Identidades políticas: 25 de Abril e 25 de Novembro

«Nada justifica o comportamento timorato que o PS tem vindo a revelar na abordagem a este assunto». Francisco Assis

Nos últimos dias, o debate sobre a comemoração oficial dos quarenta e cinco anos do 25 de Novembro de 1974 voltou ao espaço público, intermediado por muitos órgãos de comunicação social.

Debate que veio mais uma vez, à semelhança de anos anteriores, confirmar que continuam a existir complexos com pouca racionalidade acerca da identidade política que está associada ao 25 de Novembro de 1974. Data que foi decisiva para o caminho percorrido pelo nosso país nas últimas quatro décadas. Com a solidificação de uma identidade jurídico-política de afirmação de Portugal como um Estado de direito democrático, com uma democracia política, económica, social e cultural consolidada. Com opções de natureza política e institucional tão importantes como a integração no projeto europeu e muitas outras coisas que muita gente já não recorda mas que estiveram em causa antes do 25 de Novembro: separação de poderes, eleições livres com base na democracia pluripartidária, liberdade de opinião, liberdade de informação, etc.

Não há como deixar de o dizer: existe uma determinada identidade política associada ao 25 de Abril e existe uma outra identidade política associada ao 25 de Novembro. Goste-se ou não se goste, esta é a verdade.

Uma comemora-se e bem. Porque, entre outras coisas, o 25 de Abril de 1974 foi um dia, uma data, uma revolução que acabou com uma ditadura que só pecou por tardiamente ter sido substituída por um novo período da República portuguesa. A outra data, o 25 de Novembro, não se comemora – e mal – por falta de coragem dos defensores e cultores da democracia política, económica, social e cultural. 

Porquê? Por que é que nunca se comemorou, tantos anos volvidos, a sua importância? Porque as datas fraturantes não merecem ser evocadas? Parece muito pouco para que assim seja.

Sem subtilezas, há que dizê-lo: associadas ao 25 de Abril e ao 25 de Novembro estão duas identidades políticas diferenciadas. O 25 de Abril é, no seu modo de celebração, associado à esquerda e sobretudo à extrema-esquerda. O 25 de Novembro é, mesmo sem celebração e evocação formal pelos principais órgãos de soberania (Parlamento, Governo ou Presidente da República), associado à esquerda moderada, ao centro moderado e à direita democrática. Insistir em não dar outro tipo de dignidade formal à comemoração do 25 de Novembro é fechar os olhos a um acontecimento dos mais relevantes da história portuguesa das últimas décadas. E é encurralar ainda mais o 25 de Abril de 1974 na extrema-esquerda, entregando-o nos braços da esquerda radical.

É que sem o 25 de Abril não haveria 25 de Novembro. Mas sem o 25 de Novembro o que de melhor trouxe o 25 de Abril não se concretizaria: Estado de direito democrático, separação de poderes, justiça imparcial, direitos, liberdades e garantias, liberdade de opinião, liberdade de informação, etc. Ou será que muitos dos que viveram estes tempos já se esqueceram da clarificação da manifestação da Alameda? Já se esqueceram de Melo Antunes e de outros? Já se esqueceram do que Mário Soares a este propósito várias vezes recordava: que tinha sido o único menchevique a derrotar os bolcheviques? Falta, pois, consenso e coragem para dar ao 25 de Novembro o que ele merece e o que outras datas também importantes tiveram e têm: a solenidade da sua evocação pelos órgãos de soberania. Órgãos que, sem o 25 de Novembro, nunca existiriam tal como existem.

Para quando? É certo que algumas vozes poderão de má-fé e com ignorância dizer que esta é mais uma voz ‘fascista’, ‘reacionária’, etc. A esse propósito, só poderei dizer: eu? O ‘esquerdista’ de vários governos não socialistas? O amigo dos ‘pretos’ e dos imigrantes? O ex-secretário de Estado defensor dos jornalistas que matam e esfolam e impõem mentiras que encantam? Quanto a isso, estamos conversados.

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