Contra a podridão, viva a ‘anarquia’!

Foi lançado esta semana o livro do investigador Carlos Gaspar denominado O Regresso da Anarquia, com o subtítulo Os Estados Unidos, a Rússia, a China e a Ordem Internacional. Ainda não li o livro, mas o pequeno extrato que o Público de 9 de dezembro nos ofereceu, alinhado com a carreira profissional e política do…

Foi lançado esta semana o livro do investigador Carlos Gaspar denominado O Regresso da Anarquia, com o subtítulo Os Estados Unidos, a Rússia, a China e a Ordem Internacional. Ainda não li o livro, mas o pequeno extrato que o Público de 9 de dezembro nos ofereceu, alinhado com a carreira profissional e política do autor, deixam claro o seu propósito de ‘pôr ordem’ nas cabeças confusas dos nossos dias e realinhá-las novamente para o grande desígnio de reafirmação e concretização do excecionalismo americano à escala mundial.

Antes de avançar, quero esclarecer os leitores menos atentos sobre o que é isso do excecionalismo americano.
A ciência da Biologia (ver Humberto Maturana) ensina que um organismo é constituído por duas componentes principais: o ser vivo (aquilo a que vulgarmente se chama ‘biologia’) e o seu acoplamento estrutural com o meio (ou o seu modo de viver).

Os nazis consideravam que a ‘raça ariana’ (com genes ‘arianos’) era muito superior (eram ‘humanos mais perfeitos’) do que os outros, podendo servir-se destes como entendessem, ou simplesmente, eliminá-los. Era a ‘excecionalidade ariana’, baseada na superioridade genética.

De modo equivalente, os norte-americanos, ultrapassada a sua fase “revolucionária”, nos séc. XVIII e parte do XIX, passaram, já no séc. XIX, para a fase soberba, de auto-satisfação e vaidade e, em seguida, para a arrogante e opressora (com a doutrina Monroe), com base na superioridade do seu modo de viver, dos seus valores, considerados como um padrão a ser adotado por todos os outros humanos como condição para se libertarem do ‘seu atraso humano e civilizacional’, para deixarem de ser ‘bárba’ ou ‘selvagens’.

Foi assim que Obama, um negro, veio, ele próprio, a declarar, em lugar dos valores da sua campanha eleitoral (prevalência da main street relativamente à Wall Street, fim da guerra do Afeganistão e fecho de Guantanamo…), a ‘excecionalidade americana’, isto é, a prevalência de Wall Street, o unilateralismo norte-americano e a impunidade internacional dos seus crimes.

Assim, segundo os ‘superiores’ norte-americanos e os seus lacaios em todo o mundo, que também se consideram ‘superiores’, mais ‘humanamente perfeitos’ que os seus concidadãos, os EUA terão o desígnio histórico de arrancar todos os ‘bárbaros’ e ‘selvagens’ do seu estado de atraso levando-os, se necessário com a violência adequada, a viver ‘à sua maneira excecional’.

Todos aqueles que, no mundo, não partilhem dessa cosmovisão centrada nos EUA e no seu ‘excecionalismo’, são considerados ‘revisionistas’ e ‘populistas’ (os nomes sofisticados para ‘bárbaro, selvagem’ ou, ainda pior, ‘comunista’), devendo, por isso, ser contidos, derrotados e reciclados.

O livro de Carlos Gaspar será, segundo parece, um compêndio de convencimento dos confusos à ordem americana e de legitimação das suas políticas internacionais destinadas a acabar com a Rússia (pela sua derrota militar e fragmentação em vários países pequenos e domesticados) e a reconduzir a China a um país tecnologicamente atrasado e auto-contido nas suas fronteiras (se possível com muito ópio).

Este servilismo de portugueses relativamente aos norte-americanos só poderá arrastar Portugal para orientações de desagregação da União Europeia e, eventualmente, para a geração de um conflito nuclear da Europa.
Sinto verdadeira repulsão pelos ‘documentários’ da RTP3 (pública e comprometendo o governo do PS) de propaganda do Daesh, dos radicalistas caxemireses e do Guaidó, contra tudo o que se possa chamar decência ou, até, espírito cristão…

Felizmente que, enquanto este mundo velho de arrogância e opressão vai ruindo, um novo mundo, baseado na cooperação pacífica e no progresso partilhado, vai nascendo… Por mim, teria pena se Portugal se deixasse ruir com o ‘velho’ e não participasse no parto do ‘novo’.