Montepio. Tribunal anula multa de 4,9 milhões mas BdP promete recorrer

Em causa está o facto de o regulador ter detetado falhas de gestão, enquanto Tomás Correia era presidente do banco.

O Banco de Portugal (BdP) afirmou ontem que vai recorrer da decisão do Tribunal da Concorrência que anula as coimas ao Montepio e a oito antigos administradores no valor de 4,9 milhões de euros, considerando que a sentença não se pronuncia sobre as infrações. Em causa está o facto de o regulador ter detetado falhas de gestão, enquanto Tomás Correia exercia o cargo do presidente do agora denominado Banco Montepio, entre 2008 e 2015. Além das falhas no controlo interno, o regulador aponta também o não respeito pelas normativas definidas nos regulamentos, que justificaram a concessão de crédito de financiamentos de elevado montante a alguns clientes, nomeadamente a Paulo Guilherme e a José Guilherme. Este processo começou em 2014, com a auditoria forense à Caixa Económica Montepio Geral.

No entanto, a entidade liderada por Carlos Costa garantiu que “discorda do entendimento subjacente à decisão agora proferida pelo Tribunal da Concorrência Regulação e Supervisão, que diverge, aliás, do teor de muitas outras que, ainda recentemente e sobre a mesma questão de direito, têm sido proferidas por tribunais superiores. Deste modo, o Banco de Portugal irá apresentar recurso das mesmas”, referiu em comunicado.

Um entendimento diferente tem o Tribunal da Concorrência ao considerar que foi violado o direito à defesa na fase administrativa, determinando a anulação da acusação e das notificações emitidas e a devolução do processo ao BdP, para que este profira “nova decisão isenta dos vícios que decretaram a nulidade”. Em causa está o facto de os elementos de prova terem sido apresentados em 303 anexos, não identificando o BdP a acusação “facto a facto”, o que levou o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS) a concluir que os arguidos deveriam ter tido acesso a um processo “pelo menos organizado”, para identificarem os elementos probatórios e exercerem cabalmente a sua defesa.

No entanto, de acordo com o regulador, a anulação deve-se a uma questão de natureza processual, “relacionada com a suficiência do modo como, durante a fase administrativa do processo, foi assegurado aos arguidos o exercício do direito de defesa”, acrescentando que o tribunal “não se pronunciou sobre a substância das infrações pelas quais o Banco de Portugal havia condenado os arguidos”, pelo que não houve “qualquer juízo a esse respeito, designadamente no sentido de absolver os arguidos das infrações que lhe foram imputadas”.

Tomás Correia fala em monstruosidade

Para o presidente da Associação Mutualista, a a “monstruosidade” do processo em que foi condenado pelo Banco de Portugal ao pagamento de 1,25 milhões de euros “começou a ser demonstrada”. O SOL já tinha avançado, em agosto, que no recurso entregue ao Tribunal da Concorrência, o presidente da Mutualista apontava para “uma série de erros de análise e de associação de factos que não fazem sentido”, daí estar a impugnar a aplicação da coima. 

O responsável revelou também que estava “satisfeito” com a decisão, afirmando ainda que já estava à espera que fosse reconhecida a violação do direito de defesa na fase administrativa do processo. “Já disse em algumas circunstâncias que aquela fase em que o processo decorreu no Banco de Portugal se deveu apenas a uma fase que classifiquei, e continuo a classificar, como a fase do arbítrio. Felizmente, e como é próprio de uma sociedade civilizada, como é a nossa, entrámos na fase da justiça e a justiça está a fazer-se e vai fazer-se, não tenho dúvida nenhuma”, declarou.

A opinião é partilhada pelos ex-administradores do banco que também tinha sido condenados pela entidade liderada por Carlos Costa. De acordo com os mesmos, na decisão hoje divulgada o tribunal informou que possibilitou ao Banco de Portugal corrigir os “vícios” de que padecia o processo, na parte referente ao direito de defesa dos ex-administradores, mas que o BdP optou por não o fazer.

Os advogados “não percebem como os seus constituintes puderam ser alvo de um processo e decisão, em que a entidade administrativa não observou uma decisão judicial, atuação que não se recordam de alguma vez ter visto, da parte deste regulador”, refere o comunicado.

Ao mesmo tempo, no mesmo comunicado, é reafirmada a inocência dos ex-administradores, reiterando que, segundo os advogados, “não praticaram nenhuma infração, enquanto foram administradores do Banco Montepio” e que, aliás, contribuíram mesmo “decisivamente” para que o Montepio seja “o único grande banco português que não precisou de pedir ajuda aos contribuintes portugueses”.