Carta aberta ao presidente da Câmara de Lisboa

‘O terreno, chamado Artilharia 1, valia 208 milhões, em 2017, e, hoje, vale 160. Como irá acompanhar esta espetacular desvalorização?’ 

Uma das últimas propriedades livres na zona mais cara do país, no coração da cidade de Lisboa, entre a área envolvente ao Parque Eduardo VII e as Amoreiras, desvalorizou, entre 2017 e 2018, de um modo espetacular. O terreno, chamado Artilharia 1, valia 208 milhões, em 2017, e, hoje, vale 160 milhões. 

Qualquer pessoa que segue, minimamente, o mercado imobiliário tem de ficar apreensiva com as notícias desta desvalorização. Levantam-se duas dúvidas. A primeira é mais evidente. Como foi possível tamanha desvalorização quando os valores do mercado imobiliário em Lisboa subiram? A segunda é mais preocupante. O terreno pertence à Lone Star, o fundo norte-americano que comprou o Novo Banco e herdou, com a compra, um conjunto de ativos imobiliários entre os quais este terreno da Artilharia 1, ficando o Fundo de Resolução comprometido a pagar as desvalorizações dos ativos. Estará a desvalorização deste ativo, designadamente 48 milhões, integrada no valor global que nós, contribuintes, avançámos, em 2018, ao Fundo de Resolução para cobrir as perdas do Novo Banco? Estas avaliações imobiliárias são elaboradas por especialistas e, supomos, validadas por entidades competentes para o efeito. No entanto, o valor de qualquer propriedade depende, acima de tudo, da localização e da capacidade de construção. Se estas duas variáveis não mudaram e se, simultaneamente, a média do valor de mercado subiu, parece haver uma única conclusão possível, com os dados divulgados: aqui há gato. 

Caro Presidente, cabe aos cidadãos o dever de escrutínio, mas cabe ao Município uma voz ativa nesta bizarra situação. No mercado imobiliário, o Município tem duas missões principais. A primeira é garantir que todo o jogo é feito com transparência cristalina, permitindo aos cidadãos que exerçam o seu direito de escrutínio público sobre todos os critérios subjacentes a todas as decisões urbanísticas. A segunda é aproveitar qualquer momento de excessiva valorização, ou desvalorização, das propriedades para ganhar contrapartidas para o espaço público, usufruído por todos os cidadãos. Pede-se aos eleitos que definam critérios claros e equitativos, que mantenham uma determinação de aço na defesa do interesse público, e que, deixando a ingenuidade na gaveta, estejam atentos.

Assim, Senhor presidente da Câmara de Lisboa, qual é a posição do Município sobre esta matéria? Como irá acompanhar esta espetacular desvalorização do terreno da Artilharia 1? Qual o destino e para quando está prevista a qualificação de um dos últimos terrenos livres no coração da nossa cidade?