Brexit: como vão reagir os mercados?

Com ou sem acordo, o Reino Unido e a Europa têm de se preparar para as mudanças comerciais e económicas que se adivinham. Analista explicou ao SOL como os mercados estão a reagir.

Brexit: como vão reagir os mercados?

E com um simples aperto de mão entre Boris Johnson e Jean-Claude Juncker, os mercados suspiraram de alívio. A saída do Reino Unido da União Europeia trará, por si só, grandes desafios para todos, mas só a possibilidade de existir um Brexit leve já dá alguma segurança. Mas a hipótese de uma saída brusca não está posta de lado – nesse cenário, os britânicos e restantes europeus têm de se preparar para uma série de restrições.

Esta tem sido uma maratona difícil, com um impacto «claramente negativo, tanto ao nível da economia como também politicamente» desde o início, refere Ricardo Evangelista. «De acordo com um estudo da S&P, publicado em abril de 2019, a economia do Reino Unido tem perdido cerca de 550 milhões de libras por semana, devido à incerteza gerada pelo Brexit. O impacto no PIB deverá ser na ordem dos 3%», explica ao SOL Ricardo Evangelista, analista sénior da ActivTrades, uma das mais antigas corretoras online da Europa.

E ainda nada está decidido. Este sábado, o Parlamento britânico irá ou não passar o acordo proposto por Boris Johnson. Mas a verdade é que apenas o acordo entre Londres e Bruxelas para uma saída limpa acalmou de imediato o mercado financeiro. «O acordo diminuiu as probabilidades de virmos a ter um Brexit duro, o que levou a libra a máximos de 5 meses. Apesar de ser incerto que o primeiro-ministro Boris Johnson vá conseguir fazer passar o acordo no parlamento Britânico, os mercados estão confiantes, como demonstra a performance da libra que, comparando com a situação de há pouco mais de uma semana atrás, leva ganhos de mais de 5.5% em relação ao dólar», diz o especialista.

No cenário ideal, o Reino Unido abandonava a União Europeia a 31 de outubro com tudo bem definido. No entanto, mesmo com acordo, poderiam existir problemas: «O acordo de Theresa May, no espetro comercial, era muito parecido com uma união aduaneira entre a União Europeia e o Reino Unido. O de Boris Johnson é menos voltado para aí, mas, ao mesmo tempo, dará maior flexibilidade para Londres negociar acordos comerciais com países terceiros. Numa análise imediata, pensamos que menos integração com o mercado comum pode ser um fator negativo no crescimento da economia britânica, pelo menos no curto a médio prazo. Logo, segundo esta lógica, o acordo conseguido por Johnson será, por agora, comercialmente menos positivo para o Reino Unido mas também para a União Europeia», diz o analista ao SOL.

 

Um cenário ‘duro’

No entanto, é provável que o acordo não passe este sábado no Parlamento – o Partido Democrata Unionista da Irlanda do Norte já anunciou que irá votar contra a proposta de Boris Johnson, deixando no ar a possibilidade de um novo adiamento. Esta hipótese é vista pelos mercados «como uma situação negativa e levaria a perdas na libra e no FTSE 250 [bolsa britânica]. Neste momento, os mercados vêm um Brexit com acordo como sendo, realisticamente, a melhor opção, já que um novo adiamento prolongaria a incerteza», refere Ricardo Evangelista.

A possibilidade de um Brexit duro, ou seja, sem acordo, traria muitas consequências para o mundo financeiro britânico e europeu. «Muitas empresas que estão agora sediadas no Reino Unido ver-se-iam obrigadas a mudar para um outro país dentro da União Europeia, de forma a evitar restrições no acesso ao mercado único», exemplifica o especialista.

E este não seria o único problema. Com uma saída negociada, existirá um período de transição de um ano, que permitirá realizar os ajustes necessários para que tudo corra bem para ambas as partes. Num cenário de uma saída imediata, sem acordo, existiria um «choque económico imediato», explica Ricardo Evangelista: «filas enormes nas alfândegas, falta de produtos essenciais – uma confusão enorme com um impacto negativo sobre a economia que é difícil de calcular».

Num caso de Brexit duro, os problemas iriam sentir-se também a nível comercial, político, nos serviços financeiros, entre outros: «as trocas comerciais, por exemplo, teriam que se fazer de acordo com os termos da Organização Mundial do Comércio», acrescenta o especialista.

«A incerteza quanto ao desfecho do Brexit não tem sido positiva para a União Europeia e, por conseguinte, para Portugal. Num contexto global condicionado por políticas protecionistas que são vistas como a principal ameaça ao crescimento da economia global, e das principais economias da Europa em particular, uma solução negociada, que mantenha uma relação positiva num cenário de pós-Brexit, deverá ter um impacto positivo», conclui.

 

Impacto em Portugal

O Brexit não está a ser encarada pelo Governo português de ânimo leve. Numa entrevista ao Jornal de Negócios, o ministro dos Negócios Estrangeiro, Augusto Santos Silva, lembrou que o Reino Unido é «o quarto país de exportação de bens portugueses, é o primeiro mercado emissor de turistas e o oitavo fornecedor de bens. Isto mostra a importância de uma relação tão fluida e fácil quanto possível».

Além disso, existem, segundo Santos Silva, «cerca de 300 mil» portugueses a residir no Reino Unido e «162.500 já se candidataram à autorização de residência».