O abuso da propaganda política no espaço público

Os partidos têm de assumir a responsabilidade de imporem regras à sua própria atividade, respeitando o espaço público.

Durante as campanhas eleitorais as cidades são inundadas por cartazes ou painéis de grandes dimensões, pendões e até por pinturas em paredes em toda a parte. Sem qualquer cuidado e sem qualquer limitação, os suportes de propaganda partidária invadem o espaço público, gerando um impacto paisagístico e provocando uma poluição visual que prejudica a fruição das cidades.

A eficácia destes meios para a comunicação política é muito discutível. o excesso de propaganda nas ruas provoca um ruído visual tão elevado que os cidadãos acabam por não prestar atenção às ditas mensagens cuja profusão é mais ditada pela competição na quantidade entre os partidos do que na eficácia da comunicação.

A lei que regula a afixação e inscrição de propaganda data de 1988 (Lei nº 97/88, de 17 de agosto). Passados mais de 30 anos muito se alterou, quer do ponto de vista dos meios de propaganda possíveis (e utilizados), quer do ponto de vista da exigência das pessoas relativamente à atenção ao espaço público.

Apesar de a lei enunciar algumas restrições, na prática, por omissão das câmaras municipais e, sobretudo, através de uma interpretação muitíssimo permissiva da Comissão Nacional de Eleições (CNE), os partidos gozam de absoluta impunidade na ocupação do espaço público com suportes de propaganda ou, até, na pintura de paredes.

As restrições inscritas na lei referem cuidados a observar pela propaganda, nomeadamente para não provocar a obstrução de perspetivas panorâmicas ou afetar a estética ou o ambiente da paisagem, não prejudicar a beleza ou o enquadramento de monumentos nacionais ou de interesse público, não prejudicar a circulação dos peões, não realizar inscrições ou pinturas em monumentos nacionais, entre outras indicações.

Estas restrições deveriam aplicar-se e deveria caber aos municípios a fiscalização do seu cumprimento. Caso assim fosse, e se os partidos tivessem estas indicações em atenção, muitos dos abusos que se observam poderiam ser evitados. No entanto, na prática, todas as restrições são ignoradas e as tentativas de alguns municípios que procuram impor o respeito pelas referidas restrições são recusadas pela CNE que, sistematicamente, intervém contrariando qualquer ação disciplinadora, ainda que fundamentadas nas restrições previstas na lei.

Na prática, a lei em vigor sobre regulação de colocação de propaganda no espaço público permite todo o tipo de abusos, seja na obstrução de panorâmicas, seja no prejuízo para a estética da paisagem urbana e de monumentos. O exemplo mais ilustrativo desta situação é o estado em que se encontra atualmente a praça do Marquês de Pombal, em Lisboa. Mas outras praças, um pouco por todo o país, sofrem as mesmas agressões. Esta lei não salvaguarda a fruição do espaço público e por isso não serve.

Importa alterar a lei, garantindo a liberdade de difusão das mensagens políticas, mas modernizando conceitos, considerando a existência de outros meios de difusão de mensagens políticas, concedendo capacidade de fiscalização aos municípios (mesmo que em articulação com a CNE), de modo a que sejam eficazes as necessárias restrições que salvaguardam o espaço público.

A alteração da lei depende dos partidos na Assembleia da República. É fundamental que os partidos assumam a responsabilidade e o compromisso de imporem regras à sua própria atividade, respeitando o espaço público que é de todos.