Tenho-o escrito várias vezes: Rui Rio é um homem estimável. E vou mais longe: seria melhor primeiro-ministro do que é líder partidário.
Mas não conseguiu desfazer vários equívocos a respeito da sua pessoa – e isso está a ser-lhe fatal.
Um foi ser visto sempre como um líder regional e não como um líder nacional; o outro foi ser encarado mais como um futuro aliado de António Costa do que como uma alternativa a António Costa.
Ora, os militantes do PSD queriam evidentemente uma alternativa ao atual primeiro-ministro e não uma sua futura muleta.
Além disso, Rui Rio nunca atinou com o posicionamento político certo.
O PSD, por mais que digam, tem de ser um partido liberal, não pode ser social-democrata.
Para social-democrata existe o PS.
Em entrevista ao SOL, publicada na semana passada, Freitas do Amaral dizia que a direita não devia ocupar-se da economia e das finanças mas sim do mau funcionamento de alguns serviços públicos, da saúde, da segurança social.
Ora, para cuidar dos serviços públicos está lá a esquerda.
O papel do líder do PSD é outro.
É falar para a classe média.
É ela que o sustenta e lhe dá os votos.
Ora, o que preocupa mais a classe média não são os hospitais nem os transportes.
75% das pessoas da classe média não usam os transportes públicos nem frequentam os hospitais do Estado: movimentam-se em viatura própria e têm sistemas alternativos de saúde – seja a ADSE, sejam seguros pessoais ou de empresa.
O que preocupa hoje a classe média são sobretudo os impostos.
Os impostos é que mexem brutalmente com os ordenados das pessoas e com a viabilidade das empresas, designadamente das pequenas e médias empresas, muitas das quais vivem com a corda na garganta, sufocadas pelo fisco.
Nesse sentido, a promessa de Rui Rio de uma descida dos impostos foi certeira.
E dita por ele, essa promessa tem credibilidade: já porque Rio é economista e sabe do que fala, já porque construiu a imagem de um homem sério que não faz promessas à toa.
Se Rio promete uma baixa dos impostos, fá-la-ia se fosse primeiro-ministro.
E uma baixa de impostos seria também importante para a recuperação da economia.
Ao contrário da ideia que se criou – e o PS é mestre em criar ilusões –, a situação económica de Portugal não é nada famosa.
A balança comercial está cada vez mais deficitária, o que significa o aumento da dívida externa.
E o crescimento do PIB não é brilhante.
A tendência negativa foi invertida ainda no tempo de Passos Coelho, chegando a 1,5%, continuou a subir com António Costa, mas logo a seguir começou a perder velocidade – e desde há três anos vem a cair.
Este ano ficará em 1,7%, um resultado muito próximo do atingido por Passos, num período em que a conjuntura é mais favorável e as coisas deveriam correr bastante melhor.
Também por isso, um choque fiscal seria muito benéfico.
Mas Rio tem azar.
Ainda os efeitos positivos do anúncio desse choque não tinham começado a fazer-se sentir e já era noticiada a demissão de um vice-presidente do PSD, Castro Almeida.
Assim não é possível.
Por muito bem que as coisas corram daqui para a frente, Rio já tem o destino traçado.
A derrota eleitoral é inevitável – só não se sabe por quantos – e, perdendo as eleições, perderá a liderança do partido.
A questão que se coloca hoje ao PSD é, portanto, saber quem será o sucessor de Rui Rio.
Quem está na calha é Montenegro, mas não o vejo como um líder de futuro.
Falta-lhe alguma consistência e parece mais um tático do que um estratega.
Parece mais um corredor de 1.500 metros do que um maratonista.
A pessoa no PSD que julgo mais talhada para a liderança – e para a chefia do Governo – é Maria Luís Albuquerque.
Além de ser uma mulher afirmativa e de personalidade forte, tem várias coisas a seu favor: experiência política, formação económica… e a condição feminina (numa época em que as mulheres se afirmam na política por toda a parte).
Tem contra ela o facto de ter ficado muito ligada à política de austeridade.
Mas quanto mais tempo passar mais esse estigma se diluirá.
Porquê?
Porque cada vez se tornará mais claro que o Governo socialista seguiu a mesma política, embora por outros meios, o que significa que não havia como fugir à austeridade.
Digo mesmo mais: dentro de algum tempo, a presença de Maria Luís Albuquerque nesse Governo não será um estigma mas uma mais-valia – por ser a ministra das Finanças no tempo em que Portugal saiu do pesadelo do resgate da troika, conseguindo uma saída limpa.
Veremos se tenho razão.
Neste vaticínio, só me assalta uma dúvida: não sei se Maria Luís Albuquerque estará interessada em ser líder do PSD e primeira-ministra.
E, mesmo que esteja, se acha que é já este o seu tempo.
Depois das próximas eleições, António Costa ficará pelo menos mais dois anos no poder (foi o tempo que estiveram Guterres e Sócrates após a reeleição) – e Maria Luís Albuquerque pode achar que ainda é cedo para avançar.
Pode achar que é preferível deixar avançar uma ‘lebre’ – e, para ‘lebre’, Montenegro seria uma boa opção…
Mas entre este e a ex-ministra das Finanças estará o futuro líder do PSD.
P.S. – A atitude do diretor do Público perante um artigo de opiniã+o de Fátima Bonifácio publicado nas páginas daquele jornal foi muito infeliz. Não se trata de concordar ou discordar do artigo – trata-se, tão-só, de achar que ele devia ser publicado ou censurado. O diretor do jornal disse que, se voltasse atrás, não o publicaria. Fazia mal. Os jornais são espaços de debate por excelência. A censura só agiganta os problemas que procura esconder.