O futuro da direita

Direita e esquerda são meros ‘conceitos envelope’ utilizados por simplificação de linguagem na dialética política. São tudo e nada. Desde que bipolares entre si e fermento de um maniqueísmo que ondula ao sabor dos tempos. 

É facto que a esquerda europeia vive há anos uma profundíssima crise. Tentou reinventar-se da pior maneira. Através do que já designaram por «tribalização do discurso», apontando, essencialmente, para as causas de disfunção social, ou fraturantes. São essas que a distinguem e que podem cativar um eleitorado profundamente desiludido com os partidos socialistas e ávido de castigar quem tudo lhes prometeu e pouco lhes deu, mas disponível para assumir a rutura com a ordem existente, vingando assim as suas frustrações. 

A sucumbência de um jornalismo mediador perante a emergência das redes sociais em que raivas, ódios, agressividade, violência, chovem inclementemente contra tudo e contra todos, pôs em cruel evidencia a indignação e o divórcio populares com os partidos e a política.

Aliás, os resultados das últimas eleições em Portugal são disso mesmo exemplo com a irrupção de três novas forças parlamentares cujo discurso pretende acomodar, precisamente, todo este rancor acumulado.

Rancor em grande parte justificável, assente na crescente proletarização das classes médias, na ausência de soluções profissionais dignas para os jovens qualificados, na insegurança, no insuportável aumento do custo de vida através da fiscalidade indireta, na omissão de resposta do SNS, na gravíssima crise da justiça da qual todos temem falar, nos dramas do abandono dos idosos, nesse número obsceno de 2 milhões entre menos de 10 milhões de habitantes que se encontrarem no limiar ou abaixo do limiar da pobreza.

Este rancor é policrómico. Indiferente à bipolaridade direita-esquerda. Espera resposta urgente. E está muito apetente a ser embalado pelos novos discursos populistas e radicais.

Mas não é esta direita, mesmo que refundada, que será a resposta. E aqui chegamos ao nó górdio. Esta direita do verbo inflamado, do encantamento pelas câmaras e holofotes, não resolve coisa nenhuma. Mais, será rapidamente ultrapassada pelo novo, que é diferente e não tem passados pelos que possa ser julgado. Não basta a simples identificação como Direita. Porque, como disse atrás, ser de Direita, em si mesmo, é ser tudo e nada. E hoje exige-se conteúdo, substância, ideologia.

O futuro da direita será, pois, a meu ver, o que essa direita vier a ser.

No que concerne ao CDS, admitindo-o nesta equação cada vez mais vazia direita-esquerda, pessoalmente, perfilho a posição expressa pelo Prof. Adriano Moreira ao DN. O ‘eixo da roda’ terá de ser a Doutrina Social da Igreja. Essa a sua matriz fundacional, a sua ideologia identitária. E hoje com uma ajuda de peso – o desassombro do Papa Francisco. 
É importante que se recorde que a democracia-cristã repudia tanto a tese do Estado Providência como a do Estado-notícia. Não admite a omissão do poder político aos problemas sociais e económicos nem, tão pouco, aceita reduzir o homem a um algarismo nas estatísticas públicas.
Defende a justiça social, não estabelecendo igualdades matemáticas, mas exigindo a cada um segundo a sua capacidade e impondo de cada um o seu contributo para alcançar o bem comum. A noção de bem comum, a ideia da dignidade da pessoa humana, a ideia de justiça social, a ideia de igualdade de oportunidades, são as quatro marcas da democracia cristã que a distinguem e caracterizam.
Este é o discurso que poderia ultrapassar a crise que o CDS atravessa. Sem afirmações, reafirmações e proclamações sobre a direita. Sem ir atrás dos momentos mediáticos que outros, sem a sua responsabilidade histórica, criarão com maior destreza. Sem ceder às tentações liberais que nunca lhe fizeram bem, tendo sempre por certo que o seu modelo económico não é só a economia de mercado, mas a economia social de mercado. Sem ter medo de olhar cada homem, independentemente da sua raça, origem, religião, como ser único e irrepetível, com o direito a ser respeitado. Olhando para a pobreza como a grande mancha do nosso tempo que nos deve envergonhar, olhando para os velhos com a humanidade que merecem e olhando para os jovens proporcionando-lhes o futuro que ambicionam e que, por culpa de minha geração, em grande parte se viu frustrado.

No horizonte adensam-se as nuvens negras. A revolução digital, a crise ambiental, a destruturação dos mecanismos de mediação, a radicalização das populações politicamente dirigida pelas redes sociais irreguladas, a massificação da intolerância e da violência são sinais claros de sub-representação política. A irrelevância sindical é hoje disso um claro exemplo.
Sou, por isso, bem mais pessimista. O mundo está em deriva e à deriva. As respostas que são dadas olham mais para a contabilidade e para a economia do que para a política. As pessoas querem o concreto, é verdade. Mas também é verdade que ninguém consegue viver sem alimentar um sonho, um projeto de vida, sem confiança no futuro. E isso é da política! O que falta e o que desespera!

José Luís Seixas
Advogado e Militante do CDS