FMI prevê recessão para Angola já em 2019

Produção petrolífera abaixo do esperado está na base das previsões em baixa. Economia angolana deverá crescer 1,2% em 2020 e 3% em 2021. O que é insuficiente para sair da crise económica profunda em que o país mergulhou.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) reviu em baixa a previsão de crescimento da economia angolana, antecipando agora uma recessão de 1,1% já para este ano de 2019 e um crescimento de 1,2% em 2020 – ou seja, menos de metade do que estava previsto. Esta é uma das conclusões da análise detalhada à segunda revisão do Programa de Financiamento Ampliado em curso no país, que permitirá a Angola receber cerca de 3,7 mil milhões de dólares (cerca de três mil milhões de euros) nos próximos quatro anos. Números bem diferentes dos que tinham sido apontados em junho pelo organismo internacional, altura em que estimou um crescimento de 0,3% para este ano e um crescimento de 2,8% para 2020.

Mas o FMI dá uma explicação para esta revisão em baixa. De acordo com os seus técnicos, "a atividade económica é mais fraca do que era esperado" e face "às projeções da primeira revisão, o crescimento será mais baixo em 2019 e 2020 devido à produção petrolífera abaixo do esperado". Ainda assim, admitem que a atividade económica irá recuperar gradualmente, a partir do próximo ano, e que será apoiada por um crescimento moderado da economia não petrolífera.

No entanto, as previsões só são mais otimistas a partir de 2021. É projetado um crescimento a rondar os 3%, "pelos efeitos positivos não só da liberalização da taxa de câmbio, mas também do PIB [Produto Interno Bruto] não petrolífero". 

 

Dívida também foi revista 

O FMI também reviu a previsão de evolução de dívida pública angolana, estimando agora um rácio de 111% face ao PIB, que deverá descer para cerca de 70% até o final do programa de ajustamento, em 2024. "A dívida de Angola permanece sustentável, mas o rácio da dívida pública face ao Produto Interno Bruto aumentou substancialmente, e os já de si elevados riscos subiram ainda mais", revela o organismo.

Em causa, de acordo com o relatório, está não só a rápida depreciação da moeda neste trimestre, mas o FMI também considera que "os preços globais do petróleo devem continuar baixos", e como tal, "os indicadores do peso da dívida vão manter-se elevados".

Mas os alertas não ficam por aqui. Os técnicos do Fundo Monetário Internacional chamam ainda a atenção para o facto de a dívida angolana continuar "altamente vulnerável a choques macroeconómicos e orçamentais", apontando como principais riscos para a sustentabilidade da dívida "a depreciação da taxa de câmbio ser mais rápida do que o previsto", existirem "mais declínios nos preços ou na produção petrolífera" e, ao mesmo tempo, continuar a existir "uma possível deterioração no acesso aos mercados financeiros". 

Já a redução da dívida para 70% do PIB em 2025, ou seja, cinco pontos percentuais acima do objetivo de médio prazo, é justificada pelas receitas petrolíferas, o que, no entender dos técnicos, "ajuda a limitar a dinâmica da dívida às flutuações cambiais". E a justificação não fica por aqui. Esta diminuição será também apoiada "pelo contínuo esforço orçamental e por um crescimento económico maior, suportado por reformas estruturais e uma taxa de câmbio mais competitiva".

Os técnicos do FMI dizem ainda que "o rácio de dívida temporariamente elevado aumenta as vulnerabilidades às flutuações do preço do petróleo, o que requer uma monitorização atenta e ações corretivas imediatas [antes] de os choques adversos se materializarem".

Mas nem tudo é mau. O Fundo Monetário Internacional elogiou o comportamento do Banco Nacional de Angola (BNA) no diz que diz respeito às tentativas de melhorar a flexibilidade da taxa de câmbio e alinhá-la com o mercado, classificando esta decisão como uma "mudança de paradigma com profundas implicações estruturais".
E vai mais longe: "A liberalização da taxa de câmbio vai reduzir substancialmente o risco de sobrevalorização do kwanza e ajudar a alocar as limitadas reservas de moeda estrangeira de forma mais eficiente". 

Mas, apesar dos elogios dos técnicos internacionais, esta política tem sido alvo de fortes críticas face ao seu impacto na inflação no mercado angolano. A inflação tem tido como consequência a depreciação do kwanza em cerca de 30% desde o início do ano e deverá atingir um novo pico já no próximo ano, na ordem dos 24%. Uma medida que, segundo os mesmos, "deverá ter efeitos benéficos na eficácia dos instrumentos de política monetária". E dão como exemplo as operações em mercado aberto, que são apontadas como necessárias "para reduzir o risco de distorção da intermediação financeira, facilitar a acumulação de reservas, apoiar a competitividade externa e a diversificação económica e encurtar a diferença entre a taxa oficial e a paralela".

 

Alertas não são novos

Poucos dias antes de ser conhecido o relatório do Fundo Monetário Internacional, a consultora FocusEconomics já tinha revisto em baixa a previsão de crescimento da economia angolana, apontando para uma recessão de 0,8% – em vez de 1,1% apontado pelo FMI – para este ano e uma expansão de 0,7% em 2020, um crescimento mais modesto do que os 1,2% indicados pelo FMI.

"A perspetiva de crescimento para o próximo ano foi cortada novamente este mês, de 1% para 0,7%, com o poderoso setor petrolífero a continuar a navegar em águas paradas e com pouca esperança de uma retoma", diz a consultora. A explicação, segundo a mesma, deve-se ao facto de a economia ter continuado em recessão no terceiro trimestre, com a produção petrolífera a cair de julho a setembro, "o que, juntamente com a queda dos preços médios do petróleo, prejudicou o setor externo" e face a esse cenário acredita que há "pouco espaço para otimismo relativamente ao quarto trimestre", nomeadamente no que diz respeito aos preços do crude e à produção interna.

Já para o próximo ano, a consultora acredita que a atividade económica deverá recuperar face às medidas que têm sido levadas a cabo: "Reformas, estabilidade política e o apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI), que vão sustentar os investimentos e a despesa privada".

Quanto à política monetária, a FocusEconomics prevê que o Banco Nacional de Angola (BNA) mantenha a taxa de juro diretora até os riscos à inflação estabilizarem e, por isso, estima que a taxa de juro de referência deve terminar nos 16,30% em 2020.