Brexit. Todos contra Johnson

Nas ruas estão a ser organizadas ações de desobediência civil. Parlamentares avançaram com providências cautelares.

Uma série de ações legais foram apresentadas nos tribunais britânicos para impedir que Boris Johnson, primeiro-ministro britânico, suspenda o Parlamento de 10 de setembro a 14 de outubro: o maior cessar da atividade parlamentar da história recente que poderá privar o Parlamento de ter um papel na decisão mais importante do país nas últimas décadas, o Brexit. Na casa da democracia do Reino Unido, os partidos da oposição vão tentar evitar a suspensão através de medidas legislativas que forcem Johnson a recuar. Fora das salas do poder, espera-se que as ruas britânicas encham-se de protestos contra o chefe de Governo britânico. 

O tribunal da Escócia rejeitou, esta sexta-feira, a providência cautelar pedida por 75 parlamentares que visam bloquear a suspensão com o argumento que a ordem do primeiro-ministro constitui um «abuso de poder». O caso foi rejeitado pelo juiz por considerar que existem argumentos fortes dos dois lados. Mas a decisão não é final: na terça-feira há nova audiência. Não é só na Escócia que há processos legais em curso. Também na Inglaterra e na Irlanda do Norte haverá duas audiências para a próxima semana, uma em cada país. Em último caso, as ações poderão ir para o Supremo Tribunal como recurso final.

Uma situação caricata: até o último primeiro-ministro britânico a suspender o Parlamento, John Major, em 1997, vai-se juntar na ação legal em Inglaterra, com outros parlamentares, para bloquear o processo desencadeado por Johnson.

Já o líder da maior força de oposição, o trabalhista Jeremy Corbyn, anunciou que ia «agir politicamente», tentando bloquear a suspensão através de uma medida legislativa – e não põe de lado uma moção de censura. Corbyn tem tomado a dianteira para impedir um hard Brexit. Juntou-se com as outras forças da oposição para delinear uma estratégia de unidade contra a saída não acordada da União Europeia, na passada terça-feira, um dia antes do anúncio de Johnson. 

Embora o primeiro-ministro nunca tenha posto de lado a suspensão da casa democracia britânica para levar avante o Brexit «com ou sem acordo» durante a campanha para a liderança do Partido Conservador, a decisão não deixou de causar alguma surpresa – até no seu próprio partido. 

Todavia, a oposição parece querer continuar a trabalhar em bloco contra Johnson. «Na nossa opinião há uma maioria na Câmara dos Comuns que não apoia esta prorrogação e, como tal, exigimos que o primeiro-ministro reverta imediatamente esta decisão ou que permita que os parlamentares votem se deve haver uma», lê-se no comunicado conjunto dos seis partidos da oposição, incluindo os trabalhistas e os Liberais Democratas. 

Em entrevista na sexta-feira à BBC News, o primeiro-ministro respondeu aos seus opositores. «O que é estranho é que, quanto mais tentarem prevenir um Brexit sem acordo, maior é a probabilidade de acabarmos nessa situação», salientou Johnson, garantido que o Parlamento irá ter tempo para discutir o Brexit e que a saída é para se concretizar: «Eles [Parlamento] estiveram três anos a discutir o Brexit, sem realmente ultrapassar os limites. Terão muito tempo para uma análise aprofundada». 

Nas ruas, estão a ser organizadas ações de desobediência civil contra o primeiro-ministro. Laura Parker, coordenadora do Momentum, movimento que apoia Corbyn, avisou Johnson: «Se roubas a nossa democracia, nós fechamos as ruas». Além dos protestos ocorridos na quinta e sexta-feira por todo o país, estão marcadas manifestações no sábado pelo país inteiro – sob o lema Stop the Coup, defend democracy

Também em Dublin alastraram-se protestos contra o Brexit, não fosse a República da Irlanda, o outro país mais afetado por uma saída não acordada. O ministro do Estado irlandês, Michael D’Arcy, escreveu no Twitter que a decisão de suspender o Parlamento era a mais «antidemocrática» desde os tempos de Oliver Cromwell, líder político-militar inglês do século XVII, que foi particularmente brutal na Irlanda – um tweet que foi posteriormente apagado pelo ministro. 

Outro membro do Governo irlandês a reagir foi o ministro dos Negócios Estrangeiros, Simon Coveney, ao acusar Johnson de não ter um plano para uma alternativa à salvaguarda na fronteira irlandesa: «De momento, não veio nada credível por parte do Governo britânico».