Tancos é mesmo um caso sério

Fica-se com a sensação de que, se o caso de Tancos não se tivesse tornado público, ninguém assumia responsabilidades nem consequências 

«No limite, pode não ter havido furto nenhum…». Esta frase do então ministro da defesa Azeredo Lopes sobre o furto de Tancos ilustra a sua atitude perante o caso e, depois do que foi conhecido e especialmente depois da acusação do Ministério Público a Azeredo Lopes, revela que Tancos é mesmo um caso sério.

É grave o facto de ter sido furtado material de instalações militares. É grave que o caso, por conveniências políticas, pessoais e outras, tenha sido, primeiro escondido, depois mascarado e, finalmente, desvalorizado. É grave que este assunto esteja a ser omitido, mais uma vez por conveniência de alguns, em vez de ser assumido e de serem retiradas as consequências devidas.

A acusação do Ministério Público expõe o Parlamento ao vexame, contrariando algumas das conclusões do texto do relatório da Comissão de Inquérito sobre Tancos que os partidos da esquerda parlamentar impuseram mesmo ao arrepio das evidências recolhidas durante os trabalhos e denuncia a tentativa do poder político em mascarar o caso.

Perante estes factos, tentar defender que o caso é ‘só’ da justiça não é mais do que tentar fugir da assunção de responsabilidades e evitar o escrutínio e a avaliação política de uma questão que, como está demonstrado, é também política.

O período eleitoral é o momento mais adequado para efetuar o escrutínio político dos partidos, dos protagonistas e da sua ação. O caso de Tancos, tendo em atenção a matéria de que se trata, pela sua gravidade e pelo comportamento do poder político, é talvez dos assuntos que melhor permite avaliar a conduta dos envolvidos pela ação, omissão e responsabilidade e que deve conduzir a retirar conclusões e consequências.

O caso de Tancos revelou fragilidades em matéria de Defesa Nacional com falta de investimento, falta de recursos e falta de profissionalismo. Não é admissível que o material e equipamento das Forças Armadas estejam nas condições que permitiram o furto. O Estado deve encarar a Defesa Nacional como uma prioridade estratégica e com a importância de elemento estrutural para a soberania nacional. Por outro lado, exige-se a responsabilidade das Forças Armadas na correspondência à importância que lhes confere a sua missão.

Perante este acontecimento, cabia aos responsáveis – todos – agirem com a atenção e exigência que a gravidade do caso impunha. No entanto, o que se assistiu foi, num primeiro momento e perante o conhecimento, à tentativa de emendar a situação para que passasse despercebida, depois, perante as evidências, procuraram alijar responsabilidades e, por fim, todos (quantos puderam) evitaram a assumir consequências.

Fica-se com a sensação de que, se o caso de Tancos não se tivesse tornado público, ninguém assumia responsabilidades nem consequências e, no limite, o material militar não teria reaparecido e o crime teria compensado.
O escrutínio da ação do Estado é, por isso, fundamental. Esconder, evitar ou não assumir responsabilidades significa contribuir para a fragilidade do Estado.

Talvez ainda não se conheçam todas as responsabilidades e as cumplicidades que se foram gerando na gestão do caso de Tancos. Talvez alguns julguem que a revelação de tudo pode abalar o Regime. Mas o Regime fica seguramente mais frágil com a falta de confiança nas instituições e nos seus responsáveis.