João Gonçalves Pereira: “O CDS é um partido moderado”

João Gonçalves Pereira substituiu, esta semana, Assunção Cristas no Parlamento. Diz que o CDS deve ser um partido ‘moderado’ e receia que falte ‘maturidade política’ ao novo líder. 

João Gonçalves Pereira: “O CDS é um partido moderado”

O CDS tem um novo líder. Concorda com a ideia de que o partido saiu deste congresso mais à direita.

Temos de dar algum tempo à nova liderança para perceber exatamente como é que vai posicionar-se. Há aqui um conjunto de ameaças, mas também de oportunidades. Passamos a ter mais concorrência à direita e temos de transformar essa ameaça numa oportunidade.

Os novos partidos são uma ameaça real para o CDS?

Temos um PSD, que se está a encostar à esquerda, temos o  Chega e a Iniciativa Liberal. O CDS tem ali um espaço entre a direita e o centro que pode aproveitar na lógica de um partido moderado. O CDS em que acredito não tem vergonha de se assumir como um partido de direita, mas é um partido moderado que sabe onde estão as linhas vermelhas. Há linhas vermelhas que o CDS na sua história nunca ultrapassou e quero acreditar que não vai ultrapassar.

Não apoiou nenhum dos candidatos à liderança. Quer revelar em quem votou?

Votei no candidato João Almeida. O João Almeida surpreendeu-me pela positiva. O João foi um senhor naquele congresso. Teve uma enorme elevação. Acho que não cometo nenhuma inconfidência se disser que transmiti ao Francisco Rodrigues dos Santos, quando se começou a falar no nome dele como possível candidato, que entendia que este poderia não ser o momento dele.

Por ser ainda um jovem…

Não é só por causa da idade. Entendi que o Francisco estava numa fase de crescimento, numa fase de afirmação e numa fase em que era preciso ter mais alguma maturidade política. Ele tem enormes qualidades. Vi o Francisco Rodrigues dos Santos nascer no partido e quero acreditar que estava enganado quando lhe dei esse conselho porque se estiver enganado significa que as coisas correram bem. Ele soube desde a primeira hora que eu entendia que este não era o momento dele. Teve um entendimento diferente e isso é legítimo e respeitável.

Substitui Assunção Cristas na Assembleia da República. O CDS foi justo com a sua anterior líder ou houve alguma injustiça na forma como lhe foram apontadas certas responsabilidades?

Não foi só o partido que foi injusto. A Assunção Cristas esteve disponível para fazer oposição ao Partido Socialista e à ‘Geringonça’ quando outros à Direita não estiveram. O CDS fez oposição sozinho em muitos momentos. Claro que houve erros, mas devo dizer que fiquei triste com algumas coisas que foram ditas na campanha interna sobre a anterior direção e a anterior líder. Foi um espetáculo triste, pouco sério e até de alguma ingratidão. O partido deu um sinal de que quer virar a página, mas esse virar de página não deve excluir ninguém.

Isso é possível num momento de mudança?

Todos são necessários ao partido. O CDS não pode prescindir de Paulo Portas ou Telmo Correia, mas também não pode prescindir de Ribeiro e Castro, Nuno Melo, Cecília Meireles, Pires de Lima, Adolfo Mesquita Nunes…

Ficou surpreendido com a reação de uma parte do congresso à intervenção de Pires de Lima?

Foi vaiado e isso é triste. Assisti a momentos muito tristes no congresso, mas temos de olhar para a frente e por isso é que lhe digo que é importante estarmos todos unidos. Este é o momento de Francisco Rodrigues dos Santos. Mesmo aqueles que votaram em outras candidaturas devem deixar esta liderança afirmar-se. O meu partido é o CDS. Não é o partido de Cristas, o partido de Portas ou o partido de Rodrigues dos Santos. No dia em que eu não tiver disponibilidade para um líder do partido terei de sair do CDS.

Os deputados são todos apoiantes de João Almeida. A relação entre o líder e o grupo parlamentar pode ser vir a ser um problema?

Este grupo parlamentar é constituído por pessoas responsáveis. O relacionamento entre a direção e o grupo parlamentar passa por ter canais de comunicação diretos com regras claras. O que é importante é construir boas propostas e boas soluções para apresentar aos portugueses. Essa deve ser a prioridade do presidente do partido e do líder do grupo parlamentar. Isso é que nos vai permitir afirmar o CDS. Temos de tentar transformar uma ameaça numa oportunidade.

Como é que o CDS deve lidar com o aparecimento do Chega? Julga que  o CDS perdeu eleitores para os novos partidos?

Há eleitores do Chega em regiões em que o Partido Comunista tem uma boa implantação. Não sei. Acho que o Chega tem um eleitorado extremamente volátil. O CDS, respeitando os outros, deve centrar-se na sua agenda. O CDS tem uma marca democrata-cristã. Deve atuar junto dos mais desfavorecidos. Deve estar atento aos mais vulneráveis.  O CDS não pode conviver com um país em que praticamente 20% dos portugueses vivem com menos de 500 euros. Temos de exigir soluções.

Isso chega para recuperar os eleitores que perdeu?

O CDS tem de colocar uma questão a si próprio: qual é a utilidade que o partido pode ter para o país e para os portugueses?  As pessoas só votam no CDS se sentirem que o partido pode ser útil. Caso não sintam alguma utilidade têm outras escolhas. Ainda por cima cada vez existem mais escolhas. E, por isso, é que não faz sentido andarmos a discutir se somos mais liberais, mais conservadores ou mais democratas-cristãos. Não faz sentido andarmos em discussões autofágicas e a tentar a catalogar as pessoas porque uns são monteiristas, outras são portistas, não ajuda o país. Temos de falar para fora.

O CDS deve apoiar ou não a recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa a Belém?

Marcelo Rebelo de Sousa é o Presidente da República, até hoje, com mais sensibilidade para com os mais desfavorecidos. Não me recordo de ver nenhum Presidente da República eleger como desígnio nacional a questão dos sem-abrigo e, nesse aspeto, tem uma agenda alinhada com o CDS. Não se sabe se ele vai ser recandidato ou não. Teremos de aguardar, mas é preciso que o CDS tenha em breve uma posição absolutamente clara sobre essa matéria.

Considera que o PSD e o CDS deviam dialogar mais a partir de agora?

Vamos iniciar um processo autárquico e isso implica naturalmente um diálogo com o PSD. Os portugueses estão fartos de crispação e sou favorável a compromissos.

Em Lisboa devem existir compromissos?

O CDS, como é evidente, está disponível para falar com o PSD em relação a Lisboa. O PSD teve uma campanha interna recente e não se viu nenhuma animosidade relativamente ao CDS.

Era desejável uma aliança pré-eleitoral para a câmara de Lisboa?

Era desejável porque a minha convicção é que se o PSD tivesse aceite a coligação que foi falada e teve praticamente concluída em Lisboa nós tínhamos ganho a Câmara de Lisboa  [nas autárquicas em 2017]. Continuo a entender que há um espaço de entendimento e de diálogo entre os dois partidos e há disponibilidade do CDS para esse mesmo diálogo.

Numa lógica de lógica de coligação pré-eleitoral..

Sim. Da parte do CDS há disponibilidade para dialogar.