Montepio. Trabalhadores fazem raio x ao banco

Comissão de Trabalhadores fez um inquérito interno para avaliar o clima organizacional do banco. Liderança é um dos temas escurtinados, assim como a ligação à Associação Mutualista. Conclusões irão ser conhecidas quase na véspera de apresentação de resultados. 

Os trabalhadores do Banco Montepio vão avaliar o clima organizacional da instituição financeira. Para isso, foi levado a cabo um inquérito interno, que terminou nesta sexta-feira. A iniciativa partiu da Comissão de Trabalhadores e, ao que o SOL apurou, esta era uma prática habitual das administrações anteriores. 

O SOL sabe que a iniciativa mobilizou a maioria dos trabalhadores, ao contrário do que acontecia em inquéritos do passado, e que os resultados serão conhecidos dentro de duas semanas. As conclusões serão depois debatidas com o conselho de administração.

Contactada pelo SOL, fonte oficial da instituição financeira garantiu que também irá realizar um outro inquérito para avaliar a satisfação dos colaboradores e o seu conhecimento em relação ao programa estratégico e de transformação que está a ser levado a cabo pelo Banco Montepio. «O inquérito de clima organizacional é, para o Banco Montepio, uma peça fundamental para apurar o nível de satisfação, motivação e envolvimento dos colaboradores, ajudando a instituição a ir ao encontro das suas expectativas e a fazer uma adequada gestão dos recursos humanos. O inquérito está previsto no plano de atividades desde o início do ano e realizar-se-á no último trimestre», garantiu o banco, acrescentando ainda que se «congratula também com a iniciativa da Comissão de Trabalhadores, no sentido de fazer, com espírito plural e construtivo, o diagnóstico do Clima Organizacional».

No questionário, a que o SOL teve acesso e enviado aos cerca de 3.500 trabalhadores na segunda semana de julho, são colocadas várias questões, nomeadamente sobre a liderança do banco. Aos colaboradores é questionado se «o modelo de governo do Banco Montepio permite uma clara definição da estratégia», assim como se «a missão, visão e valores do Banco Montepio são transmitidos de forma clara para toda a estrutura», ou, até mesmo, «se o conselho de administração garante a estabilidade e a visão de futuro para o Banco Montepio».

Mas as perguntas não ficam por aqui. São também abordadas questões relacionadas com a satisfação no trabalho, motivação, comunicação, trabalho em equipa, formação, avaliação de desempenho e oportunidades e avaliação global. Neste último, são feitas perguntas como: «tendo uma oportunidade no mercado de trabalho, prefiro sair porque o Banco Montepio não me oferece condições para permanecer», «havendo uma oportunidade de trabalho no Banco Montepio, recomendo essa oportunidade a um amigo» ou «se um colega tiver uma oportunidade de trabalho no mercado, procuro convencê-lo a ficar no Banco Montepio».

Também a ligação à Associação Mutualista não fica esquecida. O documento a que o SOL teve acesso questiona: «O facto de o Banco Montepio pertencer a uma Associação Mutualista é motivador?»; «O principal acionista do Banco Montepio tem definidos, de forma clara, os objetivos que pretende alcançar através do Banco Montepio?» e «O facto de o Banco Montepio pertencer a uma Associação Mutualista é uma mais-valia?». 

Esta iniciativa surge numa altura em que continua a existir um impasse em torno da confirmação de Dulce Mota como CEO do Banco Montepio. 

Recorde-se que a atual CEO foi apresentada como solução interna e temporária para resolver o problema de acumulação de cargos na instituição financeira, uma vez que o ex-presidente da CMVM passou para chairman do banco. Carlos Tavares desde o início do seu mandato e durante vários meses chegou a acumular a função de CEO e de chairman. Uma medida temporária que surgiu depois de o Banco de Portugal ter recusado o nome de Nuno Mota Pinto para o lugar de CEO – apesar de ter sido administrador do Banco Mundial, o regulador justificou a recusa com a falta de experiência na administração de bancos de retalho – mantendo-o no entanto, na lista de órgãos sociais, onde desempenha a função de administrador executivo.

Os resultados do inquérito irão ser conhecidos numa altura em que o banco se prepara para apresentar os resultados referentes ao segundo semestre. Ao que o SOL apurou, os lucros deverão manter-se na mesma linha dos resultados do primeiro trimestre. O Banco Montepio apresentou lucros de 6,5 milhões nos três primeiros meses do ano e está previsto que não deverão crescer no fecho do semestre.

Em marcha está o Banco de Empresas Montepio (BEM), que atualmente está em gestão corrente, com Carlos Tavares a desempenhar a função de presidente, contando também alguns administradores do Banco Montepio.

O banco de empresas contará com 10 administradores – sete não executivos, incluindo o presidente, e três executivos. Tal como o SOL avançou em fevereiro, Joana Carvalho foi escolhida para a administração, mas até à data o seu nome ainda não foi registado no Banco de Portugal. Uma situação que tem causado alguma tensão, porque até aqui não foi feito qualquer convite interno.

Lançado no dia 3 de maio, o BEM tem como objetivo ficar com as mais importantes empresas clientes do banco, o que também está a criar mal estar interno, uma vez que esvaziará a carteira de clientes do Montepio. Na altura do seu lançamento, o projeto foi apresentado com a ideia de que iria «ajudar a resolver problemas há muito identificados no nosso tecido empresarial, como os constrangimentos à capitalização e ao acesso a fontes de financiamento alternativas por parte das empresas». O objetivo seria «suprir falhas do mercado» e responder às necessidades de crescimento do tecido empresarial português, num universo potencial de mais de cinco mil empresas.

O SOL sabe que a ambição de Carlos Tavares é abrir o capital do BEM a investidores externos. Atualmente, o capital do banco de empresas é de 180 milhões de euros, mas poderá vir a ter de reforçar capital e a Associação Mutualista poderá não ter capacidade de injetar dinheiro. 

Aliás, essa hipótese de abrir capital a outros investidores chegou a ser referida por Carlos Tavares num encontro de quadros realizado em novembro, em Ílhavo.

Ermida volta a ser afastado

João Ermida, que chegou a ser apontado por Carlos Tavares como chairman da instituição financeira – um nome que foi chumbado pelo regulador por não ter experiência recente na atividade bancária -, voltou a ser apontado pelo ex-presidente da CMVM para assumir o cargo de administração não executivo. 

O SOL sabe que Tomás Correia recebeu um pedido de Carlos Tavares para que Ermida assumisse esse cargo. 

No entanto, a entidade liderada por Tomás Correia não deu o aval, deixando passar o prazo de resposta, que terminou no passado dia 16 de julho.

Tal como SOL já tinha avançado, Carlos Tavares e João Ermida conheceram-se no Santander Totta, quando Ermida era chefe de tesouraria, cargo que ocupou até 2003, e Tavares era administrador da instituição financeira. Ermida era um dos rostos da Sartorial, grupo financeiro dedicado à gestão de ativos e ao aconselhamento global de investimentos. Em 2011, chegou a acordo com António Godinho – um dos principais opositores de Tomás Correia -, administrador da One Biz, para a aquisição da Exchange (marca de franchising de lojas de intermediação financeira de créditos), a Accive (corretora de seguros) e a NBB (empresa de consultoria de compra e venda de PME). Com este negócio – avaliado, na altura, em 2,8 milhões de euros -, Godinho entra na administração executiva da Sartorial. 

Outros nomes de Tavares

O grupo perdeu cerca de quatro milhões em termos de capitais próprios em menos de quatro anos.

Face a estes resultados, a Sartorial deixou de reportar contas ao Banco de Portugal desde o terceiro trimestre de 2013. Isto porque o capital mínimo requerido pelo regulador para uma sociedade de corretagem ter licença para operar no mercado nacional é de 3,5 milhões de euros. 

As campainhas voltaram a soar a 7 de setembro de 2015, quando o Banco de Portugal retirou a autorização para o exercício da atividade à Sartorial.

Esta não é a primeira vez que Tavares tenta levar para o banco pessoas da sua confiança. 

Em novembro, nomeou Leandro Silva – ex-chefe de gabinete quando era ministro da Economia no Governo de Durão Barroso – para administrador executivo. 

Também Carlos Alves, número dois do conselho diretivo da CMVM quando Tavares liderava o regulador, assumiu funções de administrador não executivo do banco.