A nova frente ribeirinha

Com mais de 1.6 milhões de seguidores nas redes sociais, O recente anúncio da requalificação da zona ribeirinha junto ao Terreiro do Paço é uma boa notícia. Trata-se da concretização de uma velha aspiração de devolução do Tejo a Lisboa no coração da cidade.

Lisboa ganha espaço público requalificado e aproxima-se do Tejo ficando (ainda) mais bonita! Mas continua adiada a criação de um polo de evocação da epopeia marítima dos Descobrimentos – o que é indesculpável tendo em atenção a relação de Portugal e de Lisboa com este período histórico que é parte da nossa identidade e reconhecimento internacional.

Longe vai o tempo da reivindicação da ‘devolução’ do rio à cidade. Timidamente, em meados dos anos 90 surgia uma nesga de Tejo para as pessoas quando as ‘Docas’ ganharam nova vida e concentraram o espaço de acesso ao rio. Toda a restante zona ribeirinha estava vedada e era da jurisdição da Administração do Porto de Lisboa. Depois surgiu a Expo e começou a tornar-se insustentável a separação da cidade do rio e foi irreversível a apropriação progressiva de mais faixas ribeirinhas sem uso portuário. Hoje o Tejo pertence a Lisboa. Como deve ser. 

Mas se é verdade que as margens do Tejo são parte da cidade, continua a existir uma barreira invisível que impede que os lisboetas se apropriem do rio propriamente dito. Continua por promover suficientemente o uso do rio enquanto meio para a prática desportiva ou de lazer. Faltam os incentivos à prática de actividades náuticas. Tarda a criação de um centro náutico municipal que ‘democratize’ o acesso ao rio.

A requalificação da frente ribeirinha junto ao Terreiro do Paço é importante. Para além da renovação do espaço público, é desenvolvido um polo de lazer junto ao rio em torno da doca da Marinha, bem como a recuperação da Estação Fluvial Sul e Sueste para ser instalado o apoio à actividade marítimo-turística com a construção de novos pontões e acolher também um polo de valorização do rio enquanto elemento ambiental, social e cultural e de representação da oferta cultural e turística dos municípios ribeirinhos, afirmando Lisboa como capital do Tejo.

Por outro lado, é anunciado o ‘Bacalhau Story Centre’ (?!) em conjugação com um cais para a exposição do navio Creola – barco escola da marinha portuguesa e antigo bacalhoeiro. Para além do gosto duvidoso da designação em inglês, não se entende esta opção quando Lisboa não tem a importância e tradição – como outras regiões do país – nesta actividade. 
Trata-se de uma oportunidade perdida para apostar (finalmente) na criação de um museu ou outro equipamento cultural sobre as Descobertas, em falta em Lisboa. Este tema deveria ser a aposta neste espaço voltado para o rio.

Apenas por preconceito, a que corresponde um erro estratégico nacional grave, se pode justificar que não se aposte na promoção da história e identidade de Portugal em torno dos Descobrimentos e que se desperdice a oportunidade de potenciar turisticamente um facto histórico impar que é reconhecido e associado a Portugal em todo o mundo. Se a sustentabilidade do turismo carece de factores diferenciadores, aqui está um. Infelizmente parece que se optou por trocar os Descobrimentos pela pesca do bacalhau.

Duas últimas notas sobre esta requalificação da zona ribeirinha: podia ser uma oportunidade para fazer regressar à margem de Lisboa a Fragata D. Fernando II e Glória, que foi provisoriamente colocada em Cacilhas e potenciar a sua exposição como elemento de atracção turística; deveria ser prevista a ligação da doca da marinha ao Campo das Cebolas rasgando o muro construído no jardim ali criado recentemente e que constitui uma barreira.