudo se pôde fazer e muita coisa ficou por fazer”.