Barcelona-Real Madrid. Uma vida de golos!

Os espanhóis chamam-lhe 18D. O dia do Clássico. O Barcelona recebe, esta quarta-feira, o Real Madrid num jogo de todas as histórias.

O primeiro Barcelona-Real Madrid para a Liga Espanhola data de 17 de fevereiro de 1929. Nada que nos faça mergulhar nos poços profundo do olvido, algo que se explica pelo facto de apenas nesse ano se ter disputado o primeiro campeonato dos vizinhos aqui do lado. Até aí, e desde 1902, a única competição nacional era a Copa del Rey. E foi em 1902 que os dois gigantes do país da Fiesta se viram frente a frente pela primeira vez, disputando a Copa de la Coronación, com vitória dos blaugrana por 3-1.

Em 1929 ainda não havia Camp Nou, que só foi inaugurado em 1957. Havia o Camp de les Corts, ou simplesmente Les Corts, que viera substituir o Camp del Carrer Indústria, um terreno na zona de Esquerra de l’Eixample, tão acanhado que ganhou a alcunha de l’Escopidora, a Escarradeira. Foi precisamente em Les Corts que o Real Madrid obteve a sua primeira vitória no campo do rival, 2-1 com dois golos de Morera contra um de Parera.

Um Barcelona-Real Madrid, como o que se disputará na próxima quarta-feira, é uma promessa de golos. Tanto assim que em 176 disputas para o campeonato só por oito vezes se registou o resultado de zero-a-zero. De estalo! É verdade que a rivalidade entre ambos só se tornou figadal em 1953, com o caso-Di Stéfano, o argentino vindo do Millionarios da Colômbia, cometeu a proeza de assinar contrato com ambos os clubes. A Espanha franquista tratou o Real Madrid com a pompa e circunstância devida à realeza, mesmo em tempo de República. Don Alfredo foi entregue de bandeja ao merengues e a cicatriz ficou a falar até aos dias de hoje. O que não quer dizer que massacrar o opositor não deixasse na boca dos triunfantes aquele sabor especial próprio do néctar dos deuses do Olimpo.

Talvez não se repita nos anos mais próximos o espetáculo tremendo do dia 10 de janeiro de 1943. Cinco-a-cinco! Com um indispensável ponto de exclamação. Ao intervalo, o Barça batia o Real por 4-2, golos Martín (2), Escolà e Valle para os catalães, e de Alonso e Alday para os castelhanos. Depois houve a reviravolta. Alday reduziu, Valle fez o 5-3, Botella e Mardones garantiram o empate. O Athletic Bilbao seria o campeão.

Até 1945, Barcelona e Real Madrid não causavam arrepios aos seus adversários, como hoje acontece. Reparem: apenas dois títulos para os de Madrid (1931-32 e 1932-33) e outros tantos para os da cidade dos condes (1928-29 e 1944-45). Precisamente nesse ano de 1945, o Barça aplicava a sua primeira grande goleada ao rival: 5-0. Nada que se comparasse com os arrasos sofridos no Velho Chamartín, em 1935, para a Liga (8-2), e em 1943, para a Taça do Rei (11-1). Mas vinha aí uma das grandes décadas para os pupilos do suíço Hans-Max Gamper Haessig, que jogou no Barcelona entre 1899 e 1903, assumindo pela primeira vez a presidência em Dezembro de 1908.

Ladislao!

Ferdinand Daucik é um nome que não reluz nas vitrinas da história do futebol. Mas foi o homem que o Barcelona foi buscar para treinador de forma a convencer o húngaro Lázló Kubala a juntar-se ao clube. Daucik era pai da mulher de Kubala. O casamento deu-se aquando do refúgio do jogador em Bratislava, escapando-se ao serviço militar. Defendeu a camisola do Slovan e da seleção checa, tirando proveito do facto da sua mãe ser natural de Bratislava. Kubala regressou à Hungria, mas por pouco tempo. A ascensão do comunismo levou-o a Itália. Depois, finalmente, Barcelona, em 1950.

Lázló espanholou-se em Ladislao e mudou o destino do Barça. Em três anos, levou a equipa às costas na conquista de dois campeonatos e três Taças do Rei e ao triunfo na Taça Latina. Com ele, assumiram o estrelato jogadores catalães da classe de Basora, Biosca, Ramallets, Seguer, Segarra, Bosh e Calvet; o guarda-redes murciano Velasco; o grande capitão leonês César; os bascos Aldecoa e Escudero; o argentino Nicolau e o romeno Szegedi. Mas ainda não fazia parte do onze que obteve a grande vingança de 24 de setembro de 1950.

Les Corts rebentaram pelas costuras para o Clássico. O Real apresentava uma linha avançada na qual pontificavam Luis Molowny, Pahiño, Pablo Olmedo, Macala e Arsuaga. No entanto, seria o jovem guarda-redes, Juanito Alonso, de 22 anos, a ser engolido pelo furacão ofensivo azul e grená. Vogando tristemente pelo 13.º lugar da classificação, os merengues foram devorados. Os dois golos marcados por Molowny e Manuel Garcia foram absolutamente varridos pelos sete assinados por Gonzalvo III, Marcos Aurélio (2), Estanislao Basora, Mateo Nicolau (2) e Cesar Rodriguez. Seria preciso esperar sete anos para se repetir uma diferença de golos de tamanha dimensão. Aí a contar para a Copa del Rey que se transformara, canalhamente, na Copa del Generalíssimo. 6-1, com Kubala a molhar a sopa e o paraguaio Eulogio Martínez a marcar quatro golos.

Os números atingiram neste ano de 2019 um equilíbrio notável. Para a liga, o Barcelona tem 50 vitórias em casa, tendo concedido 19 empates e 20 derrotas. O Real Madrid, por seu lado, soma 52 vitórias caseiras, com 15 empates e 22 derrotas. Um impressionante total de 72 vitórias para cada um. Contribuiu para isto a forma como o Barça se tem superiorizado desde 2013-14: oito vitórias contra duas nos últimos doze jogos. Como o último 0-0 data de 2003, nada como criar a expectativa de mais um ‘partidazo’ para quarta-feira que vem. 18D!