OE. As contas com excedentes que não agradam a ninguém

Só o PS elogiou proposta. Ex-parceiros de geringonça, insatisfeitos, aumentam a pressão e continuam os contactos. 

A proposta de Orçamento do Estado para 2020 não agradou (quase) a ninguém no Parlamento. A exceção foi o PS, que suporta o Governo. 

O BE, que pode vir a ser decisivo para aprovar o documento em fevereiro, também não passou um cheque em branco. A deputada Mariana Mortágua foi muito clara ao sublinhar que o documento não era suficiente para o partido. Por isso, reserva-se ao direito de decidir mais à frente, colocando pressão no PS e na sua capacidade negocial na Assembleia da República.

O discurso do ministro de Estado e das Finanças, Mário Centeno, também não deixou grande margem para negociações. Mário Centeno foi até mais duro do que é habitual no envio de alguns recados aos ex-parceiros de geringonça: “As escolhas são muito claras: SNS, redução da pobreza, jovens, desafio demográfico e investimento – se quisermos alterar estas prioridades, temos de apresentar alternativas”, declarou Centeno.

E o sinal de distanciamento é claro de uma legislatura para outra. Centeno não se cansou de destacar o facto histórico de uma previsão de excedente orçamental (nunca houve em democracia), mas a deputada do BE Mariana Mortágua considerou que o “ excedente orçamental [500 milhões de euros] é a resposta errada ao país”.

Os Verdes reagiram de seguida, prometendo um sentido de voto responsável, assinalando o lado bom ( e o mau) da proposta. Do lado negativo estava o facto, por exemplo, de não se reverem os escalões do IRS, como o PEV propunha e a demais esquerda defende.

Dos antigos parceiros de esquerda, da chamada geringonça, os comunistas foram os últimos a reagir (já depois da correção de gralhas no relatório do Orçamento). O líder parlamentar comunista disse que a proposta de Orçamento tem opções erradas, mas não revelou o sentido de voto, colocando ainda mais pressão ao PS. João Oliveira insistiu que a “proposta de Orçamento apresenta insuficiências e limitações relevantes e, ao mesmo tempo, não prossegue e, em alguns casos trava mesmo, o necessário ritmo dos avanços necessários para dar resposta aos problemas mais imediatos do povo e do país”. 

Tanto o primeiro-ministro, António Costa, com o PS sustentaram que não há motivos para ruturas à esquerda, nem houve recuos face à anterior legislatura. Por isso, esperam a viabilização do documento com os ex-parceiros de geringonça.

A partir de Belém, após uma audiência com Marcelo Rebelo de Sousa, o deputado do PAN André Silva considerou ainda que a proposta terá de ser mais ambiciosa, e mesmo com o aumento do IVA nas Touradas, a medida não basta para o PAN viabilizar a proposta. Também o Livre, pela voz de Joacine Katar Moreira, deixou avisos ao Governo, ficando claro que o partido irá analisar o texto à lupa, mas também ficou uma certeza: “Não há uma intenção imediata de constituirmos um obstáculo, mas iremos defender absolutamente todos os valores da justiça social”, declarou Joacine Katar Moreira, citada pela RTP, após um encontro com o chefe de Estado. O Livre já pediu, entretanto, reuniões com o PS, BE, PCP e “Os Verdes” para que o orçamento não seja uma solução de “remendos”, como frisou Pedro Mendonça, porta-voz do Livre.

Centeno na Madeira Entretanto, o ministro das Finanças tem viagem marcada para o Funchal onde está prevista hoje a sua participação num evento dedicado às 500 maiores empresas da Região Autónoma. É mesmo o orador convidado e deverá haver espaço para contactos informais com o líder do Governo Regional da Madeira sobre o Orçamento do Estado. Ontem, Miguel Albuquerque defendeu que “o jogo [sobre o sentido de voto no Orçamento ] ainda está em aberto”, disse o responsável, citado pelo Diário de Notícias da Madeira. Traduzido? Decorrem contactos nesta fase para definir espaço de negociação (e cedências) no debate de especialidade no Parlamento.

A Madeira é importante, porque os três deputados sociais-democratas, eleitos por aquele círculo eleitoral, podem fazer a diferença com a sua abstenção (e será este um dos cenários a avaliar). A proposta de Orçamento já contempla o cofinanciamento do Hospital Central do Funchal, previsto no Orçamento de 2020 (170 milhões de euros). Mas haverá mais exigências na lista.

Para já, a posição do PSD/Madeira não merece comentários dos sociais-democratas.

No PSD nacional ninguém acredita que o partido possa viabilizar o Orçamento do Estado, por duas ordens de razões: primeiro, porque o PSD vai escolher um novo líder e a votação na generalidade ocorrerá na véspera das eleições diretas, ou seja, a 10 de janeiro. Segundo, o PSD atacou a forte pressão fiscal sobre os portugueses.

O CDS já sinalizou que irá votar contra o Orçamento, tal como a Iniciativa Liberal, que promete entregar propostas de alteração para o alívio fiscal, enquanto André Ventura, do Chega, não fechou o sentido de voto, porque “não é uma claque”. Para o efeito, Ventura exige subsídios de risco para as polícias e subsídio de alojamento para os professores. As contas serão feitas na especialidade.