Francisco Rodrigues dos Santos: “Se o CDS achar que tem de ser como o PSD perde a sua razão de ser”

O líder da JP é um dos cinco candidatos à liderança dos centristas e defende que o partido tem de assumir o seu legado doutrinário – uma nova direita – com medidas concretas, sob pena de ter uma falência de identidade.

Francisco Rodrigues dos Santos: “Se o CDS achar que tem de ser como o PSD perde a sua razão de ser”

É candidato à liderança do CDS para representar ‘uma nova direita’. Como se materializa isso?

O CDS tem que representar a primavera que a direita tem de atravessar para se reinventar e renascer, o tal novo partido antigo que representa esta nova direita em Portugal. E o que é ela significa? Em primeiro lugar, tem que suscitar aos portugueses que voltem a acreditar no CDS. O CDS sempre foi a âncora da direita do regime, a fronteira de todos os extremismos, o porto seguro dos valores da democracia cristã europeia e um partido de compromisso e de governo. É fundamental voltar afirmar esta nova direita com base nestes princípios.

E em segundo lugar?

Não basta apenas ganhar o próximo congresso. Não está em causa apenas um cálculo matemático e uma contabilização de votos. É preciso convencer os portugueses de que podem voltar a acreditar no CDS. Que é o partido das pessoas e das liberdades. Que é um partido que  tem de se assumir descomplexadamente de direita sem pedir autorização à esquerda para defender as suas ideias e marcar a agenda. E que não se acobarde nem se encolha quando é chamado a travar uma batalha cultural.

Isso quer dizer que o CDS se acobardou na liderança cessante?

Não, não é isso que estou a dizer.  O CDS deve ser uma direita que não tem problemas em ser disruptiva, uma direita que não tem medo de ser inconveniente, de atentar às vezes contra o establishment, contra algumas elitezinhas de esquerda gourmet, socialista, bem pensante. É um partido que vem para agitar as consciências, mas ao mesmo tempo é um partido que é moderado.

O que está a querer dizer é que o CDS não pode ser um partido do catch all  do centro-direita?

Quando um cidadão vota no CDS  tem uma expectativa razoável de que o CDS seja o CDS, ou seja, que sejamos coerentes, previsíveis e seguros na afirmação das nossas ideias e do nosso programa para Portugal.  O que eu acho que é este novo CDS da nova direita? É um partido que tem a sua ação virada para as pessoas, em particular para os mais pobres da nossa sociedade, os mais vulneráveis. E que privilegie sempre a família enquanto célula fundamental da nossa sociedade. 

E respondendo à pergunta sobre o partido catch all?

O CDS andou perdido de si mesmo, ou seja, teve aqui um distúrbio de identidade e agora tem que se reencontrar consigo próprio.

Teve um distúrbio de identidade com quem? Com Assunção Cristas? Com Paulo Portas?

Não, não. Este distúrbio de identidade foi sobretudo projetado nos nossos eleitores, porque a dado momento os portugueses deixaram de perceber qual era a utilidade que se retirava de um voto no CDS.  O CDS não ganha nada  – e até corre o risco de desaparecer – se for ou ambicionar ser um sucedâneo de outro partido ou um produto de contrafação.

Quis dizer uma espécie de muleta do PSD?

Sim, ou um concessionário de outro partido que ambiciona o poder pelo poder.  O CDS não é um partido contorcionista. Ficou demonstrado que a tentativa de agradar a franjas eleitorais que não gostam do partido nem daquilo que representamos até pode trazer o seu aplauso. Mas, não traz o seu voto. O CDS, para crescer,  sendo um partido doutrinário,  tem que  preservar obrigatoriamente regras elementares, que são: o institucionalismo, a sobriedade, as políticas sólidas, definidas, responsáveis,  harmónicas e coerentes entre si. Ou o CDS assume esse sistema de valores constantes e orientadores que servem como uma chave de leitura da realidade e consegue traduzi-las em medidas muito concretas para os portugueses, ou, então, vai entrar  numa falência de identidade.

Mas ainda não disse de quem é a culpa pela atual situação.

Já tinha dito que comigo não contariam para ajustes de contas com o passado ou para personalizar os erros que foram cometidos até aqui. Mas acho que deveriam ser assumidos, sobretudo por quem teve responsabilidades de direção e conduziu o CDS ao pior resultado de sempre da sua história. Comigo não contam para ajustes de contas ou julgamentos requentados. Acho que devemos viver em paz com a nossa história e saber honrá-la.

Concorda com Ribeiro e Castro quando disse – à Rádio Observador – que o CDS está pior do que estava quando foi o partido do táxi?

Claro.  Por isso é que há uma urgência e uma excecionalidade que pedem esta tal nova energia, esta chicotada psicológica, um aggiornamento  do partido, um vigor renovado e uma lufada de ar fresco para restaurar a confiança com as nossas bases sociais de apoio. Esta é que a grande virtualidade que a minha candidatura personifica. Conseguimos apresentar uma visão instrumental de nós próprios: nós ao serviço do partido, o partido ao serviço de Portugal e abrir o CDS ao que de melhor existe na sociedade. 

A Iniciativa Liberal e o Chega são uma ameaça para o CDS?

Disputam um eleitorado que o CDS tem de fixar e que tradicionalmente  sempre foi seu. Até porque grande parte das bandeiras desses dois partidos foram resgatadas ao CDS pela sua inépcia ou ineficiência.

Agora, explique-me o que defende por travar batalhas culturais. Propõe-se avançar com uma agenda fraturante?

Não é fratura coisa nenhuma. O CDS tem de se dirigir para o povo não socialista em Portugal. Então, onde é que isso se traduz? Quais são as nossas metas? Queremos falar para os problemas reais das pessoas, estar casados com os seus dilemas, os seus flagelos. E poder resolver-lhes os problemas que enfrentam no seu dia-a-dia. E quais são eles? Queremos falar para aquelas pessoas que são escravas do trabalho, do fisco, da regulamentação e da burocracia. E são muitas em Portugal. Queremos falar para as pessoas que querem ter tempo para se dedicarem a si e à sua família. Depois achamos fundamental que as pessoas possam escolher a escola e o hospital onde são tratados.

O que podemos encontrar na sua moção ‘Voltar a Acreditar’?

Em primeiro lugar, o CDS preservará sempre a estabilidade política se eu  for presidente do partido. Ninguém pode esperar de nós uma pura contestação negativa, uma chuva de críticas. 

Ou seja, se for escolhido para liderar o CDS, o partido não vai apresentar moções de censura porque sim.

Claro. É tão simples quanto isto. Não vamos facilitar a vida aos nossos adversários.  Seremos, sem margem para dúvida, oposição ao PS e ao Governo e a todos os partidos que suportarem esta solução governativa ou as suas políticas. Mas, como democratas e institucionalistas, não nos vamos furtar ao diálogo para que muitas das nossas propostas possam vir a ser aprovadas.  Vamos colocar sempre o superior interesse dos portugueses acima de quaisquer tricas.

Mas o CDS não servirá de muleta ao PS…

Não. Não servirá de muleta ao PS, nem a nenhum outro partido. Não nos vamos fundir, nem vamos permitir que nos lancem nenhuma OPA para que o CDS se dilua em qualquer outro partido. Se o CDS achar que tem de ser igual à Iniciativa Liberal, então aí, ponto final. Se o CDS achar que tem de ser igual ao Chega para ser politicamente forte, então chega. Se o CDS achar que tem de ser como o PSD aí acho que perde a sua razão de ser e de existir. Eu defendo um CDS que seja igual a si próprio e que possa corresponder àquilo que os portugueses esperam dele, que é um partido comprometido em apresentar soluções de direita sensata para o país. E apresentamos na nossa moção algumas ideias-chave.

Tais como?

Vamos apresentar uma projeto de revisão constitucional que promova uma profunda reforma do atual sistema político eleitoral. Para quê? Porque nós queremos garantir uma maior representatividade e democraticidade.

O que defende é a introdução de círculos uninominais?

Não necessariamente. Tem que ser criado um sistema misto que permita uma maior democraticidade e representatividade nas escolhas dos deputados pelos eleitores. E há outra proposta sobre a qualidade da democracia: vamos propor a limite de mandatos para todos os cargos políticos eletivos. Porquê? Porque a atividade política é um serviço à comunidade que urge dignificar e não pode ser uma profissão.

 

‘Estou convicto de que vou ganhar’

Candidato a líder do CDS vê mais vantagens em não ser deputado: o próximo líder deve ser alguém que está no terreno e não no Parlamento, defende.

O próximo teste do CDS serão as autárquicas.  O que vai dizer aos congressistas? É preciso duplicar o número de câmaras? 

Adelino Amaro da Costa tinha uma frase muito simbólica sobre a vocação autárquica do CDS: os sindicatos estão para os partidos de esquerda como as autarquias estão para os partidos democratas-cristãos. A afirmação do partido ao nível local, com base numa política territorial e de proximidade,  faz-se a contento do trabalho da nossa malha de autarcas. Que naturalmente tem de ser reforçada por todo o país.

E se Assunção Cristas quiser ser recandidata por Lisboa, contará com o seu apoio caso seja escolhido como novo presidente?

Quero que o resultado das escolhas dos candidatos autárquicos do CDS, em 2021, seja de comum acordo entre as nossas estruturas e a direção nacional. Não excluo nenhuma hipótese desde que resulte de um acordo com as nossas estruturas de base e intermédias.

Se for de comum acordo com as estruturas locais, não exclui Assunção Cristas?

À partida não excluo ninguém. Este é o partido que não exclui ninguém.

A moção que apresenta, ‘Voltar a Acreditar’, não implica que deixe de ser líder da JP?

Se ganhar, sim, é uma incompatibilidade estatutária entre estas duas funções. Só não cumprirei este mandato na Juventude Popular na eventualidade, como espero, de ser eleito presidente do CDS no dia 26 de janeiro.  

Não foi eleito deputado. Se for o escolhido, não é uma desvantagem não estar no Parlamento?

Vejo mais vantagens e benefícios para o partido se o próximo presidente do CDS não for deputado. Se o Parlamento fosse o eixo gravitacional onde se decide o voto das pessoas, o CDS não teria tido apenas 4 por cento dos votos. É rigoroso afirmar que o debate parlamentar vai exigir uma tarefa hercúlea a todos os deputados ( e eu acho que já demonstraram ter competência e energia para conseguirem vencer).  O próximo presidente tem de lhes aliviar esta espinhosa missão que carregam e tentar  corroer por fora o Governo socialista, mostrando o CDS ao exterior, ganhar implantação nacional, construir um programa diretamente com as pessoas, que as vai ouvir às suas terras. 

Não concorda com Nuno Melo…

Aí temos uma divergência. Eu gosto muito do Nuno Melo, mas não vemos a coisa da mesma maneira. O CDS tem que ir a terreno e o próximo presidente tem de ter também uma veia de secretário-geral e de construtor, de fazer vida de aparelho, de estar junto das nossas gentes e abrir o partido à sociedade civil.

Se vencer, a líder da bancada deve continuar? Cecília Meireles apoia João Almeida.

Depois de ser eleito presidente do CDS vou reunir com o grupo parlamentar para que tenhamos uma salutar conversa sobre a condução do partido. E eu não tomarei nenhuma decisão a esse respeito, sem primeiro ouvir a Cecília Meireles sobre  a intenção de se manter, ou não, nessa posição, uma vez que apoia outra candidatura. Estou certo que não haverá inconveniente nenhum em manter o seu mandato, caso saia vencedor como espero. Mas esses assuntos são do foro interno do partido

Está convencido de que vai ganhar?

Estou absolutamente convicto  de que vou ganhar o congresso porque acho que a minha candidatura apresenta aquilo que o partido precisa nesta altura. E somos os mais capazes para projetar esta mudança, gradual, com todos, com vista ao reposicionamento do CDS e a transmitirmos uma emoção positiva aos portugueses.