O impeachment está a resultar para os democratas?

Encerradas as audiências para a impugnação de Trump, os democratas terão que decidir como proceder a partir de agora. Eleitorado conservador e congressistas republicanos não ficaram convencidos.

Naquela que pode ser a última semana de audiências públicas dos inquéritos para a impugnação de Donald Trump, os democratas vão montando o seu caso contra o chefe da Casa Branca. Agora têm de decidir se possuem provas suficientes para avançar com a destituição – e com que artigos vão tentar julgar o Presidente – ou se, em alternativa, trazem ao Congresso novas testemunhas com provas mais diretas das ações de Trump. Uma coisa é clara: os democratas não convenceram nenhum congressista da oposição e o eleitorado republicano continua firmemente do lado do chefe da Casa Branca.

Todas as testemunhas ouvidas até agora confirmaram que Trump queria que a Ucrânia interviesse nas eleições de 2020, pressionando as autoridades do país para investigar Joe Biden e o seu filho, Hunter Biden, que trabalhou para uma petrolífera ucraniana, a Burisma. E estava a disposto a trocar favores – o quid pro quo – para que isso acontecesse, tendo inclusive retido a verba de ajuda militar à Ucrânia. Contudo, há lacunas por preencher. Os democratas solicitaram os testemunhos do chefe de gabinete de Trump e do antigo conselheiro de Segurança Nacional, mas não é certo que compareçam no Congresso.

Fiona Hill, britânica de nascença naturalizada norte-americana, especialista na Rússia que foi diretora do Conselho de Segurança Nacional de Trump (deixou a administração este ano), revelou-se a testemunha mais fria, direta e motivada de todo este processo. Um dos seus ataques centrou-se em Gordon Sondland, embaixador norte-americano para a União Europeia, um milionário que faz doações frequentes para o Partido Republicano e que nunca tinha tido qualquer experiência na diplomacia do país.

Sondland, que também foi ouvido durante a semana, disse que nunca se tinha apercebido de que a pressão de Trump sobre os ucranianos para investigar a Burisma tinha que ver com os Biden. Mas Hill contrapôs, dizendo «não ser credível» que Sondland não estivesse a par do que se passava – e sugeriu que até foi um ator central em todo o processo. «Tendo ouvido o senhor [Rudolph] Giuliani, uma e outra vez», afirmou Hill, referindo-se ao advogado pessoal de Trump, «era claro que a Burisma era um código para os Biden».

Hill atacou ainda os republicanos que tentaram insinuar que foi a Ucrânia, e não a Rússia, que tentou interferir nas últimas eleições do país. «Recuso-me a participar numa narrativa de que o Governo ucraniano é nosso adversário ».

As audiências públicas foram concebidas pelos democratas como uma maneira de trazer semanas de testemunhos à porta fechada para as televisões dos norte-americanos e convencer os eleitores que a impugnação de Trump é justificável – coreograficamente planeadas nesse sentido. Mas como notou o Politico, a persuasão tem limites. Não encorajaram nenhum congressista republicano disposto a votar pela destituição do chefe da Casa Branca, num período em que o país se encontra dividido e que «qualquer sinal de deslealdade para com Trump significa a excomunhão», diz o Politico, do Partido Republicano.

 

Linha de defesa republicana

Nem as sondagens de aprovação de Trump entre o eleitorado republicano incentivam os congressistas a fazerem tal coisa. Segundo a Gallup, Trump tem 89% do eleitorado republicano do seu lado. E mostram que as linhas de apoio reproduzem de forma semelhante a polarização do país desde a eleição de Trump. Embora muitos admitam que o chefe da Casa Branca agiu mal, os congressistas republicanos argumentam que as suas ações não justificam a destituição. «Ainda não ouvi provas de que o Presidente tenha cometido suborno ou extorsão», argumentou o congressista do Texas Will Hurd, que se retirará do Congresso no próximo ano, citado pela Associated Press.

Os republicanos defendem o chefe da Casa Branca com vários argumentos. Primeiro, que Trump não tinha a intenção, nem sequer a competência, para conseguir um acordo de troca de favores com a Ucrânia. E sem a intenção de cometer um ato ilegal, alguns defendem que o que o chefe da Casa Branca fez não foi inteligente, mas que também não constitui um crime. Lindsey Graham, congressista da Carolina do Norte e um dos maiores aliados de Trump, fez um comentário que parece consubstanciar essa posição. «Foi incoerente», começou por dizer: «Parecem incapazes [a administração] de formar um quid pro quo».

Alguns comentadores conservadores defendem que a impugnação é um instrumento demasiado radical e anti-democrático. Há ainda congressistas republicanos que defendem que as ações de Trump não são apenas defensáveis, mas adequadas. É o caso de Rick Perry, congressista do Pensilvânia. «Está perfeitamente dentro do alcance e da autoridade do Presidente», sublinhou, citado pelo site de notícias Vox.

Certos republicanos desvalorizam a novela do impeachment como «uma distração», sabendo que quando o processo subir ao Senado, os democratas não conseguirão remover Trump. Aliás, o próprio chefe da Casa Branca já teceu comentários, mostrando algum conforto em relação ao julgamento no Senado, liderado pelo Partido Republicano. «Estamos a ganhar à grande, e em breve eles estarão no nosso território», disse, citado pelo Politico.

O impeachment é um processo político e não legal. Os democratas focaram a sua estratégia para a destituição somente no caso ucraniano, fazendo figas para que o eleitorado norte-americano fique convencido que Trump pôs em causa a soberania. Hill, nessa óptica, foi água para os ouvidos dos democratas. Questionada sobre quais as consequências para o Congresso caso permita que um Presidente norte-americano peça a interferência de um Governo estrangeiro: «É um precedente muito mau».