O menino Daniel, a RTP e a burguesia jornalística

É neste mundo cor de rosa que os danieis oliveiras da vida prosperam, onde uma verdade só existe quando eles decidem que existe.

Daniel Oliveira, distinto ex-membro do Bloco de Esquerda, é uma figura que dá gosto de ver na televisão, isto para quem tem paciência para programas de humor negro. O homem faz lembrar uma personagem do filme O Sentido da Vida, dos Monty Python, que de tanto ‘enfardar’ acaba por rebentar depois de comer um chocolate de menta, salvo erro. O ex-bloquista tem-se em tão grande conta que não pára de inchar e sempre que tenho o azar de passar pelo Eixo do Mal, da SIC, – onde também entra o inenarrável Pedro Marques Lopes – fico com algum receio de que o homem vá rebentar com tamanho ego. Parece que o comentador do reino está sempre a perguntar: «Espelho meu, diz-me se há alguém mais culto e engraçado do que eu».

Daniel Oliveira – como o seu adjunto Lopes – perora sobre todos os assuntos com uma insustentável leveza do ser, parecendo que estamos perante um pequeno Deus grego. Não acho que venha algum mal ao mundo, pois cada um vê e ouve o que quer. Talvez por essa razão nunca lhe tenha dado grande importância, apesar das bicadas que nos vai dando com alguma frequência, a nós e àqueles que acha que não são merecedores de existirem. Tudo isso é normal, e apesar de eu escrever diariamente em jornais e ser insultado por cães raivosos ligados a partidos, muito raramente respondo a esses insultos. Se escrevo o que penso, os outros também têm o mesmo direito, apesar de ultrapassarem os limites da decência.

E é por isso que escrevo, contrariado, é certo – por razões que não são para aqui chamadas -, estas linhas sobre Daniel Oliveira. Como é que alguém que aceitou ser censurado num jornal onde escreve se põe a falar da liberdade de imprensa, acusando alguns jornais de não serem os melhores meios para se saber assuntos sobre os respetivos donos, referindo-se ao Correio da Manhã que terá passado ao lado de uma notícia que envolvia o seu proprietário. Daniel Oliveira não tem mesmo vergonha de ser feliz, pois aceita ser censurado, mas ataca os outros! Para mim, que faço e leio jornais, gosto muito do contraditório. Mas o menino Daniel é tão irrequieto que nem tem tempo para essas minudências. Com diz um amigo meu, «pode ter  lido muito Engels e Rosa Luxemburgo, muito Max Weber e Hanna Arendt, até muito Varoufakis e Noam Chomsky, mas pouco aprendeu no que respeita a humildade e menos soberba».

De certa forma, Daniel Oliveira é um pouco o espelho de alguma imprensa portuguesa – aburguesada, preguiçosa, elitista e sem vergonha. No dia de ontem, à semelhança do que tem feito nos últimos dias, o jornal i deu destaque à situação na RTP, onde a direção é acusada de ter sabotado uma reportagem do Sexta às 9 sobre um instituto onde Maria Flor Pedroso lecionou. O caso é grave, já que a diretora do canal foi confrontada por toda a equipa de Sandra Felgueiras na reunião do CR, e o órgão que representa os jornalistas se sente impotente para tomar uma posição antes da realização de um plenário na próxima segunda-feira. Toda a comunicação social, com exceção do CM, passou ao lado da polémica e, quando acordou, ontem à tarde, foi incapaz de citar o i ou o CM. É neste mundo cor de rosa que os danieis oliveiras da vida prosperam, onde uma verdade só existe quando eles decidem que existe. Sou diretor executivo de dois jornais, já fui editor e diretor interino de outros meios e nunca jornalistas que trabalharam comigo deixaram de dar créditos a quem os tem. Mas este é o mundo em que vivemos.

vitor.rainho@sol.pt