Altice não cede na guerra dos cabos

Operadora avança com queixas crime contra Infraestruturas de Portugal. Em causa está o furto de tampas de condutas da Altice. Operadora impedida de ter acesso às suas condutas, nomeadamente para repor comunicações em hospitais.

A Altice apresentou quatro queixas crime contra a Infraestruturas de Portugal (IP) por furto de tampas que pertencem à operadora e respectiva substituição por outras tampas com símbolos da IP. Ao que o SOL apurou, estas queixas originaram já outros tantos processos de investigação criminal.

A troca de tampas está a prejudicar o acesso às condutas e possíveis manutenções que sejam necessárias. Estas situações ocorrem nomeadamente em hospitais, centros de saúde, quartéis da GNR e esquadras da polícia. 

Em relação a valores, o SOL sabe que, como se trata de um processo crime relacionado com uma infraestrutura de telecomunicações, as entidades de investigação criminal não necessitam do valor dos danos para a qualificação do crime. No entanto, caberá à empresa de telecomunicações peticionar a devida indemnização após eventual acusação por parte do Ministério Público contra o responsável pelo ilícito – como se tratam de tampas antigas (CTT e PT), o valor unitário não deverá ser elevado.

A Altice tem também em marcha outro processo crime contra a IP e IPTelecom (IPT), por acesso ilegítimo às suas condutas de forma ilegítima por parte da IPT, apurou o SOL. 

Este rol de queixas e processos somam-se à decisão revelada esta semana pela empresa liderada por Alexandre Fonseca de denunciar o contrato com a IPTelecom, celebrado a 7 de dezembro de 2017, que tinha como objetivo enterrar cerca de 1.000 quilómetros de cabos até ao final do ano para evitar danos nas ligações em fenómenos como incêndios. 

Os concelhos que seriam alvo desta medida foram identificados pelo Governo como sendo de elevada perigosidade.

Na base da denúncia do contrato está o facto de a operadora só ter avançado com cerca de 100 quilómetros de cabos enterrados, os quais não estão em funcionamento. Segundo a operadora, não foi possível «estabelecer as ligações da sua própria rede aos Canais Técnicos Rodoviários (CTR´s), por obstáculos colocados pela IPTelecom e pela Infraestruturas de Portugal», acrescentando que «há mais de um ano e meio que tem aguardado pela reunião de todas as condições necessárias para a efetiva concretização do referido contrato, as quais não só não foram viabilizadas, como, ainda, foi a todo o tempo obstaculizada pela Infraestruturas de Portugal e pela IPT no processo de enterramento de cabos».

Ao que o SOL apurou, um dos argumentos usados pela operadora é não estarem reunidas as condições de confiança e de boa-fé para manter este contrato. 

Uma decisão que surpreendeu tanto o Governo como a IP. «No passado dia 8 de agosto, no seguimento de uma de várias reuniões que vinham ocorrendo entre Governo, Altice e IP sobre este assunto, foi possível chegar a um acordo entre as partes, tendo sido ultrapassadas as divergências que subsistiam até essa data, relativas a custos e condições de implementação dos termos do protocolo. Nada fazia por isso prever que a Altice tomasse esta decisão», esclareceu o Executivo, admitindo que «espera que ainda seja possível que a Altice assine o acordo que fechou no dia 8 e que lhe foi remetido para assinatura».

Também a Infraestruturas de Portugal garantiu que «sempre mostrou disponibilidade para aceder às exigências colocadas pela Altice para a execução dos trabalhos a que esta se comprometeu no âmbito do Contrato de Acesso e Utilização de Canal Técnico Rodoviário (CTR)» e, como tal, garante que «não compreende a posição assumida pela Altice nem reconhece fundamento para uma eventual denúncia do contrato».

As reações caíram mal na operadora liderada por Alexandre Fonseca, que frisa que «se houve alguma instituição a desrespeitar reiteradamente as orientações do próprio Governo durante um ano e meio foi a IPTelecom, podendo este facto ser atestado pelo ministro e secretários de Estado que durante este período estiveram em funções».

As críticas da operadora não ficam por aqui – e garante que «sobre esta situação a Altice Portugal manteve o Governo Português a par, tendo todas as mensagens e orientações dadas pelo Governo à IP e IPT sido completamente ignoradas por estas entidades, colocando em causa o interesse público nacional». E chamou ainda a atenção que durante este período solicitou por seis vezes audiências com o Governo, tendo em vista denunciar a atuação e inação da IP e IPT. «Duas dessas audiências contaram com a presença do então Secretário de Estado das Infraestruturas, Guilherme d’Oliveira Martins, duas outras com o então Ministro do Planeamento, Pedro Marques, uma com o atual Secretário de Estado das Comunicações, Alberto Souto de Miranda, e a última, a 5 de agosto, com o Secretário de Estado das Infraestruturas, Jorge Delgado». E argumenta que este tema «não passou ao lado de debates parlamentares mediatizados, nos quais o Governo foi várias vezes questionado sobre o contrato que tinha sido celebrado com a Altice Portugal».

A Altice lembra também que a ideia de enterrar cabos «correspondeu a um desígnio político criado pelo Governo português de proceder ao enterramento de traçados aéreos nas zonas de elevada perigosidade de incêndios florestais, e não uma qualquer motivação de negócio da Altice Portugal para quem, aliás, o enterramento de traçados aéreos constitui um investimento na duplicação de 2/3 de partes da sua rede». E que a operadora foi quem aceitou avançar com esta medida, «tendo disponibilizado no seu plano de investimentos a verba necessária para o cumprimento de tal objetivo do governo português, ou seja, milhares de euros ficaram parados e milhares de euros foram perdidos, em recursos operacionais, humanos e equipamentos parados mas alocados».

Recorde-se que o Governo decidiu, através de uma Resolução do Conselho de Ministros, depois dos incêndios de 2017, converter o traçado aéreo dos cabos de telecomunicações em traçado subterrâneo.