Insetos comestíveis, a proteína do futuro

Chefs, nutricionistas e associações defendem a introdução de insetos comestíveis na alimentação humana. Mas a legislação ainda não permite a sua comercialização em Portugal.

Insetos comestíveis, a proteína do futuro

Bolachas, barras energéticas ou rações feitas à base de insetos comestíveis. Atualmente há já vários projetos em Portugal que estão a apostar em produtos que têm insetos na sua lista de ingredientes. E há já muitos que defendem que se trata da «proteína do futuro». No entanto, a lei em Portugal, e na grande maioria dos países europeus, ainda não permite a comercialização destes produtos. Rui Nunes, presidente da Direção da Portugal Insect – Associação Portuguesa de Produtores e Transformadores de Insetos, considera os insetos comestíveis uma opção proteica essencial para o Ser Humano no futuro, tendo em conta a «expectativa da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e da Organização das Nações Unidas (ONU) que sejamos nove mil milhões até 2050».

Esta associação de produtores e transformadores de insetos portugueses conta com nove associados, todos eles dedicados a projetos que têm por base a utilização de insetos comestíveis para a alimentação humana e animal. Ao SOL, Rui Nunes explicou que «os insetos são uma das fontes proteicas que existem em maior quantidade no planeta Terra, havendo mais de duas mil espécies comestíveis no mundo».

«Temos noção de que a população humana está a aumentar. Nós somos sete mil milhões a habitar o planeta hoje. Se vamos ser mais a habitar o planeta Terra, se uma grande quantidade gosta de comer carne e se todos temos os hábitos alimentares que temos neste momento, que outras fontes proteicas podem existir para alimentar animais e humanos? É aqui que entram os insetos como potencial fonte proteica para animais e pessoas», aponta o presidente da Portugal Insect.

Mas, apesar de já existirem projetos para a criação de produtos alimentares feitos à base destes insetos comestíveis, a legislação ainda impossibilita que cheguem às prateleiras dos supermercados. Esta regulamentação surgiu na altura do feed ban e da doença das vacas loucas. «O feed ban definiu que não entra qualquer animal dentro de outro animal para a alimentação humana. Eliminou-se essa possibilidade e ao fazer isso eliminámos coisas que até faziam sentido, como uma galinha comer insetos. A galinha é um animal insetívoro», refere Rui Nunes.

O termo feed ban refere-se aos regulamentos da Food and Drug Administration (FDA) que  proíbem a alimentação com a maioria das proteínas derivadas de mamíferos ao gado como um método para impedir a propagação da famosa doença das vacas loucas.

Apesar de considerar que os insetos não podem substituir a carne e o peixe, o presidente da Portugal Insect vê esta fonte proteica como tendo «um lugar no mercado de rações e um lugar na alimentação humana». Rui Nunes vê o sushi como um exemplo a seguir pelo mercado dos insetos comestíveis: «Temos o exemplo do sushi que acho que será paradigmático para aquilo que eu acho que acontecerá com os insetos. Primeiro estará num mercado de nicho, uma coisa estranha. Mais tarde vai tornar-se menos estranho e daqui a uns tempos será algo completamente normal. Há uns anos também ninguém pensaria em comer peixe cru».

Para além da legislação que ainda não permite a sua comercialização em Portugal, Rui Nunes pensa que a cultura é o maior entrave aos insetos comestíveis na Europa. «Isto tem tudo a ver com cultura, o que transmitimos aos nossos. Se transmitirmos desde cedo que isto é algo normal não haverá problema», conclui. 

Ao SOL, a nutricionista Lillian Barros explicou que os insetos comestíveis «do ponto vista nutricional podem ser uma boa alternativa à proteína comum, como é o caso da carne, peixe e até certos vegetais». Segundo a mesma, «faz todo o sentido incentivar o consumo de insetos comestíveis, porque estes teriam uma grande importância proteica, para além de terem um baixo custo de produção e uma grande riqueza nutricional». Deixa, no entanto, a nota que terá de haver sempre uma alimentação variada e equilibrada.

«Se calhar se falarmos de outras áreas do planeta, nomeadamente onde há fome, esta pode ser uma oportunidade de suplantar as necessidades proteicas de um globo que tem carências a nível nutricional. Não falamos de zonas desenvolvidas onde até há excesso de proteína, mas para outras zonas do globo isso pode fazer todo o sentido», aponta a nutricionista.

Chefs abertos à possibilidade

Apesar de confirmarem a existência de um grande preconceito na cultura portuguesa e europeia para com os insetos comestíveis, há Chefs que se mostram abertos à possibilidade de inserir insetos comestíveis na sua cozinha quando a legislação assim o permita. 

Contactado pelo SOL, Ljubomir Stanisic, famoso chefe natural da Jugoslávia, afirmou estar «completamente aberto à possibilidade de utilizar insetos» na confeção de pratos caso a lei venha a permitir a sua comercialização. «Sou fanático por gafanhotos fritos, aliás, eu e os meus filhos, acho que são ótimos com cerveja. Importo-os do México e já os incluí em vários pratos ao longo dos anos», referiu.

Segundo Ljubomir, «existe uma grande necessidade de encontrar alternativas mais sustentáveis na alimentação, sobretudo tendo em conta o crescimento da população». O Chef explica que já confecionou vários pratos que incluíam insetos comestíveis, incluindo um puré de batata amanteigado com gafanhotos e trompetas da morte. «Era ótimo!», esclarece.

Também o Chef Nuno Queiroz Ribeiro, conhecido pelo seu trabalho na área da alimentação saudável e escolar, admite que seria capaz de utilizar insetos comestíveis na confeção de pratos. «Na minha área, da alimentação escolar, acho que seria muito difícil, mas na área da restauração tenho a certeza que seria uma oportunidade única de trabalhar com um produto novo, inovador e que vai certamente surpreender as pessoas no futuro», conclui.